quinta-feira, outubro 19, 2023

A Deus o que é de Deus

(Isaías 45,1.4-6; 1Tessalonicenses 1,1-5b; Mateus 22,15-21)



Quais os planos de Deus? Quem é escolhido por Deus? O que deve ser ofertado a Deus?

A primeira indagação tem a ver com o profeta Isaías (Is 45,1.4-6). Nestes poucos versículos o profeta mostra como Ciro, rei persa, um estrangeiro, é visto e apresentado como emissário de Deus.

O contexto é o final do período exílico. Ciro acabara de vencer os babilônios e o profeta vê nisso um indício de que o fim do cativeiro está próximo, pois o jovem rei está vencendo seus inimigos. E, do ponto de vista político, trata-se de uma leitura simples: derrotando os adversários, Ciro pode a ser visto como aliado do povo hebreu. Portanto os dados históricos e políticos são fáceis de entender.

Entretanto a questão é anterior. É saber qual o propósito de Deus em permitir que seu povo tivesse sido dominado e exilado. A resposta histórica: porque o império babilônico estava em expansão e os descendentes de Abraão estavam em decadência moral e política. Mas do ponto de vista religioso, entende-se que o cativeiro ocorreu porque os dirigentes do povo se corromperam, aderiram a outros deuses e aceitaram os valores das nações dominantes. Ou seja, a corrupção da classe dirigente respingou malefícios sobre o povo.

Como o Senhor não abandona os seus, Isaías vê em Ciro o enviado de Deus, para purificar o povo, depois de “dobrar o orgulho dos reis” (Is 45,1). O rei persa é escolhido pelo nome, “por causa de meu servo Jacó, e de meu eleito Israel” (Is 45,4), diz o Senhor que sempre se apresentou como único Deus (Is 45,5-6).

Qual o plano de Deus? Apresentar-se: “Eu sou o Senhor, não há outro”(Is 45,6).

Paulo (1 Ts 1,1-5) acrescenta novo ingrediente: mostra que esse único Deus é, também, trino. E por ser trino é uma comunidade e mobiliza a comunidade dos crentes para a união e a oração. E Paulo constata isso em Tessalônica. A comunidade está, “reunida em Deus Pai e no Senhor Jesus Cristo” (1 Ts 1,1) e se mantém produzindo frutos os frutos da fé que é “o esforço da vossa caridade e a firmeza da vossa esperança” (1Ts 1, 3), mediante a “força que é o Espírito Santo” (1Ts 1,5). É a ação da trindade que mantém a comunidade.

Paulo mostra, dessa forma, que além do estrangeiro Ciro ser escolhido pelo Senhor, o próprio Senhor se manifesta aos estrangeiros, pois a comunidade cristã de Tessalônica é uma comunidade de uma cidade grega. Ou seja, a Igreja que nasceu do sangue do cordeiro, tem vocação para ir além das fronteiras. É uma igreja missionária. Não é de Israel, é do mundo!

Sendo uma comunidade missionária, o que a Igreja pode entregar a Deus?

Evidentemente não é a atitude vil dos representantes do povo, como mostra Mateus (Mt 22,15-21). Aqueles que se fazem dirigentes do povo traçam planos para enganar e angariar proveito próprio. O exemplo está aqui: adversário como fariseus e herodianos (Mt 22,15-16) são capazes de se unir para praticar maldades. Ocorria lé e continua aqui: partidos adversários que se unem para enganar o povo alcançar o poder… e usufruir dos benefícios do poder.

Esse exemplo nefasto se perpetuou e muitos daqueles que, atualmente, são ou pretendem ser representantes do povo manobram para enganar à população. Da mesma forma que tentaram enganar a Jesus. Aqueles foram desmascarados pelo Mestre. Cabe a nós, nos dias atuais, não nos deixarmos levar na onda dos espertalhões. Desmascarar aqueles que nada plantam junto ao povo, mas em jogadas eleitoreiras querem colher votos dos desavisados.

É claro que o imposto devido, se justo e retornável em forma de benefícios sociais, devem ser pagos. Por isso, Jesus admite que se deve dar “a César o que é de César”. Isso porque o cristão não está aqui para desestabilizar o sistema. Mas, por outro lado, o cristão é aquele que dá “a Deus o que é de Deus.” (Mt 22,21).

Em que consiste isso?

Trata-se de manter uma atitude, ao mesmo tempo orante e atuante na sociedade. Deus não perde nem lhe é acrescentado nada, quando as pessoas APENAS se prostram em recitações mecânicas, em orações estardalhosas ou nos retiros desconectadas da caridade. Ao Senhor importa a atitude e a postura diante e ao longo da vida, como Paulo elogiou entre os Tessalonicenses: oração e caridade (1Ts 1, 3).

Isaías diz que Ciro, o persa, deu a liberdade ao cativos. Paulo assegura que os tessalonicenses deram, “a atuação da vossa fé, o esforço da vossa caridade e a firmeza da vossa esperança” (1Ts, 1,3). A postura de Ciro e a dos tessalonicenses foi semelhante: fizeram algo pelo outro. A a libertação, a fé, a caridade e a esperança tinham o objetivo de ajudar.

O que se deve ofertar a Deus, muito mais que orações vazias de ação, são as ações em forma de oração. Isso é o que faz, o que ensina e o que move o cristão: a fé que se manifesta em oração; a oração que se traduz em caridade e a caridade regando sementes de esperança...




Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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sexta-feira, outubro 13, 2023

O traje de festa e os poucos escolhidos

(Isaías 25, 6-10a; Filipenses 4,12-14.19-20; Mateus 22,1-14)



Quem deve ser convidado para uma festa de casamento? Para isso, o traje é importante?

Essa parece ser a pergunta que Mateus (22,1-14) nos coloca ao nos apresentar o Reino de Deus numa situação festiva. Nesta narrativa o rei prepara a festa para o casamento de seu filho (Mt 22,2). Emite os convites (Mt 22,3). Mas os destinatários recusam ou desdenham do convite e dedicando-se a outros afazeres (Mt 22,4-6).

Entretanto o casamento e a festa não poderiam deixar de acontecer apenas porque os primeiros convidados não compareceram; ou não foram “dignos” de estar presente (Mt 22,8). Então o rei, abre as portas e convida outras pessoas (Mt 22,9-10) e a festa acontece.

Note-se que não é uma festa qualquer: é o casamento do filho do rei. E nisso estão presentes dois momentos importantes

O primeiro é a alegria de conviver e comemorar. O fato de estar juntos na alegria pode ser visto como um sinal do paraíso, a felicidade plena. A comemoração tem relação com a saciedade e a convivência com a vida em comum: neste mundo preparando o definitivo.

O segundo é o fato do casamento. Não se trata apenas da alegria da vida em comum ou de estar juntos. Diz respeito à corresponsabilidade do ser humano no projeto da criação. Não é só um homem e uma mulher entregando-se por amor, mas é Deus compartilhando com o casal a responsabilidade pela continuação da vida. O casamento, portanto é uma extensão da obra criadora de Deus, sendo prosseguida na complementariedade do casal que se entrega. A festa é um sinal do amor de Deus manifestando-se no amor das pessoas.

Por causa dessa vida em comum, prenúncio do paraíso e da complementariedade da obra da criação presente no casamento, o rei da parábola fez questão de que sua sala de festas estivesse cheia de convidados. Por isso, a insistência que seus servidores saíssem às ruas convidando a todos para se fazerem presentes: queria alegria e compromisso com o outro.

Esse convite é feito pelo próprio Deus, como o monstra Isaías (25, 6-10a). É o convite para o paraíso; um encontro definitivo, com o Senhor. Quando ele “eliminará para sempre a morte e enxugará as lágrimas de todas as faces” (Is 25,8). Trata-se de um convite “para todos os povos” participarem de “um banquete de ricas iguarias”. Nessa festa não haverá sofrimento. Apenas “um banquete de ricas iguarias, regado com vinho puro” (Is 25,6).

O critério, a porta de entrada ou a roupa adequada para a participação nessa festa de Deus é a solidariedade. O ingresso para a festa definitiva é a atenção à necessidade do outro. Isto é Paulo quem diz (Fl 4,12-14.19-20). Ele, ao suportar as dificuldades, ensina como sobreviver nas dificuldades, pois a força está não nas coisas que se pode ter, mas naquele que dá a força: “tudo posso naquele que me dá forças” (Fl 4,13). A importância da solidariedade, ensina o apóstolo, consiste no fado de, ao partilhar com quem precisa, ter em Deus a recompensa: “Fizestes bem em compartilhar as minhas dificuldades” (Fl 4, 14). Àquele que se solidariza “Deus proverá esplendidamente com sua riqueza a todas as vossas necessidades, em Cristo Jesus.” (Fl 4,19).

E assim voltamos à festa oferecida pelo Rei, para a qual os primeiros convidados deram as mais divergentes respostas, recusando o convite; mesmo assim o rei encheu sua sala de festas. Com quem? Com os marginalizados que aceitaram o convite.

E aqui surge um episódio intrigante. Depois de tanto insistir para que a sala estivesse repleta de convidados, parece estranha a atitude do rei mandando retirar da festa aquele que ali se encontrava “sem o traje de festa” (Mt 22,11-12).

Para entender isso, um pouco de atenção. Todos são convidados. Todos podem entrar na sala de festa. Porém, durante a festa, o rei dirige-se àquele sem o devido traje. E depois de interpelar o convidado o rei o manda retirar da sala (Mt 22,13). Por qual motivo?

Aparentemente é a ausência do traje adequado. Mas se os convidados estavam pelas “encruzilhadas dos caminhos” (Mt 22,9), seguramente também não trajavam roupas de festa. Então o que ocorre?

Ocorre que o rei questiona o convidado: “Amigo, como entraste aqui sem o traje de festa?” (Mt 22,12). A ausência do traje foi o motivo do questionamento, mas o interpelado nada responde. Se não ocorreu a resposta não houve interação. E se não acontece interação, entre os convidados, a festa perde o sentido.

A festa é para todos, diz Isaías (25,6). “Ide até às encruzilhadas dos caminhos e convidai para a festa todos”, diz Mateus (22,9). Mas antes da festa, no cotidiano, deve ocorrer a partilha solidária, diz Paulo (Fl 4,14). Esse é o traje adequado para a festa que Deus oferece. Faltando isso, falta interação. E se falta interação, não ocorre a alegria da festa, nem a participação e compromisso com o projeto da criação. A ausência desse comprometimento produz a escuridão e o choro pelo vazio da existência.




Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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domingo, outubro 08, 2023

Nossa Senhora Aparecida

Além do dia das crianças, no dia 12 de outubro os católicos também comemoram o dia de Nossa Senhora Aparecida.

Quando se fala isso, não são poucas as pessoas que argumentam: “Não entendo: Tem Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora de Lourdes, Nossa Senhora do Carmo, Nossa Senhora de Guadalupe… e Nossa Senhora Aparecida, além de outras. Afinal de contas, quantas Nossas Senhoras existem?”

A resposta é esta: só existe uma. É sempre a mesma Maria de Nazaré, mãe de Jesus. Essa é a Nossa Senhora. É Nossa Senhora por ser mãe de Nosso Senhor, como canta o Padre Zezinho:

“O povo te chama de Nossa Senhora por causa de Nosso Senhor.
O povo te chama de Mãe e Rainha porquê Jesus Cristo é o Rei do céu.
E por não te ver como desejaria, te vê com os olhos da fé, por isso ele coroa a tua imagem Maria: Por seres a mãe de Jesus, Por seres a mãe de Jesus de Nazaré.
Como é bonita uma religião que se lembra da mãe de Jesus.
Mais bonito é saber quem tu és: não és deusa, não és mais que Deus, mas depois de Jesus, o Senhor, neste mundo ninguém foi maior”

Como podemos ver, a canção nos explica o porquê da devoção a Nossa Senhora: por ser a mãe do Nosso Senhor; é rainha porque Jesus é o Rei dos céus; não é deusa, nem maior do que Deus. A devoção mariana existe porque neste mundo ninguém a superou: só ela teve a graça de carregar Deus em seu ventre, motivo que nos leva a repetir com Isabel: “bendito é o fruto do teu ventre”. Nós a veneramos por nos ter dado Jesus como “presente de Natal”!

Mas, antes de entendermos as “tantas nossas senhoras”, vamos entender porque fazemos preces a Maria, mãe de Jesus. É a mesma canção do pe. Zezinho que explica:

“Aquele que lê a palavra Divina por causa de Nosso Senhor
Já sabe que o livro de Deus nos ensina que só Jesus Cristo é o intercessor
Porém se podemos orar pelos outros, a Mãe de Jesus pode mais
Por isto te pedimos em prece oh! Maria, que leves o povo a Jesus
Porque de levar a Jesus entendes mais”

Só Jesus leva ao Pai, mas a mãe leva ao Filho e seu filho é Jesus. Ela o levou, ou seja, carregou Jesus em seu ventre, por isso pode nos levar, ou seja, conduzir a Jesus. E só Ele nos leva ao Pai. Aliás esse é sentido do texto do Evangelho (Jo 2, 1-11) que a Igreja nos convida a refletir no dia de Nossa Senhora: Maria viu que havia um problema: o vinho estava acabando. Não teve dúvidas, foi até Jesus como a mãe que vai ao filho: “Eles não têm mais vinho” (Jo 2,3).

Podemos até pensar que Jesus foi grosseiro com sua mãe. Mas Ele somente argumentou, nestes termos: “O que você está me pedindo, mãe? Minha hora ainda não chegou. Mas pode deixar que dou um jeito” (Jo 2,4). E ela, conhecendo o filho que educara, com a certeza de que o filho atende à mãe, dirigiu-se aos garçons: “Confiem no meu filho. Ele vai tirar vocês do apuro. Vai salvar a festa e o casamento. Façam o que ele disser” (Jo 2,5). E repete, diariamente, para nós: “faça o que ele ensinou!” e, seguramente acrescenta: “Não faça por mim, faça por Ele. Ele é o Senhor!”

A postura de Maria, na festa de Caná, foi semelhante à atitude da rainha Ester (5,1b-2; 7,2b-3): ambas são intercessoras em favor do povo. Maria intercede em favor da felicidade do casal, pois a família é importante. Tão importante que começa numa festa. E Maria intercede para que a festa continue e a família possa iniciar sem contratempos. Da mesma forma Ester, intercede pela vida de seu povo: "Se ganhei as tuas boas graças, ó rei, e se for de teu agrado, concede-me a vida - eis o meu pedido! - e a vida do meu povo - eis o meu desejo!” (Es 7,3).

E assim chegamos aos títulos de Nossa Senhora. A mesma e única Maria de Nazaré, cultuada, venerada, admirada, amada de várias formas. Por ensinar a rezar: Nossa Senhora do Rosário; Por ser luz no caminho das pessoas: Nossa Senhora das Candeias. Por ter se manifestado nas localidades de Fátima, Lourdes: Nossa Senhora de Fátima e Nossa Senhora de Lourdes. Por ser protetora e defensora dos índios: Nossa Senhora de Guadalupe, manifestando-se em Guadalupe, no México. E Nossa Senhora Aparecida, a imagem encontrada no rio pelos pescadores apareceu preta, a cor da pele dos escravizados. Por isso o povo a reconheceu como protetora da nação brasileira. Não que não olhe por todos, mas ela escolheu se manifestar entre os pobres, pescadores, escravizados… vítimas dos exploradores que vivem nos palácios e nas casas grandes. Essa é a Nossa Senhora Aparecida: apareceu em favor dos que dela precisavam. E continua a ser amada pelos brasileiros porque nosso povo ainda precisa da intercessão da “advogada nossa”.

Nos dias que estamos vivendo, com tanto sofrimento no meio do povo, podemos nos apegar com Maria, a Nossa Senhora e, talvez, devamos confiar mais nela. Talvez devamos nos dirigir a Maria, não como quem vai ao mercado, mas como o filho que confia na mãe. Talvez devamos confiar na mãe de Jesus como confiaram os garçons de Caná e os pescadores do rio Paraíba do Sul.

E vamos pensar juntos: se podemos manter uma boa relação com Maria, seguramente teremos boa amizade com seu Filho; uma relação de amizade, a partir da qual podemos até dizer que somos da família do Pai, do Filho e do Santo Espírito, pois a mão já nos adotou.

E se ainda temos alguma dúvida, vamos, novamente, cantar com os versos do pe. Zezinho:

“Quero lembrar os fatos que aconteceram naquele dia
Quando por entre as redes, aquela imagem aparecia
Vendo surgir das águas a tosca imagem de negra cor
Agradeceram todos à mãe de Cristo por tanto amor!

Quero entender o culto que começou, desde aquele dia
Muitos não compreendem, dizendo ser uma idolatria
Mas neste simbolismo daquela imagem, de negra cor
Chega-se com Maria ao santuário do salvador!

Torno a lembrar os fatos que agora tocam a tanta gente
Esta senhora humilde, de cor morena, se fez presente
Numa nação, aonde imperava a mancha da escravidão
Nossa Senhora escura nos diz que o Cristo nos quer irmãos”

O centro de nossa fé é o Deus Trindade. Sem não existe cristianismo. Mas uma das pessoas da Trindade Santa veio nos visitar. E fez questão de nascer, feito homem, de uma mulher: e Maria era seu nome. Então, em honra ao Filho podemos agradecer à mãe e, como ela fez, que tal olhar para Deus de mãos dadas com o povo que gosta da mãe de Deus?




Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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quarta-feira, outubro 04, 2023

O Reino de Deus vos será tirado

(Isaías 5,1-7; Filipenses 4,6-9; Mateus 21,33-43)





Que espera o agricultor, quando lança a semente ao chão? Que espera o operário, ao fim de um período de trabalho? Que esperam os pais, depois dos filhos crescidos? Que espera o professor, ao longo da jornada de ensino? Que espera alguém que faz planos e projetos para sua vida e seu viver…? O que esperar…?

As condições para um bom relacionamento entre as pessoas; para a felicidade da família; para o pleno desenvolvimento das pessoas; para um mundo justo; para a plenitude humana; para a harmonia entre os diferentes… Para haver sucesso nessas e noutras situações, as condições nos são dadas. São dons divinos em nós e para nós. E o quê fazemos com tudo que nos é entregue, gratuitamente, pelo Senhor da vida?

Essas situações e indagações nos são apresentadas quando Isaías (5,1-7) fala sobre o vinhedo que só “produziu uvas selvagens”, mesmo depois da terra ter sido preparada para “que produzisse uvas boas” (Is 5,2).

As condições para a implantação do bem, são dadas como graça divina em plenitude. Tanto que o Senhor se pergunta: “que mais poderia eu ter feito?” (Is 5,4). Uma pergunta que, na verdade, é uma afirmação: “já fiz tudo”. Ou seja, a plenitude da graça é dada, mas as pessoas preferem recusar o dom recebido. Em Isaías, o vinhedo é o povo de Israel que está, cada vez mais, afastado dos caminhos do Senhor. Por isso o anúncio da devastação (Is 5,5-6).

Os dirigentes do povo causaram a ruína do povo. “Eu esperava deles frutos de justiça - e eis injustiça; esperava obras de bondade - e eis iniquidade.” (Is 5,7). Mas o povo também erra, pois segue dirigentes inescrupulosos. Por esse motivo todos sofreram as consequências. Lá se concretizou como a ruína da nação, invadida por uma potência estrangeira. E a consequência definitiva foi o “cativeiro na Babilônia”. Em nossa atualidade a consequência depende de como respondemos a estas indagações: como estão agido nossos dirigentes? Nós, os seguimos no mar de corrupção ou lutamos por um país melhor? E se lutamos por algo melhor por que eles continuam lá? É necessário darmos uma resposta, sob pena de sermos igualados às videiras que só produziram uvas imprestáveis.

Na narrativa de Mateus (21,33-43), da mesma forma que Isaías, Jesus fala aos “sumos sacerdotes e os anciãos do povo”: os dirigentes do povo (Mt 21,41). Mas Jesus vai além do profeta. Ele mostra que o problema não está no parreiral, que é o povo; nem do proprietário do plantação, que é o Senhor. O problema está nos vinhateiros, que são os dirigentes. Esses mataram os enviados (os profetas) do dono da vinha (Mt 21,35-36) e também mataram o filho do proprietário. Tudo com o propósito de roubar a herança (Mt 21,38). Todas as ações dos dirigentes do povo foram desonestas. E sua desonestidade causou dificuldades para o povo que acabou sendo iludido pelos seus dirigentes.

Que fazer com esses administradores desonestos?

Na proposta de Isaías, perderam a nacionalidade e foram exilados. Porém, depois de quatro décadas de exílio o Deus clemente e pleno de graça e perdão, concede o retorno, com objetivo de reestruturar a fé, desenvolvendo a esperança na vinda do Messias.

Ocorreu que os novos dirigentes, que deveriam reconhecer o Messias não o fizeram e, perderam, não só o território, mas a primazia de ser luz do mundo. Em resposta à perversidade dos dirigentes, Mateus anuncia a sentença: “O Reino de Deus vos será tirado e será entregue a um povo que produzirá frutos.” (Mt 21,43). E assim nasce uma nova fé: a crença daqueles que seguem Jesus, os cristãos encarregados de construir um mundo de justiça.

Querendo evitar que este novo povo se desvirtue, Paulo (Fl 4,6-9) faz recomendação e dá as diretrizes. O objetivo é que essa comunidade possa crescer, não só na caridade mas, principalmente, na justiça, pois é assim que se manifesta e se demonstra a fé. E o apóstolo, constatando que na comunidade de Filipos existem alguns problemas, faz a recomendação: “Quanto ao mais, irmãos, ocupai-vos com tudo o que é verdadeiro, respeitável, justo, puro, amável, honroso, tudo o que é virtude ou de qualquer modo mereça louvor.” (Fl 4,8).

Paulo sabia que até isso poderia não ser entendido ou seguido, por isso diz algo como: “Em vez de fazer as besteiras costumeiras, façam aquilo que ensinei.” Nas palavras do apóstolo: “Praticai o que aprendestes e recebestes de mim, ou que de mim vistes e ouvistes. Assim o Deus da paz estará convosco.” (Fl 4,9).

Noutras palavras, e agora acolhendo para a nossa vida, nossa comunidade, nossa sociedade: a proposta do dono da vinha é que se faça uma boa produção que consiste na pratica do amor, da justiça, da caridade… e se nós também, não oferecermos a Deus esses frutos, a consequência já está estabelecida: “o Reino de Deus vos será tirado”. Então, o que esperar dos cristãos?





Neri de Paula Carneiro


Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador


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terça-feira, outubro 03, 2023

A raposa tinha razão ou sobre o contexto da palavra.

E a raposa tinha razão. Quando as palavras não são lidas nem ouvidas em seu devido contexto elas geram mal entendido. DESCONTEXTUALIZADA, tanto a Palavra de Deus como a palavra humana, passa a servir não a Deus, mas ao inimigo.

Ocorre que numa das páginas de o “Pequeno Príncipe” a raposa disse ao princepezinho: “As palavras são uma fonte de mal entendidos”. Parece que a raposa estava querendo explicar o perigo da descontextualização das palavras. Aí elas conduzem ao erro. E se isso ocorrer a pessoa está servindo ao inimigo.

Descontextualizando a Palavra de Deus, criamos todas as falsas doutrinas; supervalorizamos nossas crenças pessoais; endeusamos nossos pregadores e desacreditamos aqueles que nos falam verdades. Dizem a verdade aqueles que são abertos ao diálogo e não aqueles que dizem o que desejamos ouvir.  Se nos trancarmos ao diálogo incorremos em erro de sintonia. Agindo assim geramos contenda e divisão e passamos a servir ao inimigo.

Descontextualizando o que dizem as pessoas criamos fofocas, criamos atritos, criamos divisões, criamos aquele clima insustentável de estigmatização das pessoas, de marginalização de pessoas, de segregação de pessoas. Com isso se alimentam os preconceitos, a intolerância… A palavra humana, e mais ainda a Palavra divina, tem força e deve ser usada para selar uniões, criar pontes e quando não fazemos isso prestamos serviço ao inimigo.

Descontextualizando o que Deus fala e o que as pessoas falam demonstramos nossa mesquinhez e evidenciamos que somos lentos em compreender; mostramos que somos capazes de louvar "com os lábios mas não com o coração" (Mt 15,8). Não foi a toa que Jesus se revoltava com os fariseus e doutores da lei. Eles até costumavam atar tiras de pergaminho com os preceitos da Torá em seus turbantes. Faziam isso para “ter a lei diante dos olhos”, descontextualizando a orientação de Dt 6,8, sem observar o significado do preceito. Não serviam a Deus, mas ao inimigo.

Os discípulos de Jesus, quando não entendiam o que o Mestre falava, perguntavam-lhe, ou lhe pediam: “Explica-nos...” (Mt 13,36). Quando alguém diz algo que não concordamos ou não entendemos, se somos de Deus, pedimos explicações e não geramos divisões. Porém 
quando lemos ou ouvimos algo fora do contexto, e não nos preocupamos com a contextualização somos levados ao erro. E o erro é coisa do inimigo.

Só o amor e o entendimento e a caridade e a sinceridade e o respeito e o diálogo… vem de Deus! Tudo o resto vem do inimigo.



Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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quarta-feira, setembro 27, 2023

Para a glória de Deus Pai

(Ez 18,25-28; Fl 2,1-11; Mt 21,31)




Qual é a conduta correta? Por que Cristo foi exaltado? Quem faz a vontade do Pai? Estas perguntas nos ajudam a entender não só quem é Jesus Cristo como também a Igreja derivada da ação dos apóstolos. Sendo assim, como respondê-las?

Ezequiel (18,25-28) ajuda a responder. A conduta correta é arrepender-se da maldade e praticar a justiça. Dessa forma, é possível conservar a vida. O profeta explica: quando alguém se “desvia da justiça, pratica o mal e morre, é por causa do mal praticado” (Ez 18,26) que ele morre. Em que consiste esse “praticar o mal”? Em gerar situações de morte...

Cabe ressaltar que a morte à qual o profeta está se referindo, diz respeito ao distanciamento completo de Deus na vida terrena. Notando que essa morte eterna é consequência do estilo de vida aqui na terra. Talvez por isso é que se diz que o mal que atrai o mal; e o bem atrai o bem! Portanto, se você ainda não entendeu de que mal o profeta está falando, Jesus dá a resposta, nos termos do profeta: não cumprir a vontade do Pai.

O que nos leva à indagação sobre o porquê de Cristo ter sido exaltado. A resposta vem de Paulo (Fl 2,1-11). Cristo foi exaltado porque não se apegou ao seu ser igual a Deus (Fl 2,6). Ele abriu mão de tudo para se igualar a nós (Fl 2,7). Mais ainda, não só se igualou a nós, como se entregou à morte por nós. “E morte de cruz” (Fl 2, 8), explica o apóstolo. A morte de Cristo, portanto, é uma morte redentora, que pode conduzir à vida, ou seja à convivência definitiva com Deus. Mas só é morte redentora para quem não fez de sua vida uma corrente para o mal, maltratando a vida dos outros.

Sua morte “pode conduzir à vida” porque essa convivência definitiva com o Senhor, não depende de Deus, mas de cada indivíduo. A decisão é pessoal. Deus oferece. Nós aceitamos ou recusamos, como fizeram os irmãos, mencionados por Mateus (21,28-32).

Então, por fim, quem faz a vontade do Pai?

Há que se entender a postura dos dois irmãos, mencionados por Mateus. Eles agiram diferentemente das respostas que deram ao seu pai. Falam o oposto daquilo que realmente executam. A partir disso Jesus pergunta aos representantes do povo: “quem fez a vontade do pai?” (Mt 21,31) E os representantes do povo, mesmo não fazendo o que é sua obrigação fazer, sabem responder corretamente. Fez a vontade do pai aquele que diz não, mas executa o trabalho. Lá eles sabiam a resposta correta, mas não estavam tendo a postura correta. Sabiam como conduzir o povo para Deus, mas agiam como se isso não tivesse importância.

E Jesus os repreende, não por causa de sua resposta, mas por causa de sua postura. Não adianta saber o que se tem que fazer, mas não realizar essa obra. A mesma repreensão é dirigida às atuais lideranças políticas e religiosas. O mesmo que Jesus lhes disse, cabe hoje: “os pecadores e as prostitutas vos precedem no Reino de Deus”, e vocês sabem o porquê!

Neste ponto, não é demais reiterar a afirmação de que é necessário tomar cuidado para não realizar algo que deve ser feito por “competição ou vanglória”. As obras do bem não são realizadas para mostrar a capacidade de fazer o bem, como orienta Paulo: “Nada façais por competição ou vanglória mas, com humildade, cada um julgue que o outro é mais importante” (Fl 2,3). Além disso, a boa ação para o outro deve ser “para o outro” e não uma ação/ajuda pensando na retribuição que se pode receber. Se o bem é feito pensando na retribuição, não é um bem, mas uma troca de favores; e quem o fez não fez para o outro, mas para si mesmo...

Isso implica dizer que não é o fato de poder ostentar o bem realizado que conta; também não importa saber do bem a realizar sem, no entanto, fazê-lo. Nessas circunstâncias não há mérito naquilo que se realiza. Para o Senhor importa não o que se sabe ou o que se mostrou…, mas o que vai no coração. Isso é o que ensina Ezequiel ao dizer que “Quando um justo se desvia da justiça, pratica o mal e morre, é por causa do mal praticado que ele morre. Quando um ímpio se arrepende da maldade que praticou e observa o direito e a justiça, conserva a própria vida.” (Ez 18, 26-27). No caso dos irmãos: não fez a vontade do pai aquele que concordou com ele, mas o filho que depois de discordar executou o que o pai pedira.

Mas, então, qual é a conduta correta? Por que Cristo foi exaltado? Quem faz a vontade do Pai? E a resposta encontramos na pessoa de Jesus Cristo, sua conduta é a correta porque cumpriu com a vontade do Pai e por esse motivo foi exaltado, ensina Paulo na carta aos filipenses. E isso também mostra como é a Igreja de Jesus Cristo. Ela é convidada a ter “os mesmos sentimentos que havia em Jesus”. Uma Igreja onde não haja senhores e nem escravos; não existam poderosos nem oprimidos; onde aquele que tem mais reparte com os que precisam não para evidenciar suas posses e humilhar o necessitado; onde o “irmão” não é só mais uma palavra, ou uma forma de tratamento, mas uma comunidade na qual todos o sejam de fato, a fim de que “para glória de Deus, o Pai, toda língua confesse: Jesus Cristo é o Senhor!”

Podemos não entender o que Deus nos reserva, mas isso não nos impede de realizar sua vontade. E, além disso, todo aquele que se ocupa em fazer algo pensando no outro, esse tem a aprovação divina, pois está realizando a vontade do Pai.




Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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quinta-feira, setembro 21, 2023

O que for justo

(Isaías 55,6-9; Filipenses 1,20c-24.27a; Mateus 20,1-16a)






Em que consiste o pagamento justo? Quem paga o que é justo? Qual é a justiça no pagamento do salário? Estas indagações nos chegam a parir da proposta de Jesus (Mt 20,1-16a) falando de um patrão que, ao longo do dia, contratou trabalhadores em diferentes horários e, ao final do expediente, a todos deu o mesmo pagamento.

Esse gesto do patrão, pagando a todos igualmente, independentemente do tempo trabalhado, gerou descontentamento entre os operários, pois os últimos só trabalharam uma hora e receberam tanto quanto os que haviam trabalhado a jornada inteira. “Ao receberem o pagamento, começaram a resmungar contra o patrão: ‘Estes últimos trabalharam uma hora só, e tu os igualaste a nós, que suportamos o cansaço e o calor o dia inteiro’” (Mt 20,11-12).

Essa parábola intriga muitos de nós. Com certeza, damos razão aos trabalhadores resmungões, com o argumento: se quem trabalhou uma hora recebeu uma diária, aquele que trabalhou o dia inteiro deveria receber muito mais. Entretanto, só pra relembrar, este é o pensamento capitalista. Economicista. Interesseiro. Egoísta… não é a postura justa e cristã!

Neste ponto é que se encaixam nossas indagações iniciais: em que consiste o pagamento justo? Quem paga o que é justo? Em que consiste a justiça no pagamento do salário?

Para entender isso e entender os motivos de Jesus, temos que atentemos às palavras de Isaías (55,6-9): “Meus pensamentos não são como os vossos pensamentos, e vossos caminhos não são como os meus caminhos, diz o Senhor. Estão meus caminhos tão acima dos vossos caminhos e meus pensamentos acima dos vossos pensamentos quanto está o céu acima da terra” (55,8-9). Ou seja, o ser humano tem dificuldade para entender o projeto de Deus.

Jesus está se referindo à justiça do Reino. Para Deus não há alguém que mereça uma graça maior do que outro. Todos recebem, plenamente, a graça de Deus. E se a graça é plena, não tem um que a receba mais que o outro. E quem recebe a graça não a recebe por mérito próprio, mas porque Deus a deu. Por isso é graça, é dom de Deus. Isso nos leva a Paulo (Fl 1,20c-24.27a), afirmando: “Só uma coisa importa: vivei à altura do Evangelho de Cristo.” (Fl 1,27). Essa é a base em que se realiza a justiça divina: viver em sintonia com o Evangelho.

Então reflitamos nossas indagações.

Quem paga está retribuindo algo que recebeu. Houve uma troca. E, para ocorrer a troca, as partes envolvidas estabelecem, antecipadamente, os valores. Trata-se de uma negociação, mais ou menos nestes termos: “Eu te dou isto em troca daquilo. Você aceita a troca?” Se as partes fizerem o acordo e ambos aceitarem e concordarem que “isto” pode pode ser trocado por “aquilo” então a transação acontece de foma justa e legal: os dois lados concordaram!

Porém pode ocorrer que haja um “acordo” forçado por alguma circunstância, de modo que “isto”, de fato, tenha um valor menor do que “aquilo”. E o possuidor “daquilo” seja como que obrigado a aceitar “isto” como pagamento. Nesse caso não será um pagamento justo, pois uma das partes está sendo forçada a aceitar o que de fato não aceitaria noutras circunstâncias.

O pagamento dos salários, por exemplo. Não é um pagamento justo, embora estejam protegidos pela lei. O salário, portanto, está dentro da legalidade, mas não se enquadra na justiça. E por que não é justo? Porque o assalariado não tem poder de negociação. Ele tem que aceitar o que lhe foi imposto. Pode até não aceitar esse salário e não trabalhar, mas, nesse caso, ficará em uma situação de maior penúria ainda. Então, forçado pela necessidade aceita. Por outro lado, todos sabemos que aquele que lhe paga o salário se beneficia muito mais com os resultados do trabalho do trabalhador do que o trabalhador com o salário recebido. E por isso o pagador de salário cria mecanismos para justificar (as leis) e convencer o recebedor de salário de que foi uma relação/troca justa. Para sabermos se houve justiça basta invertermos os papéis para que o pagador sobreviva com aquilo que paga. Se não aceita receber somente o valor que paga como salário, é porque sabe que o que está pagando não é justo, embora seja legal. Pode até criar mil e uma justificativas para mostrar suas responsabilidades… etc… mas se não aceita viver com o que paga a quem produz é porque sabe que não está praticando justiça. Seria feita justiça se todos os envolvidos no processo usufruíssem dos mesmos benefícios, sem que um fosse mais beneficiado que os outros.

Qual foi a proposta de Jesus? Com aqueles que contratou de madrugada, combinou “uma moeda de prata” (Mt 20,2). Com aqueles das nove horas combinou pagar “o que for justo” (Mt 20,4). Ao meio dia e às três horas “fez a mesma coisa” (Mt 20,5), isto é, prometeu “o que for justo”. E na última hora, àqueles a quem “ninguém contratou” (Mt 20,7) nada prometeu. Mesmo sem promessa de pagamento, foram ao trabalho. E, no acerto das contas, foram os primeiros a receber “uma moeda de prata” (Mt 20,9).

Por que pagou a todos igualmente? Por que disse: “Eu quero dar a este que foi contratado por último o mesmo que dei a ti (Mt 20,14)? Certamente não foi pelo volume da produção. O que estava em jogo não era a produção, mas a sobrevivência. Tanto os primeiros como os últimos, tinham que sobreviver, por isso receberam o mesmo pagamento.

Esse é o gesto da graça divina. Não é dada pelo mérito do trabalho realizado, mas pela vontade de quem pediu para o trabalho ser feito. É o dom da graça que permite a afirmação: “Pagarei o que for justo” (Mt 20,4)

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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quarta-feira, setembro 13, 2023

Quantas vezes perdoar


(Eclesiástico 27,33–28,9; Romanos 14,7-9; Mateus 18,21-35)




Pedro, sem dúvidas, é um dos personagens mais importantes na literatura dos evangelhos. E não estamos falando isso porque Jesus o colocou como chefe da Igreja ou por outra virtude apostólica. Sua importância é, realmente, como personagem literário. É dele que saem algumas das perguntas mais instigantes e propulsoras para os ensinamentos do Senhor.

Por vezes a pergunta de Pedro pode parecer meio infantil ou de quem não entendeu a proposta do Mestre. Entretanto, do ponto de vista literário, representam a continuidade de um discurso, a proposta de um aprofundamento ou mesmo a proposição de uma nova temática. Muitas vezes nos deparamos com uma pergunta a partir da qual Jesus reformula uma norma que era para ser maravilhosa, mas que ficou engessada no legalismo judaico.

No evangelho segundo Mateus (18,21-35) é que nos vem esta preciosidade: a pergunta que já vimos, lemos, repetimos e, talvez ainda não tenhamos entendido: “Senhor, quantas vezes devo perdoar, se meu irmão pecar contra mim? Até sete vezes?” (Mt 18,21).

Evidentemente, do ponto de vista literário, a pergunta tem a finalidade de promover um novo discurso; um novo ensinamento. Poderíamos até dizer que a pergunta de Pedro, aponta para uma teologia da reciprocidade.

E Jesus responde. Muito mais do que um discurso sobre o perdão, Jesus subverte os valores, apresentando a norma da reciprocidade positiva. Não mais o antiquado “olho por olho, dente por dente”, mas a proposição de uma nova postura. Jesus ensina que o perdão não é para ser dado sete vezes, mas setenta vezes sete, que também não é somente quatrocentas e noventa vezes. A intenção do mestre é dizer: “Perdoa sempre!” Quantas vezes? Sempre!

Dá pra imaginar que Jesus disse mais. Talvez tenha dito também: “perdoa sempre, porque é melhor, é mais saudável!; é mais divino, ter um coração amoroso do que rancoroso!” “Perdoa sempre porque você ficará no lucro, ficará mais leve sem o peso do rancor!”

“Deus perdoa sempre!”, possivelmente disse Jesus, ao complementar seu discurso. “Você deve perdoar sempre, porque é assim que faz o Pai. Por ser plenamente amoroso, o Pai perdoa sempre.” Jesus, com certeza, exemplificou seu discurso, retomando o livro do Eclesiástico (27,33–28,9). É bastante provável que tenha se reportado à afirmação: “O rancor e a raiva são coisas detestáveis, até o pecador procura dominá-las” (Eclo 27,33). E hoje poderíamos acrescentar: uma pessoa sensata não realimenta o rancor e a raiva.

Esses sentimentos existam em nós. Nos os experimentamos diante das adversidades e contrariedades. Porém dá para dizer mais: esses sentimentos permanecem em nós somente se os alimentarmos; eles desaparecem, quando alimentamos o bem querer. É esse o conselho do Eclesiástico (28,9) “Pensa na aliança do Altíssimo, e não leves em conta a falta alheia!”.

Isso implica dizer que as causas dos nossos descontentamentos, que produzem a ira, o ódio, o rancor, a raiva, a sede de vingança… existem e nós as experimentamos. Mas está em nosso poder alimentá-los ou dominá-los, como sugere o Eclesiástico.

Com Paulo (Rm 14,7-9) podemos dizer que nossa vida é para o Senhor e, portanto, devemos alimentar não os sentimentos de ira, de rancor, de raiva, de vingança…, mas o contrário: o sentimento de “ser para o outro” uma vez que “ninguém dentre nós vive para si mesmo” (Rm 14,7). E se não vivemos para nós, como ensina o apóstolo, vivemos para outro: primeiro para o Senhor, mas nossa vida para Deus só se realiza no viver para os outros.

E aqui cabe a indagação fundamental: não estamos livres de errar. Sendo assim, como queremos ser tratados quando cometemos um deslize ou magoamos alguém? Ou quando pecamos ou fizemos algo que não deveria ser feito? Será que gostaríamos de ser odiados, tratados com ira, com rancor e raiva? Será que gostaríamos de ser agredidos e xingados? Então vale o sentimento recíproco, caso alguém nos ofenda ou faça algo indevido, cometa um pecado, um deslize…

E não se trata de fazer aos outros o que queremos que nos façam porque queremos receber a recompensa. Se assim fosse estaríamos apenas fazendo um negócio. Se faço o bem, querendo receber um bem em troca, não estou fazendo o bem para quem o recebeu, mas em meu próprio benefício. E, nesse caso, o bem feito ao outro não teve valor de bem, mas um valor comercial. O bem feito só tem valor, só é um bem, quando feito para o outro. A reciprocidade positiva implica nisso: fazer o bem (perdoar; apagar o rancor; eliminar a raiva, o ódio e a sede de vingança…) significa fazer o que tem que ser feito.

É a lição de Jesus na parábola do devedor maldoso. Ele foi perdoado em suas dívidas, seus inúmeros pecados. E foi perdoado não porque pediu, mas por benevolência, pela “compaixão”: “o patrão teve compaixão, soltou o empregado e perdoou-lhe a dívida. (Mt 18,27). Mas o devedor não agiu com a mesma compaixão, por isso perdeu o privilégio do perdão. O ato do perdão, portanto, não envolve o que pode vir depois como recompensa, mas como retransmissão do bem recebido. E isso tem que ser feito com o coração (Mt 18,35).

Então, quantas vezes perdoar? Jesus ensina que não se trata de quantidade, mas de intensidade. A intensidade da misericórdia divina deve ser nosso parâmetro para a nosso perdão e compaixão




Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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quinta-feira, setembro 07, 2023

Reunidos em meu nome

(Ezequiel 33,7-9; Romanos 13,8-10; Mt 18,15-20)




Mateus (Mt 18,15-20) nos apresenta uma frase de Jesus frequentemente repetida por muitos de nós: “onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome eu estou ali, no meio deles” (Mt 18,20).

A frase, por si só já nos diz muito, pois coloca em destaque o valor da oração do grupo e do grupo de oração. Entretanto, precisamos situá-la, não só na liturgia, mas principalmente no contexto em que Jesus a profere. Jesus e seus discípulos não estão em clima ou numa situação de oração, como normalmente a frase é invocada. Jesus está orientando os discípulos a respeito de como agir em caso de ofensa; e, ao mesmo tempo, orientando como tratar o agressor: não com outra agressão ou rancor, mas com sinceridade e disposição para o diálogo.

Jesus está oferecendo orientações de procedimentos em relação aos irmãos que erraram. Evidentemente essas orientações são destinadas a todos os cristãos, mas de maneira muito especial são dirigidas àqueles que desempenham alguma função de condução da comunidade, como era o caso dos discípulos a quem coube a inauguração e condução da Igreja que estava em gestação na caminhada de Jesus e seus seguidores. Enquanto anunciava o Reino, Jesus mostrava o caminho para atingi-lo.

É como se estivéssemos numa escola. A atitude de Jesus, em todo esse capítulo 18 é a postura do professor que está fazendo uma revisão da matéria, preparando os alunos para a prova. Mostra a importância dos pequenos (Mt 18 1-11); mostra como é importante resgatar os que estão pedidos (Mt 18, 12-14) e a importância do perdão (Mt 18 21-35). E a perícope que a liturgia nos propõe hoje (Mt 18,15-20) trata da postura em relação àquela pessoa que, na comunidade, age de forma desarmoniosa.

A pessoa ou o grupo que está em desarmonia com a comunidade deve ser “chamado a atenção” ou “corrigido” (Mt 18,15). Por quê? Porque essa situação de desarmonia quebra o clima de Igreja. Quebra a ligação com o céu. Por isso primeiro uma pessoa, depois duas ou três, e depois a própria comunidade deve ser convocada para reconduzir não só o que está fora dos trilhos, mas para que todos se reconduzam à harmonia. Pois uma pessoa em desarmonia implica em uma comunidade dividida. E onde existe divisão abrem-se as portas para o adversário. Onde há desarmonia, o amor a divino fica cerceado. Por isso a importância de trazer o irmão de volta e, se em última hipótese, ele se recusar, deve-se entender que não mais faz parte da comunidade.

Numa leitura mais atenta podemos notar que há uma espécie de paralelo na proposta dos versículos: a situação de desarmonia que está no versículo 15 tem seu paralelo no versículo 18 com a possibilidade de ligar ou desligar ao céu, restaurando a harmonia. O versículo 16, mencionando os dois desarmoniosos, pode ser lido em paralelo com o versículo 19 onde aparecem os dois em harmonia. E o versículo 17, com o julgamento da Igreja, deve ser lido em relação ao versículo 20 no qual aparece o resultado da harmonia que possibilita a presença de Deus. A harmonia entre as pessoa é um clima de Igreja e nesse ambiente eclesial Deus se faz presente. Havendo harmonia, entre dois ou três, manifesta-se a presença de Deus; diferente da desarmonia em que se manifesta as intenções do inimigo.

Essa mesma preocupação com a harmonia, ensinada por Jesus, já havia sido proposta por Ezequiel (33,7-9), ao dizer que o “filho do homem” (Ez 33,7) deve ser vigia e porta-voz de Deus. Afirma o profeta que o “filho do homem” recebe a função de alertar o ímpio a fim de que se converta e não morra. Deus não quer a perdição de ninguém, por isso envia seus profetas, dá voz à Igreja; Deus sempre mantém seu convite, mas respeita quando é recusado!

Os alertas do profeta, o convite à harmonia ensinado por Jesus manifestam-se na proposta dos mandamentos. Os mandamentos que deixam de ser inúmeros para serem apenas um: o amor, como ensina Paulo (Rm 13,8-10), retomando o que aprendera de Jesus. O amor, portanto, é a manifestação da harmonia; o amor é a advertência do profeta. Por amor é que Jesus ensina o valor daqueles que são capazes de convidar o interlocutor a retornar à harmonia: Consigo, com os outros e com o céu.

A proposta de Jesus vai além. Deseja que todos sejamos capazes não só de ouvir a proposta divina, mas principalmente que sejamos promotores da restauração dos elos partidos. E onde existem elos partidos esse é o clima e ambiente para a ação da boa palavra. E se alguém ouvir as boas palavras estará em condições de fazer com que os elos se reatem. E, então, restaura-se a harmonia e então poderemos dizer, sem sombra de dúvidas, que aí está Jesus, pois esse grupo é Igreja e está reunida em nome de Jesus.




Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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quinta-feira, agosto 31, 2023

Em troca da vida

(Jeremias 20,7-9; Romanos 12,1-2; Mateus 16,21-27)




“Que poderá alguém dar em troca de sua vida?” (Mt 16,26) A pergunta de Jesus pode ser um norte para nossa vida. Afinal, o que vale a nossa vida? Qual o preço de uma vida?

A indagação que Jesus está nos propondo é um convite a refletir o sentido da vida. E uma resposta para essa indagação que fundamenta a vida não sai das palavras que podemos proferir, mas do rumo que empreendemos à nossa existência. De uma forma mais poética: o sentido da vida pode ser expresso nos passos que direcionam nosso caminhar.

Essa indagação é tão fundamental para a condução da vida que Paulo, dirigindo-se aos romanos (Rm 12, 1-2), os convida a redimensionar a vida: “eu vos exorto” (Rm 12,1), diz o apóstolo.

Exorta a quê? A fazer da vida uma oferta a Deus: “a vos oferecerdes em sacrifício vivo”. Só lembrando que sacrifício não é um ato ou situação de sofrimento, mas de entrega a Deus. O sacrifício vivo é, portanto, a entrega total a Deus. Trata-se de entregar a vida a Deus!

Por que o apóstolo faz essa exortação? Porque comunidade de Roma não está se comportando em consonância com o plano de Deus, como seria de se esperar dos seguidores do Cristo, como ensinam os livros sagrados e os evangelhos. Por isso a orientação do apóstolo à comunidade que está em Roma – e a nossa também: “Não vos conformeis com o mundo” (Rm 12,2). E aqui vale o mesmo princípio. Se a orientação é para não se conformar com o mundo é porque a comunidade está conformada. Então, em quê consiste esse “conformar”.

Inicialmente pode-se entender como aceitação. Quem está triste por ter perdido algo, ao se conformar, aceita essa perda. Mas, não é essa a orientação do apóstolo. Para Paulo, conformar, deve ser entendido como entrar na forma, no jeito de ser. Assim, “não se conformar com o mundo” significa não deixar que o mundo direcione nossa vida. Conformar-se ao mundo nada mais é do que viver não mais com os valores cristãos, mas com os valores do mundo. E isso não é para acontecer, diz o apóstolo. O cristão não deve deixar-se dominar pelo mundo, mas ser sinal para o mundo; agir para transformar o mundo.

Dessa forma, também, não se conformar, ou seja, não se deixar levar pelos valores do mundo, significa, segundo Paulo, transformar-se e renovar-se. “Transformai-vos, renovando vossa maneira de pensar e de julgar” (Rm 12,2). Mas isso com que finalidade? Com a finalidade de “distinguir o que é da vontade de Deus, isto é, o que é bom” (Rm 12,2). Isso significa que o apóstolo sabe que a comunidade sediada em Roma – e hoje também a nossa comunidade – não está seguindo a vontade de Deus; não está fazendo o que é bom; não está fazendo o que lhe agrada e é perfeito… por não estarem fazendo nada disso é que o apóstolo os exorta – e também a nós – a fazer essas coisas. Se já estivessem fazendo isso, não haveria necessidade dessas orientações. Eis, portanto, um sentido para a vida: encontrar a “vontade de Deus”, realizar “o que é bom”.

A busca pelo sentido da vida e do viver, pode ser notada na vida de Jeremias (20,7-9). O que ocorre com o profeta, seguidamente se dá conosco, frente as dificuldades. A tendência, para quase todos nós, é nos abatermos; fraquejarmos diante das adversidades. É a postura de Jeremias (20,7-9). Num primeiro momento a euforia: “Tu me seduziste, Senhor, e eu me deixei seduzir! Foste mais forte” (Jr 20,7). Mas, em seguida, vem a recaída diante das dificuldades: “A palavra de Deus tornou-se para mim vergonha e gozação” (Jr 20;8) e por esse motivo, diz o profeta, “nunca mais hei de lembrá-lo, não falo mais em seu nome!” (Jr 20,9).

Mas essa postura de afastamento, de descompromisso, não dura muito, pois o fogo da Palavra mobiliza e o profeta reconsidera sua atitude. “Parecia haver um fogo a queimar-me por dentro, fechado nos meus ossos. Tentei aguentar, não fui capaz.” (Jr 20,9). Ele sabe que só no Senhor está a paz e o bem. No Senhor está o sentido da vida.

Por fim, ninguém melhor que Jesus para, não só dizer, mas mostrar o sentido da vida. Ele demonstra que, para entender o sentido da vida, é necessário entender o sentido da dor. Por isso ele deve “ir à Jerusalém e sofrer muito” (Mt 16,21). Só que Pedro ainda não entendeu isso, e se contrapõe ao plano do Mestre. “Deus não permita tal coisa” (Mt 16,22).

Pedro ainda não havia entendido que o sentido da vida é a entrega. Por estranho ou paradoxal que possa parecer, Jesus afirma – e demonstra com sua entrega – que as coisas dos homens não são coisas de Deus (Mt 16,23); que a renúncia de si é condição para o seguimento (Mt 16,24). Mostra que para ocorrer a salvação da vida é necessário entregá-la (Mt 16,25). Mostra que o mundo vale menos que a vida (Mt 16,26) e, finalmente, assegura que a entrada no Reino depende da conduta de cada um. Por isso afirma que em seu retorno glorioso “retribuirá a cada um de acordo com a sua conduta.” (Mt 16,27).

Aqui está o sentido para a pergunta: Que é necessário para ganhar a vida gloriosa? O que se pode “ alguém dar em troca de sua vida?” (Mt 16,26). É necessário dar a vida! A vida gloriosa é o sentido desta vida. E Jesus vai entregar o resultado, ele “retribuirá a cada um de acordo com a sua conduta”.

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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sexta-feira, agosto 25, 2023

Quem sou eu para você?

(Isaías 22,19-23; Romanos 11,33-36; Mateus16,13-20)




O Senhor cobra um posicionamento daqueles que o cercam, que dizem ter fé, que são seus anunciadores, que são seus emissários. Quer um posicionamento daqueles que lhe dirigem suas orações. Daqueles que se dizem cristãos, que frequentam os templos e recitam orações. A todos, o Senhor faz a pergunta decisiva: “quem sou Eu, para você?” É a grande pergunta do Mestre apresentada por Mateus (16,13-20).

Qualquer que seja o questionamento, exige de nós uma resposta. Mesmo que seja o silêncio; ou uma evasiva; ou admitir a incapacidade de responder; ou uma negação... e aqui é o Senhor quem nos interroga. “O que andam falando a meu respeito? E vocês o que dizem?” E resposta é adesão ou rejeição. E isso impõe outra pergunta: “quem é Deus, para mim?”

Lendo a profecia de Isaías (22,19-23), notamos que o Senhor está descontente com o Sobna, administrador do palácio. Mas por qual motivo? Quem era Deus, para ele?

Ele devia guiar o povo de Deus, mas não estava cumprindo com a missão. E por isso foi substituído por alguém mais dedicado às necessidades do povo. Um novo líder que “será um pai para os habitantes de Jerusalém e para a casa de Judá.” (Is 22,21). Agir em favor do bem do povo é missão de todos, mas de modo especial daquele que está revestidos de autoridade.

Todos os que estão revestidos com alguma autoridade, tem a obrigação, moral e religiosa, de converter esse poder em bem estar para o povo. Caso a autoridade não faça isso, deve ser destituída do poder. Esse foi o exemplo ensinado pelo Senhor, na profecia de Isaías.

Paulo (Rom 11,33-36), acrescenta um novo motivo pelo qual cada um de nós e, principalmente aqueles que são revestidos de autoridade, devemos nos colocar a serviço de todos. O apóstolo nos informa: “tudo é dele, por ele, e para ele” (11,36). Isso significa que, se tudo pertence ao Senhor, não temos direito de profanarmos a obra de Deus: sua criação e as pessoas. A natureza a nós doada, não por nossos méritos, mas pela grandeza da graça do Pai, deve ser reverenciada, pois dependemos dela; as pessoas, nossos semelhantes, merecem de nós aquilo que nós gostaríamos de receber deles! Ao Senhor, “a glória para sempre”, mas como glorificá-lo se agredimos sua criação Portanto, se tudo pertence ao Senhor, quem somos nós para agredirmos sua obra? Com que direito concentramos poderes e riquezas enquanto milhares de pessoa passam fome e outras dificuldades?

Não é diferente a indagação de Jesus: “Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?” (Mt 16,13). E os discípulos respondem: “Alguns dizem que é João Batista; outros que é Elias; outros ainda, que é Jeremias ou algum dos profetas.” (Mt 16,14). Ou seja, as pessoas, mesmo aqueles que estão próximas, ainda não conhecem o Senhor.

Evidentemente Jesus sabe quem é, o que se propõe e qual sua proposta para as pessoas. Entretanto deseja uma resposta decisiva das pessoas. Por isso a outra indagação é para quem o segue, para quem se acha próximo: “E vós, quem dizeis que eu sou?” (Mt 16,15).

E assim voltamos à indagação inicial: “quem é Deus, para mim?”

Evidentemente respondemos: É meu salvador! É a razão de meu existir! É a luz da minha vida! É um guia em minha vida! Deus é tudo para mim!… e muito mais. Entretanto, a pergunta é outra, não é sobre o que digo, mas sobre o que faço: quem é Deus, para mim, não em meu discurso, em minhas palavras, mas em minha vida e ações?

A verdadeira resposta não nasce nem se apresenta em palavras de um belo discurso… Tudo que se possa dizer, pode ser apenas para cumprir com as convenções, para manter as aparências, para satisfazer as ambiguidades de cada um. Pode ser uma resposta para que o outro veja… e não para engajar na solidariedade transformadora…. A verdadeira resposta, não está nas palavras, mas nos comportamentos. A resposta está nas atitudes.

Foram as atitudes de Pedro e não as palavras: “tu és o Messias, o Filho do Deus vivo” (Mt 16,16), que lhe renderam o poder das chaves (Mt 16,19); exatamente como ocorreu com Eliacim, na profecia de Isaías 22,22). Ou seja, aquele que reconhece Jesus, recebe, também uma autoridade… e uma missão: ser ponte!

Resta, talvez, uma última indagação: por que Jesus pede segredo em relação àquilo que Pedro revelou? “Jesus, então, ordenou aos discípulos que não dissessem a ninguém que ele era o Messias.” (Mt 16,20).

Uma possível resposta, que também depende de nossa postura, é que Jesus continua fazendo a pergunta a cada pessoa. E espera de cada um a sua resposta pessoal e existencial e não aquela que já foi dada por outros. Uma resposta que vai além das palavras e que se manifesta nas atitudes: “E vós, quem dizeis que eu sou?”


Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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quinta-feira, agosto 17, 2023

Assunção de Nossa Senhora: Realizou-se a salvação

(Apocalipse 11,19a; 12,1.3-6a.10ab; 1Coríntios 15,20-27a; Lucas 1,39-56)




A celebração da Assunção de Nossa Senhora faz da liturgia de hoje uma solenidade da esperança. De alcançar o Reino, sim, mas também de viver com dignidade aqui e agora.

O livro do apocalipse mostra isso (11,19a;12,1-6a.10ab). As dificuldades, simbolizadas no do dragão ameaçando a mulher grávida (Ap 12,1) são superadas com o nascimento da criança. A vida nova, o Filho de Deus, além de uma promessa, é também uma esperança. Por isso, Deus arrebata a criança para junto de si. É a esperança de vencer as dores do dia a dia.

O poder destrutivo do dragão da maldade, (Ap 12,4) torna-se impotente diante do poder salvífico de Deus. O Filho que veio para guiar a humanidade nasce em segurança. O “filho homem, que veio para governar todas as nações com cetro de ferro” (Ap 12,5) manifesta-se com promessa e sinal de esperança.

A mãe dessa criança também recebendo proteção divina. “A mulher fugiu para o deserto, onde Deus lhe tinha preparado um lugar” (Ap 12,6). O lugar preparado para ela é o seio de Deus. É o que celebramos como Assunção: a mãe sendo levada para junto de Deus.

Com a mãe e Filho protegidos, o anjo protetor pode anunciar: "Agora realizou-se a salvação, a força e a realeza do nosso Deus e o poder do seu Cristo" (Ap 12,10). A mãe e a criança, arrebatados, protegidos pelo poder de Deus indicam o nosso caminho: o convívio com Deus alimentando a esperança superar as dificuldades cotidianas.

A mulher protegida por Deus tem uma dupla representação: primeiro representa a Igreja, o povo de Deus a caminho que se ampara e protege sob a sombra do poder divino; e também representa a mãe de Jesus. E celebramos isso porque acreditamos que suas virtudes lhe conferiram prestígio para ser levada para junto de Deus. E nisso consiste nossa esperança: da mesma forma que Jesus voltou para o Pai, na sua ressurreição, assim também, convidou e levou para junto de si aquela que o carregou no ventre, depois dela cumprir sua jornada terrena. Ela nos antecedeu por seus méritos e pelos méritos da graça divina, como a nos dizer: você também pode! E a esperança consiste justamente nisso: a morte não é o fim; é só um momento de transição desta vida para a vida definitiva junto ao Pai.

A esperança também está na carta de Paulo (1Cor 15,20-26.28). Ele ensina: “Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram” (1 Cor, 15,20). Ele é o primeiro, para nos mostrar o caminho: que Ele percorreu; por onde levou a mãe e por onde nos levará.

E o apóstolo diz isso como a dizer que a vida no mundo é importante, sem dúvida, mas a morte não é menos importante. Por ela é que se chega ao Pai. O próprio Jesus, para retornar ao Pai, passou pela morte: “Em primeiro lugar, Cristo, como primícias; depois, os que pertencem a Cristo, por ocasião da sua vinda” (1 Cor, 15,23). E, na batalha pela vida, prevalece a esperança expressa na vitória sobre a morte. “O último inimigo a ser destruído é a morte” (1 Cor 15,26). Com a morte da morte haverá plenitude de vida.

E a Igreja coloca Maria, a mãe de Jesus, como modelo da vitória da vida sobre a morte. E a solenidade da Assunção de Nossa Senhora tem essa finalidade: indicar o caminho. Ao passar pelo portal da morte, da mesma forma que a mãe do Senhor, seremos assumidos pela Trindade Santa no reino definitivo. Assim, podemos dizer que a mãe de Jesus é a precursora. Ela foi chamada ao céu para olharmos seu modelo de vida e assim termos setas indicadoras do caminho a percorrer: com dificuldades, mas também com a certeza da vitória.

E qual é o caminho indicado por Maria Assunta ao Céu?

Ele pode ser lido no programa de vida apresentado quando Maria se pôs a serviço de Isabel (1,39-56). Aquela adolescente, prestes a dar a luz, enfrentando suas dificuldades, não exitou em pegar a estrada para ajudar Isabel. A vida em favor do outro: essa é a seta indicativa. Esse é o caminho. Esse é o sentido da vida. Esse é o critério para merecer seu amor que se “estende, de geração em geração, a todos os que o respeitam” (Lc 1,50).

Maria sabia disso de forma plena. E o afirma ao exclamar: “O Poderoso fez por mim maravilhas e Santo é o seu nome!” (Lc 1,49). As maravilhas não são somente em favor da Mãe. Estão, também, à nossa disposição, pois osmos filhos do mesmo “Poderoso”.

Além disso, a esperança se manifesta numa prática de justiça e equidade. O Senhor faz maravilhas, em favor dos que o temem (praticam suas obras) porque “derruba os orgulhosos”; “exalta os humildes”; “sacia os famintos”; “despede os ricos sem nada” (Lc 1,51-53).

Maria é modelo, por suas virtudes; Maria é precursora, por suas ações; Maria é sinal de esperança, porque carregou Jesus no ventre e nos braços; Maria é esperança porque intercedeu em favor dos menos favorecidos. E, nossa fé esperançosa nos ensina que Maria é nossa intercessora, como “advogada nossa”.

Confiamos no Deus Trino e, justamente por isso alimentamos a esperança da intercessão de Maria. Por sua intercessão sabemos que Deus continua nos salvando no poder do Filho que nos ilumina pelo Espírito… e nos apresenta Maria como primeira seguidora do Filho.

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Outros escritos do autor:


quinta-feira, agosto 10, 2023

Coragem! Sou eu!

(1Reis 19,9a.11-13a; Romanos 9,1-5; Mateus 14,22-33)



Um convite à confiança. Essa é uma das propostas que hoje Deus nos está fazendo.

Para entendermos melhor vejamos o que está ocorrendo com Elias (1 Rs 19,9a.11-13a): está escondido numa gruta. E com Paulo (Rm 9,1-5)? Confessa uma tristeza por não poder oferecer mais por Jesus. E Pedro (Mt 14,22-33)? Assustado com o vento e as águas. Na caverna, na angústia ou no medo, sobram duas alternativas: o desespero ou a confiança.

Daí a pergunta: Por que essas cenas nos são apresentadas? Da parte de Deus não vem o desespero, apenas o convite à confiança! E continuam as indagações: Como nos posicionamos diante de Deus e de seu convite? Nos escondemos? Lamentamos as dores? Temos medo de submergir nas tempestades da vida? Ou confessamos, com nossa vida e nossos atos: “Verdadeiramente, tu és o Filho de Deus!” (Mt 14,33)?

Não é demais nos perguntarmos o porquê de Elias estar se escondendo, de Paulo estar angustiado e de Pedro estar afundando.

No primeiro livro dos Reis Elias é um dos personagens mais importantes. Ele é perseguido pelo rei, depois de eliminar os falsos profetas. Venceu-os em nome de Deus, mas foi perseguido pela ira do rei e escondeu-se na gruta. Lá o Senhor o encontra, mas não se manifesta nos terríveis fenômenos da natureza: tempestade, terremoto, fogo… a violência nada disso é de Deus e quem é da violência, também não é de Deus. O Senhor não se dá a conhecer no medo ou na insegurança.

No “murmúrio” da “brisa leve” Elias reconheceu a presença de Deus (1 Rs 19,13). Na paz Deus se manifestou e nesse clima de harmonia Elias saiu da gruta. Fugiu daquele que representava a violência e o medo; saiu da gruta na sensação de paz, na confiança. Em nossa sociedade quem levanta a bandeira da Paz e quem esbraveja, com armas nas mãos?

E nós, em que situação reconhecemos o Senhor, para sairmos de nossos esconderijos? Ou, antes disso, o que nos assusta ao ponto de fazer com que entremos no esconderijo? Podemos até ter feito grandes coisas em nome de Deus, como Elias, mas se não tivermos confiança no Senhor, Ele não nós mostrará sua face de amor. Se não confiarmos em sua graça, nós o confundiremos com os fogo, o vento ou o terremoto. O confundiremos com os discursos de ódio e violência, com os discursos pelas armas….

Que acontece com Paulo? Está angustiado. Seus irmãos israelitas não aderiram a Jesus. Eles “pertencem a filiação adotiva, a glória, as alianças, as leis, o culto, as promessas” (Rm 9,4). Entretanto, também aqui, é a confiança é possível reconhecer em Jesus o prometido e anunciado. Mas para isso é necessário um ato de fé. É numa profissão de confiança o apóstolo reconhece que Cristo “está acima de todos”. Ele é o “Deus bendito para sempre” (Rm 9,5).

E nós, reconhecemos o Cristo, o prometido, na pessoa de Jesus de Nazaré? E se reconhecemos, porque ainda não mudamos nossos comportamentos?

Que dizer, então de Pedro? Ele que conviveu com Jesus; viu o milagre da partilha; viu o rosto brilhante do Mestre e dele ouviu: “Coragem! Sou eu. Não tenhais medo!” (Mt 14,27). Ele que recebeu o convite para ir ao encontro de Jesus (Mt 14, 29)… teve medo!

A falta de confiança o estava afundando. Num rompente de coragem descera da barca. Mas parece que isso foi mais um gesto de empolgação do que de confiança. A empolgação não é um ato de fé. Na empolgação se fazem coisas boas… mas também coisas ruins...

Em Pedro o ato de fé se expressou no auge do desespero. Somente expressou sua confiança quando sentiu que estava afundando (nas águas e na vida), por isso o desespero. Somente quando “sentiu o vento, ficou com medo e começando a afundar, gritou: 'Senhor, salva-me!'” (Mt 14,30) ...somente nesse momento pode ser salvo. Mas antes teve que ouvir a a recriminação: “Homem fraco na fé, por que duvidaste?” (Mt 14,31).

Como estão navegando as barcas de nossas vidas? Quais são os ventos que estão nos levando para o fundo das águas do mar da vida? Estamos vendo Jesus sobre as águas, ou apenas um fantasma? (Mt 14, 26).

É possível superar as dificuldades. É possível vencer os medos. É possível enfrentar os dissabores e as dúvida e as incertezas… mas isso só será possível quando houver entrega absoluta, para não mais ouvirmos: “por que duvidaste?” Isso é possível se mantivermos a mesma atitude daqueles que estavam no barco; só quando formas capazes de dizer, não só com palavras, mas com o gesto de nossa vida: “Verdadeiramente, tu és o Filho de Deus!”. Aí, então ouviremos de Jesus: Coragem! Sou eu quem te estende a mão!

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Outros escritos do autor:



sexta-feira, agosto 04, 2023

Transfiguração: O livro de Deus

(Daniel 7,9-10.13-14; 2Pedro 1,16-19; Mateus 17,1-9)




Por que Jesus se transfigurou (Mateus 17,1-9)? Ele tinha necessidade de se mostrar no esplendor de sua divindade?

Por que se mostrou pleno apenas aos três e não aos doze? Por que pediu sigilo sobre o fato?

Você percebeu que a cena da transfiguração, narrada por Mateus, é bastante parecida com a cena descrita por Daniel (7,9-10.13-14)? O profeta fala a respeito de um ancião recebendo a visita de um “filho de homem”. Notemos que o “filho de homem”, descrito pela visão de Daniel, é servido por “todos os povos, nações e línguas”. Esse “Filho de Homem” recebe “poder, glória e realeza, e todos os povos, nações e línguas o serviam: seu poder é um poder eterno que não lhe será tirado, e seu reino, um reino que não se dissolverá” (Dn 7,14).

Notemos que, na cena da Transfiguração o rosto de Jesus “brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz”. E, em seguida, interrompendo o susto de Pedro: “uma nuvem luminosa os cobriu com sua sombra. E da nuvem uma voz dizia: "Este é o meu Filho amado, no qual eu pus todo meu agrado. Escutai-o!" (Mt 17,3.6). Notemos, aqui, que o importante não é o resplendor de Jesus, mas a ordem divina: ESCUTAI-O!

Como podemos notar, ambas as cenas, em Daniel e em Mateus, tem muito em comum. Podemos, por isso, dizer que a profecia de Daniel se confirma na Transfiguração de Jesus. Por isso, também podemos dizer que tanto em Daniel como em Mateus, o Senhor está nos mandando um recado: o tempo está próximo.

Lá em Daniel os livros que estão para serem abertos, representam a vida de cada um: é o Julgamento. Na Transfiguração o Senhor nos faz o alerta: não se distanciar do projeto divino e para isso é necessário saber que Jesus é o Filho amado e deve ser ouvido! E deve ser ouvido porque ele está prestes a abrir os livros das nossas vidas! O que temos em nosso livro?

Mas por que a cena de mistério? Por que Jesus pede sigilo? Por que não se mostrou a todos? Por que desejou se mostrar por inteiro apenas aos três?

Uma resposta, talvez, pode ser essa que vem das palavras de Pedro (2 Pd 1,16-19).

O ar de mistério, ao redor de Jesus, talvez estivesse ocorrendo porque nem todos os que se faziam batizar; nem todos os primeiros cristãos; nem todos aqueles que ouviam as novidades a respeito de Jesus, o Cristo, estavam aderindo à sua proposta. E não aderiam à sua proposta porque, segundo Pedro os incrédulos estavam imaginando que Jesus fosse apenas mais uma lenda! Mais um mito! Mais um charlatão! Mais um daqueles que tiravam proveito enganando e enriquecendo às custas do povo. Por isso, Pedro diz: “Não foi seguindo fábulas habilmente inventadas que vos demos a conhecer o poder e a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, mas sim, por termos sido testemunhas oculares da sua majestade” (2Pd 1,16).

Se Jesus fosse mais uma das tantas lendas ou um desses charlatães que se aproveitam da fé popular, não teria sentido alimentar a fé. E Jesus não queria ser seguido por causa de milagres. Não queria ser seguido porque podia alimentar multidões. Não queria ser seguido porque era popular entre os pobres. Não queria que o seguissem por suas belas palavras!

Ele queria ser seguido, sim! Mas que esse seguimento ocorresse por adesão a um projeto de vida; adesão a um plano traçado pelo Pai para a toda a eternidade. Jesus queria a adesão a uma proposta que fizesse sentido para cada um dos seus seguidores porque esse seguimento implicava em salvação; implicava em ter o nome inscrito no livro da vida; aquele livro que estava para ser aberto e que representava um divisor de águas: o momento da separação entre os que alimentaram a fé com gestos de bem em defesa da vida; e aqueles que espalham sementes de morte.

Mas os boatos estavam dificultando a adesão a esse projeto de vida. Por isso Pedro afirma: Não está falando em nome de fantasias e de mitos enganosos. Ele falava em nome daquele que, efetivamente passara da morte para a vida. Bem do jeito que Daniel havia dito, com sua “visão noturna”. Pedro insiste dizendo que efetivamente Jesus “recebeu honra e glória da parte de Deus Pai, quando do seio da esplêndida glória se fez ouvir aquela voz que dizia: ‘Este é o meu Filho bem-amado, no qual ponho o meu bem-querer’” (1Pd 1,17).

Temos assim o sentido e o porquê da Transfiguração: Jesus quer mostrar que traz a mensagem salvadora e que não é um mito charlatão. Jesus quer adesão pela fé e não com base em boatos ou milagres que alguns usam para se aproveitar. Jesus traz uma boa notícia: proposta de uma vida plena, mas somente para quem tem o nome no livro!

A Transfiguração de Jesus é um anúncio de como podemos ser, quando seguimos seus passos, escrevendo nosso nome no livro de Deus




Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Outros escritos do autor:



Sagrada Família: para se cumprir!

Reflexões baseadas em: Eclo 3,3-7.14-17a; Cl 3,12-21; Mt 2,13-15.19-23 Todos os que, de alguma forma, tiveram contato com os ensinamentos d...