quinta-feira, junho 02, 2022

Pentecostes: Recebei o Espírito Santo



(Reflexões baseadas em: Atos dos Apóstolos 2,1-11; 1 Coríntios 12, 3b-7.12-13; João 20, 19-23)




Quando lemos a passagem do livro dos Atos dos Apóstolos que menciona o dia de Pentecostes (At 2,1-11), certamente ficamos admirados com tantos fenômenos e, com certeza, nos fazemos algumas indagações, querendo entender aquelas maravilhas.

Se Jesus tinha atribuído a missão de sair pregando, porque os discípulos ainda estavam reunidos em Jerusalém? Eles ouviram um barulho “como se fosse uma forte ventania”. Os discípulos viram “línguas como de fogo”. Se é “como se fosse”, então não ocorreu ventania nem fogo? Cheios do Espírito, os discípulos começaram a falar em outras línguas, isso ocorreu como um milagre ou já conheciam essas outras línguas? Eram, de fato, muitas línguas ou uma só? Afinal, que língua era essa?

Entretanto, será que estamos fazendo a pergunta correta? O que Deus está querendo nos dizer no dia de Pentecostes? Será que, no dia de Pentecostes, em vez dos fenômenos, não devêssemos olhar para o gesto de Jesus? (Jo 20,19-23).

Pra começar, nossa fé nos ensina que a celebração do Pentecostes (ou seja, cinquenta dias após a Páscoa) quer chamar nossa atenção para um fato: estamos celebrando o que se pode chamar de manifestação sensível da ação do Espírito de Deus. Não que o Santo Espírito não estivesse agindo; nem que nunca tivesse se manifestado na história sagrada. Pelo contrário, o Espírito sempre agiu ao longo da história. Acompanhou o plano divino desde sempre e, no ato da criação, pairava sobre as águas junto com o Verbo Divino.

Ocorre que a ação criadora, no início, foi um ato do Pai. Na comunhão com o Filho e o Espírito, o Pai fez com que tudo passasse a existir. A ação salvadora coube ao Filho. O Verbo divino, pela ação do Espírito de Vida, encarnou-se no ventre de Maria, fez-se humano e habitou entre nós, nascido da mulher Maria. E em sua pregação Jesus estabeleceu as bases da Igreja, a comunidade do Povo de Deus.

Cabe, portanto, ao Espírito de Luz, guiar as ações da Igreja para que a Igreja continue colaborando na obra criadora de Deus. Por isso os discípulos estavam reunidos, esperando a manifestação do Espírito a fim de serem revestidos pela força do Senhor. E eis que vem o Espírito de todas as Graças e concede a cada um aquilo que é o seu dom. Ou seja, a cada indivíduo o Espírito concede o dom com o qual ele pode fazer a Igreja de Cristo crescer e o mundo ser melhor. E isso nos leva ao ensinamento de Paulo (1Cor 12, 3b-7.12-13): há diversidade de dons, diversidade de ministérios, diversidade de atividades… mas é o mesmo Espírito que age em todos.

O Espírito de unidade concede o dom com o qual cada indivíduo pode colaborar para o bem de todos os demais indivíduos e crescimento da Igreja, a comunidade dos que acreditam. “A cada um é dada a manifestação do Espírito em vista do bem comum” (1Cor 12,7). E, para que não restem dúvidas o apóstolo explica novamente, reafirmando: “De fato, todos nós, judeus ou gregos, escravos ou livres, fomos batizados num único Espírito, para formarmos um único corpo, e todos nós bebemos de um único Espírito” (1Cor 12,13).

Essas palavras do apóstolo nos ajudam entender: não importa se houve ou não línguas de fogo. Não importa se houve ou não um vento forte ou só uma brisa suave. Não importa se os discípulos falaram usando esta ou aquela língua… não importam os sinais externos, nem se foram coisas simples ou eventos maravilhosos .

O que é realmente importa?

Que o Espírito de Amor, de união, de sabedoria, de coragem; o Espírito eclesial, de comunidade solidária… Esse Espírito foi dado, não como um presente, mas como um companheiro, um amigo que estimula para a realização de coisas grandiosas… para o bem de todos, para o bem comum, para o bem da comunidade…

Notemos que quando Jesus, fazendo-se presente no grupo reunido, concede o Espírito Santo, não o faz de forma suntuosa, mas com um sopro de amizade, com um gesto de carinho, com uma demonstração de amor. Primeiro dá a paz. Depois dá a missão. Só então, para firmar o compromisso e fortalecer a missão de servir é que sopra o Espírito Santo. “A paz esteja convosco. Como o Pai me enviou, também eu vos envio. E depois de ter dito isto, soprou sobre eles e disse: Recebei o Espírito Santo” (Jo 20,21-22). E o Espírito é dado em vista do bem comum.

Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Outros escritos do autor:


sexta-feira, maio 27, 2022

Ascensão: Testemunhas de Cristo

(Reflexões baseadas em: Atos dos Apóstolos 1,1-11; Efésios 1,17-23; Lucas 24,46-53)




Os mistérios do céu podem gerar em nós inquietação ou esperança.

Inquietação porque o espírito humano busca certezas e nem sempre se dá conta de que o ato de fé exige mais do que certeza, exige compromisso com algo que não pode ser demonstrado. E esperança porque, mesmo parecendo absurdo, somente o ato de fé pode impulsionar a vida e propor novos caminhos.

E não precisa ser fé religiosa, pode ser fé num sonho… tudo é conduzido pela esperança… caso contrário a inquietação leva ao desespero! Mas a fé abre caminhos!

A inquietação pode levar ao desespero ou a um ato de fé. O desespero decorre da incapacidade de perceber possibilidades; de uma incerteza que não admite imprecisões, sem se dar conta de que é justamente a imprecisão que impulsiona o viver. Mas para isso é necessário um ato de fé. E o ato de fé faz mergulhar na esperança que abre caminhos e horizontes!

A inquietação estava presente entre os apóstolos (At 1,1-11). Na ceia ainda estavam confusos, mesmo depois de terem convivido com o Senhor e dele terem ouvido inúmeras explicações e exemplos de vida. Apesar disso ainda se perguntavam e indagavam ao Mestre: “Senhor, é agora que vais restaurar o reino em Israel?” (At 1,6). Não haviam compreendido a mensagem nem a proposta. Não haviam entendido que o Reino vai além de Israel!

Que lhes faltava? O ato de fé.

Como ainda não estavam amadurecidos na fé, Jesus precisou dar novos detalhes. E explicou: Não cabe a vocês saberem das coisas de Deus (At 1,7). Mesmo contemplando a ascensão ainda se postavam na inquietação. Permaneceram “olhando para o céu” (At 1,10) esperando uma resposta… que estava nas nuvens, mas na caminhada...

Nãose tinham dado conta de que o ato de fé, não é algo que vem do céu, mas é uma atitude pessoal. Por isso a interpelação que lhes é dirigida pelos mensageiros: “Homens da Galileia, por que ficais aqui, parados, olhando para o céu?” (At 1,11). Ou seja, ponham-se a caminho. A inquietação desaparece quando se faz um mergulho no processo da caminhada, num ato de fé.

Ea orientação para isso é dada por Paulo, quando escreve aos efésios (1,17-23).

O apóstolo, como que em uma oração, pede ao Pai que a comunidade receba um “espírito de sabedoria”e a luz da esperança (Ef 1,17-18). Sabedoria para entender que só o ressuscitado pode oferecer certezas; e esperança para se por na caminhada da vida.

Eisso também vale para nós. Para entendermos, num ato de fé, que toda esperança, toda riqueza do ser humano, consiste na glória junto aqueles que nos precederam. Nossa riqueza é uma “herança com os santos” de Deus. Ou seja, o ato de fé impulsiona para algo que está além de toda inquietação; algo que só pode ser percebido exatamente pelo ato de fé.

Mas para entender tudo isso e ser fiel à mensagem e proposta de Jesus é necessário aprender com ele (Lucas 24,46-53). E se prestarmos atenção às suas palavras e gestos notaremos que ele age como um pedagogo. Não um pedagogo dos dias atuais que se preocupa com regras e normas sem atentar para a essência da caminhada. Jesus encarna a postura original do pedagogo, aquele que conduz no caminho da aprendizagem e para a aprendizagem: visando o pleno desenvolvimento da pessoa; visando a plena sintonia com o plano do Pai; visando e estimulando a convivência com as demais pessoas.

ÉJesus quem mostra o caminho e faz isso ao longo de sua vida; é ele quem conduz nos e para os caminhos do Reino. Ele ensina isso mostrando que as Escrituras Sagradas não só prefiguram sua vinda e sua permanência na história humana, mas principalmente ensinam que cabe aos seus seguidores levar adiante as propostas de esperança. Eis suas palavras: “Assim está escrito: O Cristo sofrerá e ressuscitará dos mortos ao terceiro dia e no seu nome serão anunciados a conversão e o perdão dos pecados a todas as nações, começando por Jerusalém” (Lc 24,46-47). Ou seja, algo novo pode se desenvolver na vida de quem faz o ato de fé e deposita sua esperança naquele que ressuscitou.

Nisso consiste o Ser Testemunha: aprender com esse mestre que sabe conduzir não para seguir regras e normas que dificultam a vida, mas alimentando a esperança de uma vida plena na sintonia com o Espírito que o Pai prometeu! Essa é a esperança dos que se fazem Testemunhas de Cristo!







Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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sexta-feira, maio 20, 2022

Páscoa 6: Brilhando com a glória de Deus

(Reflexões baseadas em: Atos dos Apóstolos 15,1-2.22-29; Apocalipse 21,10-14.22-23; João 14,23-29)




As novidades sempre criam embaraço, por serem um ponto de interrogação: nunca sabemos onde podem nos levar. Se não isso, pelo menos apresentam novos desafios, geram novas inquietações e necessidades de novas respostas.

Essa situação, a novidade da mensagem do Ressuscitado (At 15,1-2.22-29), provocou esse desconforto entre os primeiros cristãos. Como agir se a novidade exige novas posturas? Como entender as antigas tradições, se a proposta do Ressuscitado cobra novas convicções?Afinal a quem dirigir a mensagem salvadora: à comunidade tradicional ou àqueles que não conhecem a proposta de Jesus? Quem tem uma palavra de conforto e orientação?

Eram tempos de dúvidas. Tempos difíceis. Mas o Espírito de Verdade ensinou o caminho(Jo 14,23-29). A visão da Cidade Santa (Ap 21,10-14.22-23) apresentou-se como uma resposta.

Mas antes disso e para não impor uma verdade absoluta, sem base numa tradição, sem consultar aqueles que haviam convivido com o Senhor… a sensatez mandou pedir ajuda e orientação: “Decidiram que Paulo, Barnabé e alguns outros fossem a Jerusalém, para tratar dessa questão com os apóstolos e os anciãos” (At 15,2). E a resposta veio na forma de uma mensagem universalizante: evitar a idolatria e seguir os passos de Jesus. Como ensinaram os apóstolos que haviam convivido com o Senhor: “Decidimos, o Espírito Santo e nós, não vos impor nenhum fardo, além destas coisas indispensáveis” (At 15,21). E essa passou a ser uma resposta valida para todos, em todos os tempos!

E, caso ainda houvesse dúvidas… e elas existiam, o autor do livro do Apocalipse esclarece: Ninguém fica de fora. Na Cidade Santa, figura da Igreja; na habitação do próprio Deus, tem espaço e acolhida para todos. O convite não é apenas para um pequeno grupo, mas estendido a todos. Em todos os tempos e lugares!

Na imagem da Cidade Santa, sobre suas portas estavam escritos os nomes das tribos da Antiga Aliança: “Estava cercada por uma muralha maciça e alta, com doze portas. Sobre as portas estavam doze anjos, e nas portas estavam escritos os nomes das doze tribos de Israel. (Ap 21,12). Ou seja, o ponto de partida e a vinda do Senhor, dependeu da porta de entrada que foi o antigo povo de Deus: os nomes da “doze trios de Israel” escritos sobre as partas.

Entretanto o fundamento da Cidade, figurando a Igreja e a habitação do Senhor, eram os apóstolos. A base da Igreja não está nas portas, e sim no alicerce. E este alicerce não é outro senão os apóstolos. Aqueles que conviveram com Jesus, o Cordeiro. “A muralha da cidade tinha doze alicerces, e sobre eles estavam escritos os nomes dos doze apóstolos do Cordeiro” (Ap 21,14).

Sabendo que os apóstolos são o fundamento da Igreja a comunidade que se deparava com um problema, procurou-os em busca de orientação (At 15,1-2). Sabendo que o verdadeiro templo e a verdadeira luz para as comunidades é o próprio Cordeiro, o autor do Apocalipse orienta: tendo o Senhor por guia, dispensam-se os demais preceitos. Sabendo que as normas antigas estavam ultrapassadas, que cedem lugar para aquele que estabeleceu as normas, afirma: “Não vi templo na cidade, pois o seu Templo é o próprio Senhor, o Deus Todo-poderoso, e o Cordeiro. A cidade não precisa de sol, nem de lua que a iluminem, pois a glória de Deus é a sua luz e a sua lâmpada é o Cordeiro.” (Ap 21,22-23).

Então, em que se baseia a vida da Igreja? Qual é a novidade da mensagem de Jesus de Nazaré? Qual é a novidade que não deixa ninguém em dúvida?

A resposta é uma só: a luz que vem da Cidade Santa. E essa luz é o próprio Jesus, aquele que concede o Espirito de Amor, que vem do Pai.

E se os apóstolos são o fundamento e alicerce sobre o qual nasce e cresce a Igreja, o impulso para esse crescimento é o próprio amor de Cristo para com a Igreja, a comunidade dos que aderem à sua proposta de amor: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e o meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada” ensina Jesus (Jo 14,23). E para assegurar a verdade dessa mensagem de amor, Jesus dá uma garantia: “o Defensor, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que eu vos tenho dito” (Jo 14,26).

Resta saber se nós vamos nos deixar iluminar e guiar pela luz da glória que é o próprio Deus…




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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quinta-feira, maio 12, 2022

Páscoa 5: Aberta a porta da fé

(Reflexões baseadas em: Atos dos Apóstolos 14,21b-27; Apocalipse 21,1-5a; João 13,31-33a.34-35)




O que é o novo céu e a nova terra? Por que o mar já não existe?

Estas perguntas surgem quando lemos o livro do Apocalipse (21,1-5a). Mas a leitura dos Atos dos Apóstolos (14,21b-27) nos apresenta uma resposta: a boa nova está se espalhando e se fazendo presente entre as pessoas com uma mensagem de amor que se expressa num novo mandamento, ensinado por Jesus (Jo 13,31-33a.34-35). Um mandamento que vê o bem estar da pessoa como um valor supremo, por isso é chamado de mandamento do amor.

Acontece que nos primeiros tempos do cristianismo, a vida não era fácil para os seguidores de Jesus.

As perseguições, as dificuldades, os confrontos com sacerdotes de outras crenças…. Eram inúmeras as situações que podiam levar ao desânimo. Situações que podiam levar ao abandono da fé. Afinal de contas permanecer no tradicional, no culto dos antigos deuses, na dependência dos deuses das autoridades… era mais fácil do que assumir novas posturas de paz, de justiça, de fraternidade, de amor, como era a proposta do cristianismo.

Viver essa novidades não era fácil quando as facilidades do tradicional era comodo. Diante desse quadro Paulo e Barnabé apresentavam-se como apoiadores e incentivadores da nova fé, abrindo as portas para a nova fé. Eram bases para apoiar e enfrentar as dores. Por isso eles encorajavam os discípulos. “Eles os exortavam a permanecerem firmes na fé”. E diziam mais! Ensinavam que os sofrimentos podem ser caminho seguro para entrar no reino de Deus “É preciso que passemos por muitos sofrimentos para entrar no Reino de Deus” (At 14,22).

Avida cotidiana dos discípulos e dos apóstolos, mesmo não sendo algo fácil, apresentava um vislumbre de superação, de vitória. Apresentava-se como algo de muito bom e estava por acontecer. E, diante dessa nova realidade, tudo que era velho, tudo que eram dores, ganharia uma nova configuração: Oreino do amor está para se instalar!

Essa nova condição levou o autor do Apocalipse a dizer, olhando para a promessa de Jesus: “Vi a cidade santa, a nova Jerusalém, que descia do céu, de junto de Deus, vestida qual esposa enfeitada para o seu marido” (Ap 21,2).

Trata-se de algo maravilhoso, que ainda não está instalado, mas que já se anuncia. Já se prenuncia. Já acena como recompensa não pelos sofrimentos superados, mas pela dedicação à causa, mesmo em situação adversa.

E aqui está a grande novidade do cristianismo. O significado dos sofrimentos cotidianos em nome de Cristo: a vitória. O sentido das dores é uma nova vida em pleno gozo de alegrias e realizações. Mas isso não será concedido como recompensa por ter sofrido, mas pela dedicação a uma causa que tem por objetivo, além do anúncio do amor divino, a plenitude do amor entre as pessoas. Ou seja, Deus não quer que soframos para merecer o céu. Quer que nos dediquemos, que usemos nossa vida, que destinemos nossas energias… ao anúncio de seu amor e à preparação de um mundo em que as pessoas sejam respeitadas, onde o bem se instale, onde as pessoas dedicam-se a ajudar aos outros. Ajuda que consiste em evidenciar o valor da pessoa fazendo com que cada um se encontre consigo e com o sentido de suas vidas.

Não se trata de dizer: minha vida é muito sofrida, então na outra vida vou para o céu pois já sofri demais. O raciocínio e o processo é diferente: passei minha vida fazendo de tudo para que as pessoas com as quais convivi tivessem uma vida melhor porque esse é o plano de Deus. Como consequência dessa minha dedicação ao bem, eu sofri…. Essa será uma vida recompensada com a plenitude da vida em Deus.

Essa é a essência do ensinamento de Jesus: O amor. Esse é o sentido das dores: a doação ao outro. Esse é o caminho que se abre com o anúncio da fé: ser pelo e para o outro. “Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros. Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros.” (Jo 13,34-35).

E assim o mar das dores deixará de existir. Um novo céu e uma nova terra se instalarão, pois esse céu e essa terra novos representam a instalação do amor pleno, presentes na vida de todos aqueles que se dedicarem a abrir novas portas para a fé no ressuscitado.




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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sexta-feira, maio 06, 2022

Páscoa 4: Luz para as nações

(Reflexões baseadas em: Atos dos Apóstolos 13,14.43-52; Apocalipse 7,9.14b-17; João 10,27-30)




As portas para o mundo se abriram!

Os caminhos preparados!

Os planos de Deus se concretizando!

A Luz ressurgindo para a vida!

As nações sendo acolhidas!

E, nisso tudo, os primeiros instantes de medo, incerteza, insegurança, ansiedade, apreensão… sendo superados. Novas perspectivas...

Pedro e alguns companheiros já estavam levando adiante a mensagem do Ressuscitado. As dores e prisões também estavam acontecendo. Mas nem por isso o anúncio da ressurreição havia parado. Pelo contrário, as dificuldades estavam conferindo mais vigor às pregações.

Assim éque vamos encontrar Paulo e Barnabé (At 13,14.43-52) em sua ação missionária. Sua atuação também não foi só de sucessos e flores, mas apesar das dores, muitos ouviam e aceitavam sua proposta “Muitos judeus e pessoas piedosas convertidas ao judaísmo seguiram Paulo e Barnabé. Conversando com eles, os dois insistiam para que continuassem fiéis à graça de Deus” (At 13,43).

Mas,por outro lado, outros tantos, mobilizados pelos judeus incrédulos na radicalidade da nova mensagem, não aceitavam a pregação e, pelo contrário, geravam todo tipo de dificuldades e perseguições. “Os judeus instigaram as mulheres ricas e religiosas, assim como os homens influentes da cidade, provocaram uma perseguição contra Paulo e Barnabé e expulsaram-nos do seu território.” (At 13,50).

Essa postura dos judeus pode ser vista como um grande divisor de águas. E, principalmente como ponto de partida para a universalização da mensagem cristã. A afirmação de Paulo não deixa dúvidas: devido à rejeição, por parte dos judeus, a proposta do Senhor abre-se, definitivamente, para todos. E essa abertura se faz mediante a ação de Paulo: “como a rejeitais e vos considerais indignos da vida eterna, sabei que vamos dirigir-nos aos pagãos. Porque esta é a ordem que o Senhor nos deu: 'Eu te coloquei como luz para as nações, para que leves a salvação até os confins da terra’ ” (At 13,46-47).

Essa luz atraiu milhares e milhares. Muitos milhões, como diz o Apocalipse (7,9.14b-17). A presença dessa multidão, do Apocalipse, tem a ver com o discurso de Paulo. “Vi uma multidão imensa de gente de todas as nações, tribos, povos e línguas, e que ninguém podia contar. Estavam de pé diante do trono e do Cordeiro; trajavam vestes brancas e traziam palmas na mão” (Ap. 7,9.14b-17).

A multidão, com as flores brancas nas mãos (palmas), havia vencido as dificuldades. Juntamente com Paulo e Barnabé, formava um grupo capaz de iluminar os caminhos. Grupo que, como luz, indicava a esperança: pode haver sofrimento, sim. Mas a sintonia com o Ressuscitado abre as portas para a glória definitiva, permite vislumbrar, mesmo no dia a dia turbulento, aquilo que nos espera na eternidade.

Assim entendemos as palavras de Jesus, aquele que ressurgiu dos mortos (Jo 10,27-30), afirmando que dá vida às suas ovelhas. E faz isso porque foi capaz de dar sua vida por elas. E com isso mostra que, apesar das dores e dificuldades e medos… impõe-se a esperança.

E se atentarmos para as palavras de Jesus, veremos que existe não só uma esperança, mas uma certeza: dias melhores virão! E Jesus é a luz indicando o caminho.

O que nos permite ter essa certeza?

As palavras de Jesus: “As minhas ovelhas escutam a minha voz, eu as conheço e elas me seguem” (Jo 10,27). O rebanho segue esse pastor não só porque ele é fonte de vida mas principalmente porque ele não perde as ovelhas. Elas podem se afastar, se desviar do caminho… mas o pastor se apresenta como aquele que as quer de volta. E lhes oferece o que ninguém pode dar: vida eterna. “Eu dou-lhes a vida eterna e elas jamais se perderão. E ninguém vai arrancá-las de minha mão” (Jo 10,28).

A proposta está feita.

A promessa assegurada.

A luz para as nações está à disposição!

Resta saber quem se deixará iluminar!




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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sexta-feira, abril 29, 2022

Páscoa: Obedecer a Deus, não aos homens

(Reflexões baseadas em: Atos dos Apóstolos 5,27b-32.40b-41; Apocalipse 5,11-14; João 21,1-19)



Quais as consequências daquilo que falamos ou do que fazemos?

A indagação tem razão de ser, pois tudo que dizemos ou fazemos tem repercussão: positivas ou negativas…grandes ou pequenas! Mas sempre tem consequência, reações… O que fazemos repercute de alguma forma ou em algum lugar, sobre algo ou sobre alguém!

A consequência da vida de Jesus,do que fez e ensinou, foi sua morte na cruz (At 5,27b-32.40b-41); a consequência ou o resultado de sua morte foi nos mostrar o caminho da ressurreição além de receber todas as honrarias na corte celeste (Ap 5,11-14). A consequência da pregação dos apóstolos foram as perseguições e dores que sofreram, mas graças a isso também puderam contemplar o Ressuscitado (Jo 21,1-19) e aprender dele a última lição da partilha.

Os apóstolos, ao anunciar que o crucificado ressuscitou, foram perseguidos, presos e torturados (At 5,40). Mas seu anúncio resultou na adesão de muitas pessoas que passaram a acreditar na afirmação de que por trás daquele nome estava uma mensagem salvadora. Uma mensagem redentora. Uma mensagem que conduzia a uma nova vida. Uma mensagem capaz de curar o corpo e a alma. Ou seja, a consequência da pregação dos apóstolos produziu um redirecionamento na vida de muitas pessoas.

E isso foi possível porque os apóstolos optaram por Jesus e preferiram ouvir não aos homens, não aos sacerdotes assassinos, mas a Deus que ressuscitou Jesus, o Deus da vida! “Então Pedro e os outros apóstolos responderam: É preciso obedecer a Deus, antes que aos homens” (At 5,29). Atender ao apelo daqueles que representavam o poder estabelecido, implicaria em seguir os caminhos da morte; os caminhos da tortura. Implicava em apoiar aqueles que torturaram e mataram Jesus. Os caminhos daqueles que assassinaram Jesus e não atendiam aos apelos, anseios e necessidades do povo.

E, ainda hoje, seguir a Jesus implica não só renunciar aos disseminadores de maldade e falsos pregadores que denigrem a imagem de Jesus, mas também denunciá-los como representantes das forças do mal, da morte. Qualquer líder (religioso ou político…) que valoriza mais o dinheiro, as aparências, o poder, o status… em detrimento das pessoas e suas vidas, efetivamente representa as forças que mataram Jesus; essa pessoa está usurpando o lugar de Deus. E se existe quem mereça louvor, honra, glória… é Deus. Se existe quem realmente é poderoso, esse é o Senhor que concede a vida. “Ouvi também todas as criaturas que estão no céu, na terra, debaixo da terra e no mar, e tudo o que neles existe, e diziam: Ao que está sentado no trono e ao Cordeiro, o louvor e a honra, a glória e o poder para sempre” (Ap 5,13).

E isso podemos comprovar observando a atitude de Jesus. Passou a vida mostrando que só Deus é o centro de tudo. Morreu por testemunhar que Deus opta pelos excluídos.Passou a vida mostrando que as ações de Deus ocorrem como amparo aos pequeninos. E depois, quando ressuscitado, não se apresentou com pompa nem com alarde. Pelo contrário, deu-se no pão e no vinho. Entregou a força do Espírito de Vida. Compartilhou pão e peixe, na beira do mar…. “Logo que pisaram a terra, viram brasas acesas, com peixe em cima, e pão. Jesus disse-lhes: Trazei alguns dos peixes que apanhastes (Jo 21, 9-10).

Observando tudo isso somos levados a entender que Jesus alimenta um prazer que lhe confere alegria: seu prazer é receber a oferta e a vida das pessoas. As pessoas podem oferecer a Deus sua própria vida. E isso gera sua alegria que é vivenciar e incentivar a partilha… Ele poderia dar pão e peixe aos pescadores, mas preferiu dar do que tinha e, ao mesmo tempo, receber o que os pescadores podiam oferecer!

E isso nos leva de volta à afirmação de Pedro, diante dos sacerdotes que entregaram Jesus à morte. Os mesmos que agora estavam perseguindo os seguidores de Jesus; os mesmos que tentaram impedir que a mensagem salvadora se propagasse. Diante desses falsos pregadores Pedro não teve dúvidas em fazer a denúncia e estabelecer os critérios a partir dos quais se pode observar as consequências: “Pedro e os outros apóstolos responderam: 'É preciso obedecer a Deus, antes que aos homens. O Deus de nossos pais ressuscitou Jesus, a quem vós matastes, pregando-o numa cruz. Deus, por seu poder, o exaltou, tornando-o Guia Supremo e Salvador, para dar ao povo de Israel a conversão e o perdão dos seus pecados.” (At 5,29-31)

Então, a quem ouviremos? E é importante saber a resposta, pois dela nascem consequências. O que falaremos? Também a isto temos que dar uma respostas que seja expressão de nossa vida. Mas o fato é que a Palavra Santa nos orienta, pelas palavras de Pedro: É preciso obedecer a Deus e não aos homens… e, fazendo isso, teremos consequências que abrem caminhos para a vida!




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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Os africanos no Brasil

A partir do descobrimento, os portugueses iniciaram o processo de ocupação do Brasil. Entretanto a colonização efetiva começou com as capitanias hereditárias e o cultivo da cana na região do atual Pernambuco.

Para esse processo colonizador, os portugueses apelaram, inicialmente, para a mão de obra indígena. Mas por várias circunstâncias tiveram que mudar a estratégia.

Começou uma das mais tristes e sombrias paginas de nossa história: o tráfico negreiro.

Os portugueses que já exploravam regiões da África passaram a trazer para o brasil pessoas capturadas naquele continente. Da mesma forma que já faziam em Açores e Cabo Verde, por exemplo.

Desde o início da colonização os portugueses valeram-se da exploração coercitiva da mão de obra. Dessa forma os africanos trazidos para o Brasil não tiveram outro destino: foram feitos escravos. Mas isso somente foi possível porque africanos e portugueses já conheciam a prática escravocrata. De seu lado os lusitanos já escravizavam africanos em suas colonias nas ilhas atlânticas. Os africanos, por sua vez, praticavam a escravidão em diferentes situações. Os portugueses se aproveitaram disso, incentivaram e tiraram proveito dessa característica da cultura africana, radicalizando-a

Prisioneiros de guerra, endividados, condenados pela justiça, entre outras eram algumas das condições pelas quais os povos africanos escravizavam concidadãos. Explorando essas condições, principalmente estimulando a guerra entre povos e nações africanas, os portugueses mantiveram uma fonte inesgotável de pessoas a serem escravizadas.

Não só a prática da escravidão, mas todo o processo era altamente desumano. Não só o trabalho forçado, mas os castigos físicos; não só as condições de transporte, nos navios negreiros, eram desumanas como a alimentação era escassa. O fato é que todos esses maus tratos provocavam muitas mortes na captura, no transporte e nas condições de trabalho dos escravizados.

O fato é que, ainda nos dias atuais, a mancha da escravidão encobre a possibilidade do brilho de nossa história, feita de lutas, dificuldades e vitórias.......

Neri de Paula Carneiro

sexta-feira, abril 22, 2022

Páscoa: Muitos sinais e maravilhas

(Reflexões baseadas em: Atos dos Apóstolos 5,12-16; Apocalipse 1,9-11a.12-13.17-19; João 20,19-31)




O livro dos Atos dos Apóstolos (5,12-16) nos informa que “Muitos sinais e maravilhas eram realizados entre o povo pelas mãos dos apóstolos”.Ou seja a fé no Ressuscitado estava em expansão e isso oferecia aos apóstolos oportunidade para demonstrar a força da fé.

A fé que levou o autor do apocalipse (1,9-11a.12-13.17-19) a redigir a mensagem do Ressuscitado. Mensagem pela qual aquele que é o Primeiro e o Último afirma ser o Senhor da vida e da morte. Aquele que pode dizer: “Estive morto, mas agora estou vivo para sempre”. E está vivo para mostrar o caminho da vida para aqueles que acreditam no Senhor Jesus.

Por sua vez, o Senhor Jesus manifesta-se aos seus para lhes dar o poder do Espírito (João 20,19-31). E, ao fazer isso ensina que a fé não pode se basear nos sinais, mas que deve ser desenvolvida em vista do testemunho. Por isso recrimina quem pede provas para crer: “Acreditaste, porque me viste? Bem-aventurados os que creram sem terem visto!” O que implica dizer que toda crença que se baseia nos milagres não é fé, pois bem aventurado são os que acreditam sem ver! Além disso, os sinais falam por si mesmos, sendo desnecessária a fé.

Tudo isso nos permite concluir que o tempo pascal nos coloca diante de uma indagação: somos pessoas de fé? E, se temos fé, em que ela se baseia?

Ofato é que os apóstolos, anunciando a mensagem do Ressuscitado atraiam a atenção de tantos que os ouviam. Esse era o principal sinal e a maior maravilha realizada pelos apóstolos. Suas palavras, anunciando a vida, fazia com que crescesse “o número dos que aderiam ao Senhor pela fé; era uma multidão de homens e mulheres” (At 5,14). Uma multidão que encontrava nessas palavras de vida a única esperança que ainda lhes restava. Por isso traziam seus enfermos: para o último alento. E isso não era negado pelos apóstolos… pelo contrário, era oferecido sem custos, diferente do que fazia a religião oficial e diferente do que fazem muitos credos atuais. As maravilhas do Senhor eram dons da pura Graça do Senhor e eram concedidas pelas mãos dos apóstolos não em troca de algum pagamento ou benefício, mas em resposta à um ato de fé!

Mas essa adesão à fé e pela fé, gerava desconforto. Gerava inveja. Gerava perseguição. Gerava dor e sofrimento.

Quanto maior era a adesão à nova fé, mais a religião oficial, que buscava recompensa financeira e defendia o poder estabelecido, promovia resistência e tribulações aos seguidores daquele que oferecia um novo e definitivo caminho. Para manter a alimentar a foi que o autor do apocalipse se apresenta como “companheiro na tribulação”.Apresenta-se como alguém que, em meio aos sofrimentos, foi arrebatado “por causa da Palavra de Deus e do testemunho que eu dava de Jesus” (Ap 1,9). Um arrebatamento que teve uma finalidade, estabelecida pela voz que lhe dizia: “O que vais ver, escreve-o num livro” (Ap 1,11).

Qual era a finalidade desse livro? Alimentar, ao mesmo tempo, a fé e a Esperança. Por isso que aquele que é o Primeiro e o Último diz: “Não tenhas medo. Eu sou o Primeiro e o Último, aquele que vive. Estive morto, mas agora estou vivo para sempre. Eu tenho a chave da morte e da região dos mortos” (Ap 1,18). Então a mensagem é simples e definitiva: Aquele que está vivo tem as chaves para a vida. Só ele pode abrir as portas da vida. E fará isso para todos aqueles que acreditam não por que viram algo maravilhoso, mas mediante um ato de fé!

Vale ressaltar que o ato de fé não supõe os sinais e maravilhas, mas o contrário: os sinais são resultantes do ato de fé. A fé opera milagres e não o milagre gera fé. A fé que nasce do milagre, tem vida curta, pois termina com o fim do sinal.

Aqui é que entendemos o diálogo de Jesus e Tomé, o que diz só acreditar se puder ver. Mas aquele que acredita porque vê, não tem fé. O fato de ver, a presença da evidência, dispensa a fé. Por isso Jesus, além de lhe mostrar as mãos e pés trespassados, lhe diz quem são os bem aventurados: os que não precisam de sinais para crer. Esses que creem sem ter visto são capazes de realizar muitos sinais e maravilhas, pois são movidos pela fé.




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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sábado, abril 16, 2022

Sábado da Luz: Aquele que está vivo

(Reflexões baseadas em: Gênesis 1,1–2,2; Êxodo 14,15–15,1; Lucas 24,1-12)



A conclusão da Semana Santa ocorre num ambiente de Luz. E não podia ser diferente!

Depois de celebrar a completa entrega de Jesus, estamos celebrando as consequências ou o prêmio por tamanha doação: a Luz da Restauração da Vida.

A celebração da luz começa com o próprio ato criador, no livro do Gênesis (1,1–2,2), pois ao criar o céu e a terra, a primeira Palavra Criadora diz: “Faça-se a luz! E a luz se fez” (Gn 1,3).

Mas não só fez a luz, o Senhor, também entregou ao mundo algo que era bom, pois separava as trevas da luz. A luz, dom de Deus, é entregue para permitir ao ser humano construir coisas boas. Deus deu a luz como dom do Espírito iluminando as tomadas de decisões.

Mas também acompanhamos a Luz Protetora na cena do Êxodo (14,15–15,1), na caminhada para a Libertação.

A Páscoa dos Judeus se conclui com a travessia do Mar. Com a caminhada pelo deserto protegidos por uma nuvem que, para os hebreus era proteção e para os egípcios era assustadora.Posicionada entre os hebreus e seus perseguidores a nuvem divina tinha duas funções: “Para aqueles a nuvem era tenebrosa, para estes, iluminava a noite. Assim, durante a noite inteira, uns não puderam aproximar-se dos outros” (Ex 14,20).

Por meio dessa nuvem protetora o Senhor se posicionava em favor dos seus escolhidos. “O Senhor lançou um olhar, desde a coluna de fogo e da nuvem, sobre as tropas egípcias e as pôs em pânico” (Ex 14,24). Ou seja, a proteção divina se dá de forma luminosa. E, ao mesmo tempo, quando invocada pelo justo, a luz divina põe a perder as armadilhas dos maldosos, como o fez com os carros e soldados do Faraó. A luz divina “Livrou Israel da mão dos egípcios”. A luz do Senhor ao proteger seu povo alimentou a fé desse povo (Ex 14,30-31)

É assim a celebração da luz no sábado em que comemoramos a Ressurreição de Jesus: Deus dando seu Filho para redimir sua criação e mostrando o caminho da redenção por meio do ato da Ressurreição (Lucas 24,1-12).

As trevas cobriram o mundo quando as ações humanas proliferaram na geração da maldade. As nuvens tenebrosas afastaram as pessoas da prática do bem. As trevas estavam embaçando os olhos dos promotores do bem. As nuvens da maldade estavam se instalando entre as pessoas… e tudo isso estava afastando as pessoas do convívio divino. Toda a maldade humana estava afastando o ser humano de seu destino, que repousar no colo do Criador.

Por isso Jesus se fez Luz para todos. Para iluminar novos caminhos, Jesus recupera a vida e faz de sua vida Plena Luz para cada ser humano que o procura.

De dentro da escuridão do sepulcro, a Luz divina se reapresenta como plenitude de vida, re-entregando a vida ao autor da vida. E Jesus sai do túmulo não como um derrotado, mas como aquele que indica o caminho da vitória. O caminho da vitória da vida sobre a morte.

O caminho da vitória da vida começa a ser indicado com as mulheres chegando ao túmulo e o encontrando aberto.Elas “não encontraram o corpo do Senhor Jesus” (Lc 24,2-30. Não o encontraram porque ele estava vivo!

Em seguida elas viram a Luz divina na “roupa brilhante” dos dois homens que lhes comunicaram: “Por que estais procurando entre os mortos aquele que está vivo? Ele não está aqui. Ressuscitou! Lembrai-vos do que ele vos falou” (Lc 24, 4-6).

E a indicação do caminho da Luz prossegue na postura das mulheres. Mesmo com medo elas se fazem mensageiras da vida. Mesmo sabendo-se fracas, levam a mensagem de vida. Mesmo estando mergulhadas na dor, recordam o que ouviram e se fazem as primeiras a anunciar que a nova vida é possível. Tão possível que Jesus as precedeu. Tão possível que Jesus está mostrando o caminho: “Então as mulheres se lembraram das palavras de Jesus. Voltaram do túmulo e anunciaram tudo isso aos Onze e a todos os outros (Lc 24, 8-9).

O caminho da nova vida, o caminho da luz, o caminho da redenção é esse percorrido pelas mulheres assustadas: anunciar que a morte foi derrotada. Anunciar que Jesus venceu a morte. Anunciar que Jesus está vivo.

Jesus é aquele que está vivo e mostra o caminho da vida para a Luz.




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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sexta-feira, abril 15, 2022

Paixão do Senhor: Tomou nossas enfermidades e sofreu nossas dores

(Reflexões baseadas em: Isaías 52,13–53,12; Hebreus 4,14-16; 5,7-9; João 18,1-19,42)




Sabemos que a Semana Santa: a quinta, a sexta e o sábados perfazem o grande momento da vida de Jesus, no qual ele faz o coroamento de sua missão no mundo humano.

Por esse motivo, é claro que a Semana Santa é um tempo de recolhimento. É evidente que na Sexta Feira Santa somos convidados a intensificar o Jejum, a oração, a caridade… e todas as virtudes cristãs.

Pensando na concretização desse projeto foi que a Igreja assumiu a narrativa de Isaías (52,13–53,12), sobre o Servo Sofredor. E a Igreja faz isso justamente para mostrar que, se Jesus “entregou seu corpo à morte” não foi por ter fracassado em sua missão. Pelo contrário, ao fazer isso “ele, na verdade, resgatava o pecado de todos e intercedia em favor dos pecadores” (Is 53,12).

E, podemos dizer, Jesus é identificado com o Servo Sofredor não porque sofreu todas as humilhações e dores e castigos e foi abandonado pelos discípulos…. Claro que tudo isso produziu dores e ele sofreu por causa delas. Entretanto o Servo do Senhor é sofredor, antes disso, porque viu seu povo se afastando do Pai. É sofredor porque sofreu sabendo que as pessoas tinham tudo para viver em um mundo de paz, alegria e justiça… mas afastaram-se desse projeto e, ao se engajarem num projeto de morte, começaram a matar a santidade, ameaçaram a paz, destruíram a justiça, implantaram o pecado… e tudo isso faz o Servo sofrer.

Então o sofrimento do Servo, tem um significado. Ele sofreu porque “tomava sobre si nossas enfermidades e sofria, ele mesmo, nossas dores”. O Servo sofreu “por causa de nossos crimes; a punição a ele imposta era o preço da nossa paz, e suas feridas, o preço da nossa cura” (Is 53,4-5).

Assim sendo, se para nos resgatar, esse foi o preço pago pelo Servo Sofredor torturado pelos poderosos de seu tempo e na cruz, cabe a nós a postura de quem aceita essa redenção. Mas não um aceitar com palavras e orações vazias. Não com a ostentação da opulência e da riqueza. Não com a busca de privilégios e troca de favores, como é comum no jogo político, como narra João (18,1–19,42), na cena da condenação de Jesus.

Cena na qual Jesus foi condenado não por ser culpado de algo, mas por conta dos interesses políticos de seus acusadores: “Pilatos procurava soltar Jesus. Mas os judeus gritavam: 'Se soltas este homem, não és amigo de César. Todo aquele que se faz rei, declara-se contra César'. Ouvindo estas palavras, Pilatos trouxe Jesus para fora e sentou-se no tribunal, no lugar chamado 'Pavimento', em hebraico 'Gábata'. Era o dia da preparação da Páscoa, por volta do meio-dia. Pilatos disse aos judeus: 'Eis o vosso rei!' Eles, porém, gritavam: 'Fora! Fora! Crucifica-o!' Pilatos disse: 'Hei de crucificar o vosso rei?' Os sumos sacerdotes responderam:'Não temos outro rei senão César'. Então Pilatos entregou Jesus para ser crucificado, e eles o levaram.” (Jo 19, 12-16).

Olhando para tudo isso, para os jogos de interesses em nossa sociedade e para o desejo de Deus em nos purificar, cabe a nós corresponder sendo parceiros do Servo Ressuscitado na construção do mundo novo onde impera não não a maldade e exclusão mas a partilha solidária. Não os privilégios dos poderosos, mas justiça dos preferidos de Deus. Não os interesses dos torturadores que provocaram as dores do Servo Sofredor, mas a paz de quem sabe em quem confiar.

Isso porque, para nós, Jesus não é só o Servo Sofredor, mas é também o único mediador (Hebreus 4,14-16; 5,7-9) entre nosso mudo de maldades e o Reino definitivo. Esse mediador, que também nos representa é o próprio Filho que conheceu as dores humanas ao ser torturado. E por tê-las conhecido, as redimiu.

Isso nos diz a carta aos Hebreus: “Temos um sumo sacerdote eminente, que entrou no céu, Jesus, o Filho de Deus. Por isso, permaneçamos firmes na fé que professamos. Com efeito, temos um sumo sacerdote capaz de se compadecer de nossas fraquezas, pois ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do pecado” ( Hb 4,14-15).

Jesus, o Servo de Deus, continua sendo vítima dos torturadores atuais. Mas de uma vez por todas e definitivamente “tomou nossas dores” e assim “a punição a ele imposta era o preço da nossa paz, e suas feridas, o preço da nossa cura” (Is 53,5). Resta saber se vamos colaborar na obra da redenção e se estamos merecendo essa redenção mediante nossa e colaborando com a obra da salvação.




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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terça-feira, abril 12, 2022

Lava Pés - Se eu não te lavar

(Reflexões baseadas em: Êxodo 12,1-8.11-14; 1 Coríntios 11,23-26; João 13,1-15)




A Semana Santa nos convida a diferentes reflexões. Uma delas pode ser feita a partir da celebração da Quinta Feira Santa: o “Lava Pés” (João 13,1-15).

Todos os anos revivemos os passos de Jesus, nos últimos dias de sua caminhada terrena. E também os últimos momentos, a partir do “Lava Pés”, na Quinta Feira Santa, quando Jesus surpreende os presentes, mais uma vez fazendo aquilo que ninguém esperava.

O“Lava Pés” é o momento no qual Jesus dá mais uma amostra de sua humanidade e de sua paixão pelas pessoas. E demonstra isso no gesto de lavar os pés dos discípulos. Algo completamente diferente da função do Mestre. Um gesto que o Mestre executa, justamente para ensinar mais uma lição! A lição de servir: Deus que se fez homem para ensinar o ser humano a servir aos semelhantes!

O gesto de Jesus também pode ser entendido como um sinal de escolha. Ao escolher os doze apóstolos, lhes confere uma missão. E o gesto de lavar os pés reforça o significado dessa missão: o discípulo é escolhido não para o privilégio, mas para o serviço. Aquele que se faz chamar cristão, mas que não se coloca a serviço, que não se faz promotor do bem… não entendeu a mensagem do Senhor! E, portanto, não se fez discípulo!!!

O simbolo da escolha, da eleição e do compromisso não se manifesta apenas no gesto de Jesus. Também aparece na cena do livro do Êxodo (12,1-8.11-14), na qual o Senhor orienta Moisés: os hebreus devem colocar um sinal diferenciador no portal de suas casas.

Para o povo eleito, a celebração da Páscoa não foi só a preparação para a travessia do deserto; nem só um projeto de libertação. Foi, antes disso, o gesto do sacrifício do cordeiro e aspersão dos portais com seu sangue: e isso foi a concretização da Aliança, a demonstração da eleição. A redenção dos sofrimentos e a libertação da escravidão tiveram um sinal distintivo: o portal assinalado. O sangue do cordeiro foi sinal de preservação de vida, na Antiga Aliança.

Em Jesus, novo cordeiro, o sangue é sinal de uma Nova Aliança. O novo povo escolhido, agora é marcado com o sinal da predileção divina: o sangue do Novo Cordeiro. Um Cordeiro que não foi apanhado entre outros tantos, dentro de um cercado, mas é aquele que se oferece voluntariamente. E isso quem nos explica é Paulo escrevendo à comunidade de Corinto (1 Cor 11,23-26).

O apóstolo afirma que está transmitindo o que recebeu dos companheiros de Jesus e do próprio Senhor que lhe aparece na caminhada. O apóstolo faz a memória do gesto de doação: “O Senhor Jesus tomou o pão e, depois de dar graças, partiu-o e disse: 'Isto é o meu corpo que é dado por vós. Fazei isto em minha memória'. Do mesmo modo, depois da ceia, tomou também o cálice e disse: 'Este cálice é a nova aliança, em meu sangue.” (1 Cor 11,23-25).A Memória e a Aliança são concretizadas no pão e vinho, corpo e sangue oferecidos.

A diferença é que agora não é um sacerdote que executa o sacrifício do Cordeiro, mas e o próprio Cordeio que se oferece: sacrifica-se, por aqueles a quem escolheu.

Sua oferenda, que consiste em lavar a maldade das pessoas com seu sangue revitalizante, começa com o gesto de lavar os pés dos discípulos.Lavar os pés dos discípulos, que é uma lição de serviço, demonstra que o mestre não é aquele que se põe acima, mas o que serve, por isso está aos pés. Não é quem recebe os aplausos, mas quem convida para a doação. Não é quem oferece poder, mas quem pode redefinir e dar nova direção à vida das pessoas.

Mas as pessoas nem sempre percebem isso;nem sempre entendem o significado do gesto. Como o fez Pedro: “Tu nunca me lavarás os pés!” (Jo 13,8). Por isso o argumento de Jesus, referindo-se não só ao “lavar” com as águas da bacia, mas o banho com seu sangue. Ou seja, o “lavar os pés” é uma preparação para lavar a vida, com o sangue redentor. Daí a profundidade do argumento de Jesus: “Se eu não te lavar, não terás parte comigo” (Jo 13,8). ou seja: agora lavo teus pés, na cruz lavo tua vida!

O fato é que Jesus, realizou o gesto de lavar os pés e a vida de todos. Resta saber: com nossos gestos e nossa vida estamos nos deixando lavar ou estamos recusando o banho salvador?Estamos aceitando o banho salvador ou nos sujando e sujando o mundo? Resta saber se aprendemos a lição do serviço, realizado cotidianamente em favor daqueles que estão ao nosso redor. Resta saber se estamos ouvindo o argumento de Jesus: “Se eu não te lavar, não terás parte comigo”.




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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quinta-feira, abril 07, 2022

Ramos – Tornou-se igual aos homens

(Reflexões baseadas em: Isaías 50,4-7; Filipenses 2,6-11; Lucas 22,14-23,56)




A celebração do domingo de Ramos chama nossa atenção para a condição humana de Jesus. E quem nos informa isso é Paulo na carta aos Filipenses (2,6-11). E, ao mesmo tempo, o Profeta Isaías (50,4-7) mostra alguns aspectos da humanidade desse rapaz, tão diferente e, ao mesmo tempo, tão igual a todas as pessoas. Não esquecendo que o próprio Jesus (Lucas 22,14-23,56) demonstra sua humanidade ao se oferecer na partilha do pão e do vinho, na ceia.

Esse rapaz, o jovem de Nazaré, o Galileu, o Filho do Carpinteiro, o Filho de Maria, esposa de José… esse rapaz saiu por aí… e falava e curava e ensinava e anunciava a proximidade do Reino e dizia que todos são chamados para esse Reino e que para entrar no Reino tem que seguir seus passos… numa opção definitiva: promover a transformação das condições e relações entre as pessoas, fazendo com que estas relações passem a ser fundamentadas no amor, realizadas com amor, movidas pelo amor… amorizando tudo!

Esse rapaz dizia que seus seguidores deveriam agir, continuando a realizar suas obras: falar das coisas divinas que estão entre os serem humanos; curar as dores do corpo e da alma; ensinar os caminhos que conduzem ao Pai; anunciar a proximidade do Reino e, como ele, se preciso dar a vida para que o Reino de Amor se instale…

E aqueles que se fizeram chamar Cristãos, ao longo dos últimos vinte séculos, vêm tentando cumprir esse preceito; vêm tentando vivenciar esse ensinamento.

Nestas alturas alguém pode perguntar: Que tem isso a ver com o domingo de Ramos?

Antes de responder, e para começar a responder, é bom lembrar que esse rapaz foi chamado de louco, por causa de suas ideias. Foi perseguido por causa de suas pregações. Foi preso por causa de suas afirmações e foi condenado por causa de seus ensinamentos. Mesmo assim muita gente o seguiu. Muitos acreditaram. E, ao longo destes últimos vinte séculos, muita gente trilhou seus passos e deu a vida por suas ideias.

Por isso é que tudo tem a ver. E tem a ver justamente com a proposta de Jesus.

Só que nem todos entenderam a proposta. E os que não a entenderam o receberam festivamente, quando entrou em Jerusalém. E, por não terem entendido sua proposta, festejaram como Mestre, quando ele ensinou o caminho para ser discípulo: “O Senhor Deus deu-me língua adestrada, para que eu saiba dizer palavras de conforto à pessoa abatida; ele me desperta cada manhã e me excita o ouvido, para prestar atenção como um discípulo.” (Is 50,4). Somete quem se faz discípulo aprende a usar o dom da palavra (língua) para dizer boas palavras! Mas quem não o entende cria uma fé de aparências e de luxo.

Não é essa a proposta de Jesus e nisso está sua humanidade. Mesmo sendo Deus, fez-se homem; sofreu como homem. Por esse motivo compadeceu-se do ser humano. Por ser um Deus amoroso, fez-se homem para mostrar ao ser humano os caminhos da superação. Com essa perspectiva é que entendemos seu sofrimento salvador.

Diz o apóstolo Paulo: Jesus abriu mão da sua condição divina “tornando-se igual aos homens” (Fl 2,7). E como um homem, Jesus aceitou a humilhação da morte na cruz. Como ser humano, naturalmente morreria, mas ele deu novo sentido à morte: sua morte não foi ao fim de uma vida tranquila depois de ter feito o bem. Pelo contrário: no auge da vida ele a ofereceu em favor de todos. E foi essa oferta que o Pai levou em consideração. Por causa dessa morte, resultado de sua doação em favor de todos, foi que “Deus o exaltou acima de tudo e lhe deu o Nome que está acima de todo nome” (Fl 2,9).

Outra amostra de sua humanidade, Jesus a apresenta em sua despedida. Confessa que desejou comer a ceia com os discípulos, e sabe que vai sofrer. Sabe que essa é uma despedida. Mas também sabe que esse é o caminho para o Reino, para uma Ceia eterna, na Páscoa definitiva (Lc 22,15-16). E nisso aparece mais um gesto humano, na ação de Jesus: deixar uma lembrança no abraço de despedida. Foi o que fez!

Na partilha do pão e do vinho, recebidos da graça divina, criou um novo sentido para o pão, para o vinho e para a própria partilha: o vinho passa a ser sangue, o pão torna-se corpo e a partilha é o próprio gesto de se doar. Ao entregar o cálice, disse para reparti-lo como “a nova aliança no meu sangue, que é derramado por vós”. O mesmo fez ao partir o pão. Entregou-o como seu corpo: “Isto é o meu corpo, que é dado por vós” (Lc 22,17-20).

É o gesto de quem parte mas quer permanecer. E, para permanecer, fez-se pão e vinho. Tudo isso porque, mesmo sendo de condição divina, tornou-se igual aos homens!

Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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sexta-feira, abril 01, 2022

Quaresma 5 – Isto diz o senhor

(Reflexões baseadas em: Isaías 43,16-21; Filipenses 3,8-14; João 8,1-11)




Por que Jesus não deu atenção aos acusadores da mulher adúltera (João 8,1-11) e continuou escrevendo no chão, mesmo quando eles pretendiam apedrejá-la, segundo a lei de Moisés?

O que Jesus escrevia no chão, enquanto os acusadores esbravejavam contra a vida da mulher?

Qual é a atitude de Jesus diante dos pecadores e como ele responde aos que tentam condená-los? Por que Jesus age dessa forma?

Essas são algumas das indagações que podemos nos fazer, se quisermos desenvolver uma fé esclarecida; se quisermos aderir de corpo e alma à proposta de Jesus.

Ea resposta às indagações nos são oferecidas pelo próprio Senhor, ao se dirigir à mulher prostrada à sua frente. Primeiro ele se dirige à mulher, indagando sobre os acusadores: “Ninguém te condenou?” E ela, certamente tremendo de medo: “Ninguém, Senhor”. Nessa hora é que Jesus explica o motivo de sua postura: “Eu também não te condeno. Podes ir, e de agora em diante não peques mais” (Jo 8,10-11)

Condenar a mulher pecadora, não é o objetivo de Jesus. Deus não criou este mundo maravilhoso, pondo nele o ser humano como o ponto mais alto da criação, para condená-lo. Não é para a condenação que o ser humano existe, mas sim para a adesão a Deus, para o seguimento de Jesus Cristo.

Por isso Jesus diz: “Não te condeno”. E Ele diz mais: “Não peques mais!”

Quer dizer: Deus oferece o perdão a todo aquele que se percebe caindo pelas fraquezas humanas. Mais ainda: Ele deu a vida para nos livrar do pecado.Por isso, ao dizer “não peques mais” disse também: Eu te perdoo. Afaste-se daquilo que pode te lavar a morte. Fique comigo para ter vida.

O apedrejamento seria a morte. Ao evitar que a mulher fosse apedrejada, Jesus lhe oferece nova vida. Mas, para isso: “Não peques mais”. Quer dizer, mude de vida! A vida envolvida no pecado leva à morte, não do corpo, mas da vida eterna. Só o seguimento de Jesus nos mantém no caminho da vida.

Isso nos ajuda a entender o que afirma Isaías (43,16-21), ao exaltar os feitos de Deus para com seu povo.

Efaz isso para exaltar a libertação do povo que estava em situação de opressão e de morte; para conduzi-lo em direção à vida. Para que esse povo tenha vida, diz o profeta, oferecendo sua voz ao Salvador: “Fiz brotar água no deserto e rios na terra seca para dar de beber a meu povo, a meus escolhidos. Este povo, eu o criei para mim e ele cantará meus louvores” (Is 43,20-21).

Aqueles que caminham para a vida plena cantam os louvores de Deus pois sabem que receberam a vida como dom de Deus.

Em nome dessa vida e direcionando-se para essa meta, prometida por Jesus, é que o apóstolo Paulo faz sua aposta (Filipenses 3,8-14).

Notemos a radicalidade de sua aposta: Tudo é um nada diante da proposta e promessa do Senhor: “Na verdade, considero tudo como perda diante da vantagem suprema que consiste em conhecer a Cristo Jesus, meu Senhor. Por causa dele eu perdi tudo. Considero tudo como lixo”. A aparente perda de tudo, significa um ganho supremo, pois isso implica fazer a aposta “para ganhar Cristo e ser encontrado unido a ele” (Fl 3,8).

Então voltemos à nossa indagação inicial:Por que Jesus não deu atenção aos acusadores da mulher adúltera e continuou escrevendo no chão? O que escrevia?

Sabemos que Jesus não quer a condenação e morte, mas a contrição e a vida. Talvez por isso é que, passou a escrever na areia alguns sinais de vida ao invés de confrontar os acusadores que desejam a morte. Talvez tenha escrito que mais grave que um erro carnal é a traição em relação à vida, um dom de Deus. Talvez os acusadores, querendo matar a mulher, não tivessem percebido que, eles sim, estavam traindo o preceito divino de preservar a vida. Talvez a partir de seu pecado de acusar, condenar e querer executar a mulher, não estivessem percebendo que se deve condenar o erro e o pecado, mas é necessário oferecer condições de perdão e recuperação ao pecador.

“Isto diz o Senhor”, fala Isaías. E Jesus repete: “Não te condeno. Podes ir, e de agora em diante não peques mais.”




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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quinta-feira, março 31, 2022

Rondônia: Os primeiros passos da colonização

1- Pouco sabemos

Pouco sabemos a respeito das primeiras eras do planeta, em relação a amazônia. Mas a formação da região acompanhou os ciclos de formação de outras regiões da terra. Dessa forma podemos dizer que a região amazônica existe desde as origens do planeta, mas a presença do ser humano pode ser confirmada desde aproximadamente 11.000 anos.

Os pesquisadores falam de povos ancestrais que viveram e desapareceram deixando apenas seus vestígios e a indagação a respeito do que lhes teria acontecido, de onde vieram e qual seu destino. Também é incerta a origem das atuais nações indígenas que ainda sobrevivem na amazônia.

Sabemos que esses povos viviam da coleta e da caça, mas não podemos dizer quais deles eram mais desenvolvidos nem os que já haviam atingido o estágio sedentário. O que os pesquisadores nos informam é que pela amazônia eles deixaram seus sinais em antigas construções e nos sambaquis.

Um pouco mais próximo de nós estão os atuais povos. Aqueles que aprendemos a chamar de índios. Também não sabemos sua origem, mas representam outro grupo de ocupantes da América e, consequentemente, da amazônia pré-colombiana.

Se por um lado a presença dos povos ancestrais é indefinida, por outro lado a presença do homem branco europeu é mais facilmente localizada no tempo. Embora existam indícios de que os Vikings podem ter passado pela América, os registros históricos nos indicam que as primeiras expedições de europeus pela amazônia podem ser situadas a partir do século XVI. O primeiro europeu, a mando da Espanha, desceu dos Andes seguindo o curso do rio Amazonas até chegar ao Atlântico, em 1542. Seu nome Francisco Orellana.

Da parte dos portugueses, a aventura coube a Raposo Tavares. Saiu de São Paulo, em 1648 com mais de mil acompanhantes: colonos, carregadores e índios escravizados. Em seu trajeto usou os rios Tietê, Paraguai, Grande, Guaporé, Madeira e Amazonas.

Pelo seu trajeto sabemos que passou pela região que futuramente seria Rondônia e seguiu pelos rios Madeira e Amazonas até o litoral atlântico. Retornou a São Paulo pelo litoral atlântico, em 1651. Nesses três anos de expedição, dos mais de mil integrantes da expedição, retornaram 59 brancos e alguns índios.





2- Os caminhos para a amazônia

Os caminhos para a amazônia está ornado pelas lendas que moveram o interesse pela região.

Inicialmente e a partir das primeiras expedições de europeus, cresceu a ideia de que na imensidão da floresta existiam tesouros inimagináveis, mas sonhados. Falou-se das ricas terras guerreiras Amazonas, tão cobiçadas e descritas como belas, mas nunca vistas ou encontradas.

Também se falava de um país rico, o Eldorado. Local onde era possível tomar banho em lagos de ouro em pó. O que, também, nunca foi encontrado, mas, nem por isso, deixou de alimentar os sonhos e as ambições dos exploradores.

Tanto isso é verdade que os espanhóis aventuraram-se pelos rios da região. Não queriam colonizar e habitar, mas apenas explorar e saquear as tão sonhadas riquezas minerais. Não as encontrando, nem as sonhadas florestas de canela, dedicaram-se à escravização de índios. Todas as incursões espanholas, se deram mediante exploração fluvial, facilitada pela navegabilidade dos grandes rios. Mas estes e concentraram nas proximidades dos Andes, que era sua região por direito, assegurado me Tordesilhas em 1494.

Pelo lado português a aventura amazônica se dá quando avançam para além da divisa de Tordesilhas. Inicialmente apenas como aventureiros e exploradores em busca de coisas de valor.

No ano de 1616 os portugueses erguem o Forte do Presépio, dando origem à cidade de Belém. Passados 21 anos (1637) Pedro Teixeira explora a região em busca das drogas do sertão e riqueza minerais. Navega pelos rios amazônicos e na bacia do Madeira explora a salsaparrilha, cravo, copaíba e baunilha. Mas não achou nem ouro nem prata.

Também a partir do sul, da atual região de São Paulo, os bandeirantes se embrenharam na busca de mão de obra escrava. Esses bandeirantes acharam ouro. O chamado ouro de aluvião, nas margens dos rios. Com essas incursões forma-se o arraial do Senhor Bom Jesus de Cuiabá. Também avançando para além dos limites da linha de Tordesilhas.

Essa região foi chamada de Mato Grosso porque a vegetação era diferente daquelas campinas da chapada dos Parecis. Na chapada a vegetação é de cerrado e nesse interior Mato-Grossense a floresta era densa e com grandes árvores. Área de transição do cerrado e o mundo amazônico.

Entretanto, ao longo de todo o século XVII tanto portugueses como os espanhóis não haviam assegurado a efetiva ocupação da amazônia nem de Rondônia. Os motivos: a dificuldade em sobreviver aos desafios da floresta; e inexistência de minerais e pedras preciosas; a indefinição da fronteira; a valentia dos índios…

O domínio português só se efetivou a partir de meados do século XVIII, a partir do tratado de Madri, em 1750.



3- Para ser o que é

Para ser o que é hoje, o Brasil foi sendo construído por conquistadores e por acordos entre Portugal e Espanha.

Entre os anos de 1580 e 1640 Portugal e Espanha estiveram unidos sob um só governo. Esse período é denominado de União Ibérica. Isso ocorreu porque o rei português havia morrido e o rei espanhol, parente do falecido, assumiu o trono. assim as duas nações passaram a ser uma só.

Nas colonias americanos isso representou a solução de um problema. Onde começava e onde terminava o território de cada nação? Agora tudo sob o mesmo rei, não havia motivos para respeitar o antigo tratado de Tordesilhas, de 1494.

Aconteceu que, em 1640, os portugueses recuperam a autonomia. Termina a união. Invocaram-se, novamente, as antigas divisas. Entretanto e na prática da colonização, colonos de ambas as nações haviam avançado. E contestaram a iniciativa pois havia muitos colonos, de ambos os lados, ocupando áreas além dos limites de Tordesilhas. Na prática dos colonos esse tratado fora anulado.

Por esse motivo as duas nações se propuseram fazer um novo acordo. Este, agora, assinado em Madri, no ano de 1750. Ficou conhecido como Tratado de Madri. É que se costuma denominar o tratado com o nome da cidade onde é assinado.

Graças a esse acordo as duas nações evitaram uma guerra na Europa. Mas isso não eliminou os conflitos entre os colonos. Como ambos os lados haviam avançado, retroceder seria perder os investimentos e benfeitorias já realizadas. E os atritos se deram. De forma mais intensa no sul e de forma menos agressiva na amazônia.

Mas é fato que, também no norte, na grande amazônia, havia muitos ocupantes das duas nações hostilizando-se mutuamente. E os riscos de invasão era constante. Por essa razão ao longo de toda a fronteira norte do Brasil foram erguidos vários fortes. A presença militar era a forma de assegurar o domínio.

Entre esses fortes foi edificado um nas margens do rio Guaporé: o Forte Príncipe da Beira. Sua função era evitar uma possível invasão espanhola, assegurar o domínio português e dar suporte aos aventureiros que desejassem colonizar o universo verde da amazônia que no século XX seria Rondônia.

Com base no Tratado de Madri, Portugal cedia à Espanha a Colônia de Sacramento, atual Uruguai. E o governo espanhol entregava a Portugal a região dos Sete Povos das Missões, no Rio Grande do Sul.

O tratado foi assinado com base no “uti possidetis, ita possideatis”, um antigo princípio do direito romano e significa que quem ocupa um território é seu proprietário. Alguns colonos e muitos missionários portugueses haviam se estabelecido nas proximidades do rio Amazonas e seus afluentes. Os portugueses invocavam isso para assegurar seu direito sobre a amazônia.





4- A Divisa Oeste

A divisa oeste, do Brasil, precisou ser defendida, no processo de interiorização das colônias. Nasceu, assim, uma cadeia de fortificações ao longo da fronteira oeste do Brasil.

Os fortes, inicialmente foram erguidos no litoral, para defender a colonia contra franceses e holandeses. Quando a ocupação avançou para o interior foi que surgiram outras necessidades

Devemos notar, entretanto, que a instalação dessas fortificações são tardias em relação à colonização do litoral, que ocorreu desde o início, após o descobrimento. A ocupação oeste se deu a partir do século XVII, quando os portugueses se decidiram enfrentar e expulsar os invasores: franceses, ingleses e holandeses.

Só a título de exemplo podemos mencionar que em 1669 foi instalado o forte São José do Rio Negro para conter a circulação e navegação espanhola. E os fortes Paru e Macapá, instalados em 1685 tinham a função de impedir a presença francesa na região. Entretanto, um dos mais antigos é o forte do Presépio, fundado em 1616, o qual deu origem à cidade de Belém.

No processo de ocupação da amazônia os fortes também ganharam a função de ponto de apoio para os colonos. Além disso, a partir do fim da União Ibérica, quando os colonos buscavam apoio para efetivar a ocupação da região, os fortes passaram a representar a força portuguesa na região. E após a assinatura do Tratado de Madri asseguraram a presença portuguesa na amazônia e, com isso, garantiram a posse lusitana.

Da mesma forma que as fortificações, as missões religiosas também representaram a marca do homem branco na região. Os principais grupos missionários foram os carmelitas, instalados em 1627 e os Jesuítas que chegaram em 1636. Evidentemente, além destas, várias outras ordens religiosas vieram para a região, mas pode-se dar um crédito a mais às missões dos Jesuítas visto que em 1720, das 63 missões na região, 19 estavam só o comando da Companhia de Jesus.

Com o objetivo de catequizar os índios, apresentando-lhes a proposta do cristianismo, os missionários instalavam as missões que consistiam, basicamente, em uma moradia para os missionários, uma igreja e uma escola. Essa estrutura podia ser ampliada na medida em que se obtinha sucesso na missão.

Deve-se ainda registrar que as missões também serviram como ponto de apoio aos colonos, exploradores e coletores das drogas do sertão. E, sem sobra de dúvidas foram estes personagens que efetivaram a expansão territorial da colonia que virou Brasil.

Emfim, podemos dizer que os fortes e as missões desempenharam importante papel não só na definição da fronteira oeste como também foram fundamentais para ajudar a fixação do colono ao mesmo tempo que repeliam os ataques estrangeiros.

O fato é que a amazônia, e neste caso, Rondônia, só foi incorporada ao Brasil porque missionários e colonos resolveram ultrapassar as divisas...

Neri de Paula Carneiro
Mestre em Educação, Filósofo, Teólogo, Historiador
Rolim de Moura - RO

Sagrada Família: para se cumprir!

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