domingo, abril 11, 2021

Páscoa 2 - Um só coração



(Reflexões baseadas em: 4,32-35; 1Jo 5,1-6; Jo 20,19-31)




Acabamos de celebrar a Páscoa. Por esse motivo a liturgia nos convida a continuar nesse mesmo clima de alegria e compromisso.

Mas esse convite da liturgia, também nos lança um desafio para nossa fé. E trata-se de um desafio porque não se baseia no que dizemos, mas no que fazemos. Não se expressa em palavras, mas em atitudes...afinal, viver em “um só coração e uma só alma”, não é fácil!

Os Atos dos Apóstolos (4,32-35) nos colocam diante de um desafio para a fé numa experiência comunitária. Aqui nos é apresentado um modelo de comunidade ideal na qual “ninguém passava necessidade” (At 4,34). A base dessa comunidade comunista eram os apóstolos que “davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus” (At 4,33). Um testemunho que tem a solidariedade como pressuposto.

Na primeira carta de são João (5,1-6) o desafio consiste em nos identificarmos com Jesus, o vencedor do mundo, vencedor da morte, promotor da vida e aquele que concede todas as vitórias, uma vez que todas as vitórias tem a fé, como ponto de partida. Nas palavras do apóstolo: “Esta é a vitória que venceu o mundo: a nossa fé” (1Jo 5,4). Vencer na vida não é impossível, desde que a vida e a vitória tenham a fé como fundamento. “Quem é o vencedor do mundo, senão aquele que crê que Jesus é o Filho de Deus?” (1 Jo 5,5).

O evangelho, João (20,19-31) nos apresenta a radicalidade do desafio da fé. A fé de quem viu o ressuscitado é uma proposta para acreditar sem ver. É o próprio Senhor que exige essa radicalidade: “Jesus lhe disse: 'Acreditaste, porque me viste? Bem-aventurados os que creram sem terem visto!'” (Jo 20,29).

E aqui está o desafio: nada mais do que o próprio ato de fé.

A maioria de nós está acostumada e aceitamos aquilo que pode ser facilmente comprovado. Vivemos numa sociedade em que a demonstração, a prova, a evidência...são exigidos como critério de relacionamento. Raramente alguém acredita no que o outro afirma, só porque essa pessoa afirmou. Mesmo que ela seja merecedora de credibilidade permanece o “será?”. Uma das expressões que já esteve na boca da maioria de nós: “sou igual São Tomé: só acredito vendo...”. Essa é uma das frases mais impróprias para quem se confessa cristão.

É verdade que estamos inseridos numa sociedade de aparências, num mundo de falsidades e envolvidos em relações parciais, tendenciosas… por tudo isso é quase natural que não acreditemos. E, aqui está a questão: se não damos crédito ao que nos dizem aqueles com os quais convivemos, como podemos dar crédito a personagens como Jesus e seus apóstolos? E o que é pior, corremos o risco de estarmos frequentando alguma comunidade não porque acreditamos, mas porque assim aprendemos com nossos pais, com os mais velhos; essa participação pode tratar-se de uma ação cultural e não de um ato de fé!

Neste ponto, alguém pode estar se perguntando e perguntando também a mim: mas então, em que consiste a fé, como podemos caracterizar a crença?

Não sou eu que respondo, mas a própria Palavra Santa: a fé é expressão de uma vida e se manifesta como gesto doador de vida. Não é possível alguém dizer que tem fé se ela não se traduz nem se manifesta em gestos concretos. A fé que dizemos ter, precisa ser confrontada com a postura da sociedade ideal, dos Atos. Tem que estar adequada à vida plena manifestada pela Palavra Santa, que foi escrita para gerar fé e vida. “Estes foram escritos para que acrediteis que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu nome.” (Jo 20,31).

A proposta da comunidade apresentada aos primeiros cristãos e uma exigência feita também a nós: construir uma sociedade na qual tudo seja “distribuído conforme a necessidade de cada um” (At 4,35). Uma afirmação que tem por fundamento ou que se manifesta numa outra: tudo que sobra das minhas necessidades é o que está faltando àqueles que sentem necessidades…; tudo que está em meu poder e que ultrapassa minhas necessidades, não me pertence, mas pertence àqueles que necessitam…

É aqui o ponto em que se comprova a fé: na capacidade de partilhar! Dizia um sábio bispo: “A fé entra pelos ouvidos, chega ao coração. Se atravessar o bolso, é uma fé garantida e manifesta-se numa pessoa desapegada”. E não se trata de nenhum rótulo sócio-político. Trata-se de palavra de Deus. Trata-se de um modelo de sociedade em que a base das relações é ser capaz de ajudar a eliminar a necessidade do outro.

Como se pode ver, a radicalidade da fé é exigente e tem consequências. Ela é revolucionária. Quem, efetivamente, foi tocado por ela, será mais um dos poucos a ajudar na construção da sociedade da paz, pois a estes, constantemente Jesus oferece: “A paz esteja convosco” (Jo 20,19). Entretanto, no mundo da paz não pode haver necessitados. A ausência da paz é evidenciada pela presença de pessoas necessitadas. Enquanto existirem pessoas necessitadas não haverá paz.

Aqui está, portanto, o grande desafio: construir uma sociedade, uma comunidade em que a norma de vida seja “um só coração e uma só alma!”

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador.

Outros escritos do autor:

Filosofia, História, Religião: https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro

Literatura: https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro

segunda-feira, abril 05, 2021

FILOSOFIA: Observação e Reflexão

Admitindo que filosofia, muito mais do que um conceito, é uma atitude, somos levados a dizer que atividade filosófica não se limita a ler livros de filosofia ou estudar sobre os grandes filósofos.

Podemos dizer que, antes disso, é necessário ser capaz de observar a realidade e emitir uma opinião sobre ela. É verdade que se pode, e é aconselhável, emitir essa opinião fundamentando-a no que disseram outros pensadores, ou as ciências, a respeito daquela realidade. Mas isso não significa que não se possa inovar.

Então a pergunta que se impõe é: como se caracteriza a atitude filosófica?

Inicialmente, pela observação e pela reflexão.

Como sabemos qualquer realidade pode ser investigada pela filosofia. E a realidade, observada pelo sujeito é analisada por ele. E o que é observado? Aquilo que chama a atenção. Algo que impressiona. Algo que provoca admiração ou, como diziam os pensadores gregos, que causa espanto.

Trata-se, portanto, de refletir sobre as realidades observadas.

Isso ocorre porque aquilo que chama a atenção do observador leva à indagação: “como se dá isso?”. E a indagação aparece porque o homem é um ser “perguntante”. É um ser que está constantemente olhando-observando as realidades circundantes em busca de mais ou novas informações, complementando aquilo que já sabe; novos saberes para acrescentar ao que já sabe; novas descobertas para expandir o que já sabe; dominar novos horizontes ampliado o ângulo de visão, renovando e reformulando os saberes já adquiridos.

E isso não é uma novidade nossa ou dos pensadores atuais. No século IV aC, Aristóteles afirmou isso em um de seus escrito. Nas primeiras linhas do Livro I de “Metafisica”, diz: “Todos os homens têm, por natureza, desejo de conhecer. Uma prova disso é o prazer das sensações”. Ou seja, temos prazer em aprender. Em seguida, admite que os animais possuem a “faculdade de aprender”, Mas, diz o pensador grego, “a espécie humana vive da arte e dos raciocínios”. E conclui dizendo que “a filosofia é por todos concebida como tendo por objeto as causas primeiras e os princípios.”

O fato é que nós humanos percebemos o mundo que nos cerca não como algo definitivo, mas como um arsenal de novidades; novidades essas que se nos apresentam como problema. E o processo de resolução dos problemas ou explicação do real se dá mediante um processo de reflexão pelo qual queremos saber o que faz com que algo seja o que é.

O que é e como se dá esse processo reflexivo?

Entende-se por reflexão o processo pelo qual o intelecto volta-se novamente sobre algo já conhecido em busca de novas informações. É como se o pensamento estivesse dobrando-se para pensar novamente e já pensado. “FLEXÃO” é uma espécie de dobradura: o atleta faz flexão de braço!

Quando acrescentamos o “RE” a uma palavra estamos indicando que aquilo deve se repetir: RE-começar significa começar novamente. O professor Demerval Saviani, no livro “Educação, do senso comum à consciência filosófica”, diz o seguinte sobre a reflexão:





“A palavra nos vem do verbo latino “reflectere" que significa "voltar atrás". É, pois, um re-pensar, ou seja, um pensamento em segundo grau. Poderíamos, pois, dizer: se toda reflexão é pensamento, nem todo pensamento é reflexão. Esta é um pensamento consciente de si mesmo, capaz de se avaliar, de verificar o grau de adequação que mantém com os dados objetivos, de medir-se com o real. Pode aplicar-se às impressões e opiniões, aos conhecimentos científicos e técnicos, interrogando-se sobre o seu significado. Refletir é o ato de retomar, reconsiderar os dados disponíveis, revisar, vasculhar numa busca constante de significado. É examinar detidamente, prestar atenção, analisar com cuidado. E é isto o filosofar.”





Levando em consideração essas palavras e observando o comportamento humano, notaremos que constantemente estamos nos voltando sobre as realidade que nos cercam. Inicialmente para fazer filosofia; depois, o saber filosófico permite ampliar o saber científico. Por isso é que dizemos que a filosofia é responsável pelo avanço da ciência. E assim, pelo processo da reflexão, a humanidade, ao longo de milhares de anos, vem ampliando os conhecimentos, inovando-os, transmitindo-os às novas gerações

E o interessante, nisso é que no processo da transmissão dos saberes ocorre o encontro de dois universos: de um lado o que transmite e o do outro aquele que recebe a transmissão. É o diálogo. É a dialética do saber.

O contato entre esses dois universos produz o espaço para a indagação, para a dúvida, para o problema. Nesse espaço é que se insere a reflexão pois os dois diferentes precisam se identificar e interagir. E dessa forma se ampliam os saberes com novas informações e conhecimentos. E assim se vão desenvolvendo a filosofia, as ciências e as inovações da tecnologia.

Esse processo é o que nos permite dizer que a filosofia é responsável pelo avanço do saber produzindo ciência.

domingo, abril 04, 2021

Páscoa - Viu e acreditou



(Reflexões baseadas em: At 10,34a. 37-43; Cl 3,1-4; Jo 20,1-9)





Será que nós já nos demos conta do que aconteceu nestes dias? Será que, realmente, compreendemos o que ocorreu não só nas celebrações da Semana Santa, mas com aqueles que viveram os eventos que deram origem às nossas celebrações?

A indagação tem sentido, porque uma coisa é celebrarmos a Paixão de Cristo, sua ressurreição, sua Páscoa. Outra coisa é entendermos e assumirmos em nossa vida aqueles acontecimentos, para que eles alimentem nossa fé.

Ocorre que nem sempre celebramos com base na fé. Aliás, creio que podemos dizer que na maioria dos casos, as pessoas “vão na onda”… fazem por que esse é o costume…

Você sabe que isto é verdade: As celebrações da Semana Santa passam pela vida de muitos, mas nem todos celebram a Semana Santa. Você sabe, assim como eu, que as celebrações podem ocorrer porque aprendemos com nossos pais; porque é tradição; porque “todo mundo faz”... Elas podem representar uma conveniência e convenção social… afinal de contas não fica bem um comportamento diferente do que todo mundo faz… Já pensou uma Páscoa sem comprar e dar presentes? Sem aquelas mensagens de felicitações que compartilhamos, às vezes sem entender direito? Já pensou numa Páscoa sem os coelhinhos e os chocolates?… Já se deu conta de que isso, por vezes ou na maioria das vezes, tem mais a ver com os apelos comerciais do que com celebração da vida que brota da terra na forma de Jesus, o Cristo de Deus mostrando o caminho da ressurreição pascal?

Entretanto, apesar de tudo isso, a celebração da Semana Santa e da Pascoa tem sentido de ser porque nos apresenta um convite para a eternidade.

Sabemos desse convite e o recebemos, porque alimentamos uma fé que nasce das escrituras. No livro dos Atos dos Apóstolos, temos uma prova disso (At 10,34a. 37-43). Pedro comenta o fato e sua origem: “aconteceu em toda a Judeia, a começar pela Galileia” (At 10,37). E o que foi que lá aconteceu? A manifestação da graça divina, na pessoa de Jesus de Nazaré. Ele que foi “ungido por Deus com o Espírito Santo e com poder. Ele andou por toda a parte, fazendo o bem e curando a todos” (At 10,38). E, por ter feito o bem, foi assassinado, pregado na cruz (At 10,39).

Entretanto, essa foi só a face humana e histórica daquilo que fundamenta nossa fé. Isso representa um fato que, por si mesmo, dispensa a fé, pois pode ser comprovado. A sequência dos fatos, isso sim é elemento de fé. Isso realmente representa algo grandioso. Isso merece ser celebrado, pois indica a grandiosidade da proposta que Deus mantém. O que vem depois da cruz é o verdadeiro sentido da fé, pois depois da morte na cruz, Jesus não permaneceu na morte. Depois da cruz “Deus o ressuscitou no terceiro dia, concedendo-lhe manifestar-se” (At 10,40). A ressurreição e suas manifestações, isso sim é objeto de fé. Em quem? No Senhor que realizou essas coisas, nos indicando o que nos espera; e fé no testemunho daqueles que vivenciaram os fatos.

Nossa fé tem por base a certeza do que nos afirmaram aqueles que receberam a missão de divulgar o que Deus fez. E a missão foi confiada pelo próprio Jesus, o Cristo ressuscitado, como nos informa Pedro: “E Jesus nos mandou pregar ao povo e testemunhar que Deus o constituiu juiz dos vivos e dos mortos.” (At 10,42).

A ressurreição de Jesus tem muito mais a nos dizer. E a nos mostrar: o caminho para a eternidade. O caminho foi aberto pela ressurreição de Cristo, mas trilhá-lo depende de nós, dos nossos comportamentos e atitudes. E Paulo, na carta aos colossenses (Cl 3,1-4), insiste nesse ponto. A vida eterna nos é oferecida e está à nossa disposição. Entretanto, precisamos desejá-la e lutar por ela. “Esforçai-vos por alcançar as coisas do alto”, diz Paulo. E insiste: “aspirai às coisas celestes e não às coisas terrestres.” (Cl 3,1-2). É como se o apóstolo dissesse: “de que adianta existir água fresquinha na geladeira, se eu não me dirijo a ela para matar minha sede?”

Para isso acontecer temos que nos espelhar na Páscoa de Jesus. Sua Páscoa não foi somente a passagem, da morte para a vida, mas foi, também sua passagem pela história dos homens. Ele passou pela vida, como qualquer um de nós e, por isso e pelo que realizou nessa passagem – sua Páscoa entre nós – pode viver a Páscoa definitiva, passando da morte para a vida. Quando chegar nossa vez, caso tenhamos trilhados os passos do mestre, passaremos a viver com Ele “revestidos de glória” (Cl 3,4) para sempre.

Nisso reside o sentido da celebração e o motivo de celebrarmos a Páscoa com Jesus: em nossa vida refazermos os passos do Senhor, com a fé de que também trilharemos seus passos na direção da morada definitiva.

É claro que podemos continuar dando e recebendo presentes; comprando e dando chocolate; distribuindo coelhinhos e mensagens otimistas e belas… mas temos que entender: tudo isso tem a ver com o comércio, com convenções sociais… mas só isso não é celebração de Páscoa. É só comércio. A Páscoa tem a ver com reconstrução da vida nos moldes do que fez e ensinou Jesus!

A Páscoa, de Jesus e a nossa com o Cristo ressuscitado, exige o compromisso da fé, conforme a proposta que podemos ler em João 20,1-9. Não basta apenas sermos anunciadores com a angústia da incerteza da Madalena (Jo 20, 1-2): “Tiraram o Senhor do túmulo, e não sabemos onde o puseram”. É necessária, também a postura do discípulo amado que, ao ver a cena, compreende e acredita: “Ele viu, e acreditou. De fato, eles ainda não tinham compreendido a Escritura, segundo a qual ele devia ressuscitar dos mortos” (Jo 20, 8-9) abrindo caminhos para a vida…




Neri de Paula Carneiro

Outros escritos do autor:

Filosofia, História, Religião: https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro

Literatura: https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro

sexta-feira, abril 02, 2021

Vigília Pascal - Ide depressa



(Reflexões baseadas em: Gn 1,1-2,2; Êx 14,15-15,1; Rm 6,3-11; Mc 16,1-7)






A celebração da Páscoa pode ser feita a partir de diferentes olhares e significados.

Primeiro porque nesta noite de luz, a Igreja nos convida à mais longa lista de leituras. Ao todo são nove leituras: desde o Gênesis até o trecho do Evangelho. É a celebração mais solene e vibrante. Apesar de, do ponto de vista popular, a celebração do Natal envolver mais popularidade, a celebração da Vigília Pascal é aquela que dá sentido ao ano litúrgico; dá sentido à quaresma; dá sentido ao advento e ao Natal. Tudo porque é nesta noite que celebramos a Ressurreição.

Para os hebreus, a Páscoa foi a saída da escravidão para a liberdade. Foi, ao mesmo tempo, um projeto social, político e religioso. Talvez por esse motivo textos do livro do Êxodo, narrando os preparativos para comer o cordeiro e a saída para o deserto; narrando a travessia do Mar Vermelho, continuem motivando as comunidades cristãs a clamarem por libertação. A liturgia da vigília nos apresenta: Êxodo 14,15-15,1

Para Jesus, a Páscoa foi o coroamento de suas pregações e a superação do martírio, das dores e da morte ressignificando a Páscoa hebraica evidenciando não só o amor divino para com seu Filho mas também para mostrar aos cristãos o verdadeiro sentido da vida (Mc 16,1-7). A vida que se encaminha para a morte, tem na Páscoa de Jesus, um significado pleno de ressurreição. Jesus foi o primeiro, para nos indicar o caminho, dizendo-nos com sua vida, paixão e morte, que seu seguidor não terá apenas alegrias, mas que as dores serão superadas pois a cruz é a chave para a ressurreição.

Para a Igreja, a Páscoa é um momento litúrgico que tem na celebração da Paixão do Senhor o ponto de partida para a celebração da vida que teima em ressurgir. Por isso, a Igreja, no Brasil, utiliza a campanha da Fraternidade para dizer aos fiéis que não basta ajoelhar, rezar e voltar para casa como se nada estivesse acontecendo na sociedade. A Igreja nos afirma e cobra de nós que nos convertamos durante a quaresma, nos purifiquemos na Semana Santa e reassumamos novos projetos de sociedade, com justiça, paz e novas relações amorosas entre as pessoas. A Igreja ressurge na Páscoa com o objetivo de ser auxilio para os fiéis interferirem na sociedade a fim de que “todos tenham vida”. Por isso é que ouvimos, de Paulo (Rm 6,4-11), está admoestação: “Pelo batismo na sua morte, fomos sepultados com ele, para que, como Cristo ressuscitou dos mortos pela glória do Pai, assim também nós levemos uma vida nova. 5 Pois, se fomos de certo modo identificados a Jesus Cristo por uma morte semelhante à sua, seremos semelhantes a ele também pela ressurreição” (Rm 6,4-5)

Para os cristãos a Páscoa é a celebração da vida nova em Cristo Ressuscitado e, ao mesmo tempo, a esperança de superação das dores do dia a dia, enquanto se caminha para a morada definitiva. A celebração da Páscoa cristã, não se limita a ouvir e meditar as leituras proferidas durante a celebração. Não se esgota na confraternização familiar… Como membro da Igreja, corpo de Cristo, o cristão é aquele que faz acontecer, em seu dia a dia, em seu ambiente de trabalho, em suas relações familiares e sociais o projeto de vida nova ressuscitada dos túmulos das injustiças produzidas por todos os que continuam matando o Cristo-presente-em-nós. A Páscoa, para o cristãos, é a atualização da ressurreição de Cristo e da missão da Igreja na sociedade, pois o cristão é a face da Igreja na sociedade.

Por tudo isso, quando celebramos a Páscoa estamos mostrando ao mundo que, muito mais do que dizer que cremos na vida superando a morte, nós queremos valorizar a vida a ser edificada ao longo dos dias que antecedem a morte. Estamos querendo dizer que os sistemas de morte que se instalaram na vida das pessoas e na sociedade em que vivemos podem e devem ser superados, com planos de equidade e participação. Sem que isso ocorra, mesmo que façamos belas celebrações continuaremos crucificando Jesus. Por isso é necessária a transformação dos comportamentos, pois Cristo ressuscitou para nos oferecer vida nova!

E, talvez, pelo fato de os cristãos ainda não acreditarem no potencial transformador da mensagem cristã. Talvez, por não vivenciarem a mensagem que dizem acreditar. Talvez, por se aliarem mais aos difusores da morte, a partidos e sistemas que não valorizam a vida… talvez por tudo isso é que acaba prevalecendo a páscoa do mercado. Mas é necessário insistir: aquela do mercado, NÃO É PÁSCOA! É só comércio!

Por esse motivo é que, para o mercado, a páscoa é somente um dia a mais a ser explorado, ao mesmo tempo que se exploram as pessoas.

Então a Páscoa, em seu sentido mais cristão, eclesial, bíblico e em sintonia com Jesus Ressuscitado, ainda está para acontecer em sua plenitude.

A ressurreição de Cristo já aconteceu, mas ainda falta produzirmos sua ressurreição na sociedade. Essa é a nossa missão no mudo: anunciar a vida nova que está por vir. Hoje é a nós que Jesus ressuscitado está enviando, mediante as palavras do anjo às mulheres: “Ide depressa contar aos discípulos que ele ressuscitou dos mortos, e que vai à vossa frente” (Mt 28,7).

Por esse motivo, para dar testemunho da vida ressurgindo da morte, é que as mulheres ouvem estas palavras: "Não vos assusteis! Vós procurais Jesus de Nazaré, que foi crucificado? Ele ressuscitou. Não está aqui. Vede o lugar onde o puseram. Ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que ele irá à vossa frente, na Galileia. Lá vós o vereis, como ele mesmo tinha dito." (Mc 16,6-7).

Neri de Paula Carneiro

Outros escritos do autor:

Filosofia, História, Religião: https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro

Literatura: https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro

Sexta Feira Santa - Será bem sucedido



(Reflexões baseadas em: Is 52,13 – 53,12; Hb 4,14-16; 5,7-9; Jo 18,1 – 19,42)



A Sexta Feira Santa é um daqueles dias sobre o qual há pouco que falar. O significado desta celebração fala por si mesmo. É um dia propício ao silêncio interior, a fim de nos colocarmos diante do espelho da nossa vida. É um bom momento para reconfigurar nossa vida e nossas ações.

A Sexta Feira Santa é o dia em que se celebra a completa entrega de vida, a completa doação, a maior prova de amor e que traz, como consequência, o maior milagre: o ressurgimento da vida enterrando os domínios da morte; é a vida se dando para a plenitude da existência. E isso tudo para dar sentido à existência humana.

A Sexta Feira Santa nos leva a ler Isaías (Is 52,13 – 53,12) e a descrição do Servo Sofredor, como uma prefiguração das dores de Jesus. As dores do Servo acontecem para resgate de muitos, uma vez que seu sofrimento possibilita a salvação de todos. Ele foi ferido, esmagado, punido...para curar o mundo, diz o profeta (Is 53,5): “Mas ele foi ferido por causa de nossos pecados, esmagado por causa de nossos crimes; a punição a ele imposta era o preço da nossa paz, e suas feridas, o preço da nossa cura.” As dores do servo são o preço do nosso resgate!

A Sexta Feira Santa é, sem a menor dúvida, a celebração da morte. Mas uma morte que produz vida. É a celebração da semente prenhe de vida depositada no útero da terra (Jo 19,42), ventre fértil formado por Deus, renascendo em vida plena. A semente, por si mesma é só semente, mas semeada, enterrada… é promessa de vida. Assim é a Sexta Feira Santa: celebração que fundamenta a fé num porvir de felicidades.

A Sexta Feira Santa é o dia do resgate, conforme as palavras de Isaías (53,12): “Por isso, compartilharei com ele multidões e ele repartirá suas riquezas com os valentes seguidores, pois entregou o corpo à morte, sendo contado como um malfeitor; ele, na verdade, resgatava o pecado de todos e intercedia em favor dos pecadores.” Essa descrição do Servo, se concretiza em Jesus Cristo, na celebração desta Sexta Feira, igual a todas as outras, mas essencialmente diferente, pois aqui, numa cena de morte, se celebra a vida!

A Sexta Feira Santa, de acordo com a carta aos Hebreus (4,14-16; 5,7-9) é um momento decisivo: para Jesus é “ consumação de sua vida”; e para nós é “causa de salvação eterna” (Hb 5,9). É uma celebração sem pompas, sem brilho de adereços. Mas isso porque na simplicidade e singeleza da celebração está o dom da grandeza do gesto salvador.

A Sexta Feira Santa é a memória que fazemos da agonia de Jesus que “dirigiu preces e súplicas, com forte clamor e lágrimas, àquele que era capaz de salvá-lo da morte” (Hb 5,7). E, apesar dessa agonia não deixou de se entregar ao seu propósito, com o objetivo de nos ensinar o caminho: a glória não é dom gratuito, mas uma conquista das lágrimas: chorou a mãe, choraram os amigos, choramos nós… mas essas lágrimas regam a semente da vida ressurgida da morte!

A Sexta Feira Santa é a outra face do Natal. Como qualquer ser humano, Jesus nasceu para morrer, mas como Cristo de Deus, morreu para dar via. Para nos mostrar o caminho da vida. Por participar de nossa humanidade é o único “capaz de se compadecer de nossas fraquezas” (Hb 4,15)

A Sexta Feira Santa, acima de tudo, é o dia em que celebramos a fidelidade de Deus, na forma humana, ao acompanharmos a narrativa de seus últimos passos (Jo 18,1 – 19,42). Uma fidelidade acima de todos os nossos medos e mesquinhez, pois mesmo diante da negação de Pedro (Jo 18, 17.25.27), foi capaz de interceder pela liberdade dos seus: “Se é a mim que procurais, então deixai que estes se retirem” (Jo 18,8).

A Sexta Feira Santa, por ser o dia da entrega definitiva, despojando-se da vida, Jesus nos dá até mesmo sua mãe, que passa a ser nossa mãe. “Depois disse ao discípulo: 'Esta é a tua mãe'. Daquela hora em diante, o discípulo a acolheu consigo.” (Jo 19,27). E, dessa forma, passamos a fazer parte da família de Deus, pois fomos adotados pela mãe de Deus no altar da cruz!

A Sexta Feira Santa, é uma celebração de poucos cantos, de compenetração, de reflexão, de revisão de conduta, de exame de consciência, de entrega… mas é, também, celebração de agradecimento: Jesus de Nazaré, é o Servo Sofredor que se oferece como o Cristo de Deus; celebração de penitência: nas dores de Jesus podemos lavar nossa maldade para alvejar nossa vida convertida a Deus e aos irmãos; celebração do silêncio: depois de passar a noite em oração, Jesus é aprisionado nas cadeias de nossa omissão ao seu Projeto; celebração da tomada de consciência: nossos erros pessoais e sociais continuam sendo grilhões e cravos no corpo de Jesus Cristo pobre e marginalizado em nossa sociedade...

Por fim e por tudo isso, a Sexta Feira Santa nos coloca diante de necessidade de uma tomada de decisão: agirmos como Pedro, negando ao Senhor; ou agirmos como o discípulo amado, acolhendo a mãe, e com ela seu Filho que se dá por nós. É a decisão que nos cobra a celebração da Sexta Feira Santa.

Neri de Paula Carneiro

Outros escritos do autor:

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quarta-feira, março 31, 2021

Quinta Feira Santa - Dei-vos o exemplo

Estamos em plena Semana Santa. Nesta semana, ao mesmo tempo que podemos e devemos refletir as leituras que a Igreja nos propõe, também podemos e devemos refletir o significado destas celebrações que estão no coração da fé cristã. De modo especial, a celebração da Quinta Feira Santa, o dia no qual a Igreja celebra a instituição dos sacramentos da Eucaristia e da Ordem.

A leitura, extraída do livro do Êxodo (Ex 12,1-8.11-14), é uma narrativa da Páscoa judaica. Nela podemos destacar: a) a partilha do cordeiro (Ex 12,4) que não deve ser consumido isoladamente, mas em comunidade. É uma celebração em família, com o direito de convidar a família do vizinho. Esse cordeiro que nos remete a Jesus o Cordeiro de Deus. b) a unção das portas com o sangue do cordeiro (Ex 12,7), indica, ao mesmo tempo, o caminho por onde passará o anjo exterminador e a entrega de Jesus, que verterá sangue na cruz. c) a refeição feita às pressas (Ex 12,11), indicando que não se trata de uma festa, mas de uma celebração em vista de uma missão. Mais uma ligação com a entrega do Senhor, na eucaristia. A comunhão não se destina ao deleite espiritual, mas ao fortalecimento para a caminhada. d) uma festa memorável (12,14), ou seja, algo a se repetir perpetuamente, da mesma forma que celebramos a Eucaristia, indicando a presença do Senhor, na história do povo sofredor, alimentando-o na busca da libertação.

Isso nos permite dizer que a Páscoa Judaica, efetivamente é um anúncio da Páscoa que se concretiza em Jesus Cristo de forma definitiva e universal.

E também nos remete às orientação de Paulo à comunidade de Corinto (1Cor 11,23-26). Um texto muito próprio para este momento litúrgico. O apóstolo narra os passos do Senhor entregando-se na eucaristia. O apóstolo, repete as mesmas palavras de Jesus: “Isto é meu corpo que é dado por vós” (1Cor 11,24). O pão, portanto, passa a ser o próprio corpo do Senhor. E está sendo “dado” na forma de uma oferenda. Mas o detalhe é que não é um sacerdote que oferece o sacrifício, mas Jesus, o próprio Cordeiro, que celebra o ritual oferecendo e entregando-se. A mesma afirmação vale para o vinho: que passa a ser o sangue de Jesus; que passa ser a nova aliança. “Este cálice é a nova aliança, em meu sangue” (1 Cor 11,25). Comer e beber o pão e o vinho/corpo e sangue tem tripla finalidade: proclamar a morte de Jesus; esperar o retorno de Jesus e dar sentido à nossa esperança na medida em que nos alimentamos cotidianamente com seu corpo e sangue.

E, como sempre, Jesus radicaliza. No trecho de João (Jo 13, 1-15), que estamos lendo hoje, é evidente essa radicalização: “tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1). Mas, neste caso, em que consiste a radicalidade de Jesus? Em oferecer-se para nos dar as chaves de seu Reino, pagando o preço dessa entrega. Sendo o exemplo para os seguidores!

Na ceia, prenúncio da Eucaristia, o Senhor se depara com duas situações: de um lado, ceder a tentação de fugir ao seu propósito, uma vez que já sabia que seria traído por Judas (Jo 13,2). Como tudo estava em suas mãos (Jo 13,3), poderia ter fugido ao martírio. Afinal, quem estava agindo nesse sentido era o gerador de divisões (diabo) (Jo, 13,2) que estava no coração de Judas.

Por outro lado, a opção era assumir a conclusão do Plano. Daí sua decisão: despir-se do manto, tomar a toalha e lavar os pés dos discípulos (Jo 13,4-5). Gesto que caracteriza o sacramento da ordem. Talvez por isso, um gesto, em si mesmo, incompreensível para algumas pessoas, mas pleno de significados: a) o mestre não é superior aos discípulos, apenas tem função diferente; b) o mestre não tira proveito pessoal dos discípulos, mas lhes ensina como se colocar à disposição para servir; c) o mestre ensina a partir de gestos que só serão compreensíveis quando o discípulo se entregar completamente ao plano de doação (Jo 13,7); d) o mestre que serve não perde a dignidade, mas usa seus gestos para ensinar e orientar os discípulos, como fez o Senhor após lavar os pés dos discípulos: “Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem, pois eu o sou. Portanto, se eu, o Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz” (Jo 13,13-15).

“Dei-vos o exemplo”, afirma o Senhor. Nisso está um dos pontes centrais da missão de Jesus. E a Quinta Feira Santa se caracteriza por nos colocar esse desafio. Não basta dizermos que somos cristãos. Importa assumir a postura de quem pretende dar prosseguimento à missão de fazer o que fez o mestre: oferecer a vida para servir e produzir transformações no mundo.

Aliás essa é uma característica essencial do cristianismo: não é uma religião que tem por objetivo apenas produzir deleite espiritual, para satisfação individual. É sim a religião em função da ação dentro da sociedade. O cristianismo cobra do crente uma profunda inserção na sociedade com a finalidade de transformá-la, extirpando todos os valores contrários à vida. Quem ensina isso? O próprio Senhor: “Dei-vos o exemplo!”

Neri de Paula Carneiro

Outros escritos do autor:

Filosofia, História, Religião: https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro

Literatura: https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro

sábado, março 27, 2021

Ramos - Esvaziou-se a si mesmo



(Reflexões baseadas em: Mc 14,1-15,47; Is 50,4-7; Fl 2,6-11)
 




Aqueles de nós que levamos a sério o período quaresmal, possivelmente tenhamos acompanhando os passos de Jesus. E se o tivermos acompanhado, certamente teremos, em algum momento, ouvido dele a interpelação: quando você começará seu processo de conversão?

E agora estamos celebrando o domingo de Ramos, com algumas lições para aprender!

Em primeiro lugar, vamos acompanhar o cortejo no qual Jesus é o centro (Mc 14,1-15,47). Começa com uma procissão triunfante. Narra a entrada de Jesus, sendo aclamado em Jerusalém. A segunda parte dessa cena mostra Jesus em Jerusalém, agora cumprindo plenamente sua missão: prisão e morte. E o interessante dessa narrativa da entrada em Jerusalém, prisão e morte, é que ela termina num momento de suspense. A cena do sepultamento. E lá estavam: “Maria Madalena e Maria, mãe de Joset, observavam onde ele era colocado” (Mc 15,47).

Essa interrupção é proposital. É um link para o que acontecerá na celebração da Páscoa, quando veremos que, mesmo tendo sido morto e sepultado, Jesus é maior que a morte, pois as mulheres que o vão procurar encontram o túmulo vazio. E recebem o comunicado: “Ele ressuscitou!” (Mc 16,6). Mas isso será lá na celebração da Páscoa!

Aqui vamos para a segunda lição: a grande notícia do domingo de Ramos vai além.

A primeira notícia é o fato de evidenciar duas posturas da multidão, diante de Jesus. Num primeiro momento o aclamam com ramos e gritos de “Hosana”. Expressão hebraica que se popularizou como uma aclamação de louvor, mas que significa “Salva-nos”. A multidão pede: salvação contra o império dominador e a restauração do reino de Israel. “Bendito seja o reino que vem, o reino de nosso pai Davi!” (Mc 11,10). A segunda postura da multidão aparece quando acompanha Jesus, no seu julgamento e a caminho do calvário. Agora não é mais aclamado como rei. Embora Pilatos o chame de “Rei dos Judeus” (Mc 15,12). Agora a multidão, não lhe pede salvação, mas que Pilatos o condene: “Crucifica-o!” (Mc 15,13-14).

Essas duas posturas nos levam a uma pergunta: De qual grupo nós fazemos parte?

Evidentemente todos respondemos que somos do grupo que aclama e rende louvores a Jesus. Entretanto, nestes tempos conturbados, onde o diálogo é assassinado e o poder se sobrepõe ao amor, uma indagação se impõe: Será que cantaríamos com honestidade aquela canção: “Seu nome é Jesus Cristo e passa fome / E grita pela boca dos famintos / E a gente quando vê passa adiante / Às vezes pra chegar depressa a igreja”?

Além disso, a Campanha da Fraternidade nos interpela: Como anda nossa capacidade de conviver com o diferente?

O domingo de Ramos, por fim nos coloca diante do profeta Isaías (Is 50,4-7) e do apóstolo Paulo (Fl 2,6-11).

O profeta mostra um personagem que nasceu para falar coisas boas “O Senhor Deus deu-me língua adestrada, para que eu saiba dizer palavras de conforto” (Is 50,4). Mesmo sendo uma “pessoa do bem” esse personagem é agredido, esbofeteado e cuspido (Is 50,6). E, apesar de todo sofrimento, o personagem continua sua missão. Ele sabe que não está só, uma vez que “o Senhor Deus é meu Auxiliador, por isso não me deixei abater o ânimo”

Diante desse trecho da profecia de Isaías, de imediato identificamos esse personagem com Jesus. Mas não seria também um convite para revermos nossas posturas? Como reagimos quando somos mal interpretados ou agredidos por fazermos algo bom? Nunca nos agrediram? Isso significa que convivemos com anjos ou que nunca fizemos algo de bom?

Vamos agora atentar para o que Paulo nos apresenta, de Jesus. Inegavelmente era Deus e convivia com o Pai (Fl 2,6). Mas essa condição divina não o afastou da nossa humanidade. Pelo contrário. O fato de ser Deus foi a causa de se fazer humano: esvaziou-se da condição divina (Fl 2,7); humilhou-se, entregando-se à morte, como um cordeiro, entregue ao sacrifício (Fl 2,7).

Notemos que sua entrega, ou seja, seu “esvaziamento” e sua humilhação, não foram causa de vergonha. Pelo contrário, foram a condição para a exaltação.

Dessa forma é que se apresenta a nós a grande mensagem do domingo de Ramos: Deus se esvaziou de sua divindade para vir ao nosso encontro. E nós, de que vamos abrir mão para mais nos aproximarmos de Deus? Ou ainda precisamos encontrar a Jesus Cristo? Se for esse o caso, lembremo-nos onde podemos encontrá-lo: “Seu nome é Jesus Cristo e está banido / Das rodas sociais e das igrejas / Porque d'Ele fizeram um Rei potente /Enquanto Ele vive como um pobre”.

E tem aquela outra: “as pessoas entram nas igrejas querendo encontrar Jesus no sacrário; mas ele teima em se esconder debaixo do viaduto, nas beiras das calçadas…”

Talvez por isso muitas pessoas estejam sentindo dificuldade para encontrar Jesus. Isso talvez ocorra porque muitas vezes nos esquecemos de que ele se “esvaziou de sua condição divina” para conviver conosco. Plenamente Deus, viveu entre nós como um ser plenamente humano, uma pessoa normal. E fez isso para mostrar como é possível ao ser humano chegar a Deus...




Neri de Paula Carneiro

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sexta-feira, março 26, 2021

Reforma e Contrarreforma

Que a Idade média foi um período de supremacia católica, isso todos já sabemos. Também não é segredo que o movimento renascentista colocou muitos pontos de interrogação sobre as certezas da fé. Mas o que nem todos sabem é que nesse mesmo período medieval e renascentista estavam sendo colocadas as questões que produziriam outra ruptura no cristianismo.

Foi outra ruptura porque a primeira havia sido em 1054, quando Oriente e Ocidente cristãos se separaram.

Os cristãos do oriente estabeleceram sua sede na cidade de Constantinopla. Nascia a Igreja Católica Apostólica Ortodoxa. Do outro lado, na Europa, sediada em Roma, mantinha-se a Igreja Católica Apostólica Romana.

Mas agora, no século XVI, mais especificamente em 1517, um monge se insurge contra as orientações do Papa e pregou uma lista com 95 problemas a serem resolvidos pela Igreja, sob pena de estar deturpando o cristianismo. Esse monge era o beneditino Martinho Lutero (1483-1546).

Com esse fato ganhou força o movimento da reforma. Entretanto, deve-se notar, que “este movimento surgiu com o caráter inicial de buscar a reforma da Igreja, diante de uma série de erros e abusos que aconteciam, sobretudo, no episcopado e no alto clero”. Isso é o que afirma padre Inácio Medeiros, num artigo sobre a história da Igreja, disponível em: https://www.a12.com/redacaoa12/historia-da-igreja/os-precursores-da-reforma-john-wyclif-e-jan-huss.

Sabemos que Lutero não foi o primeiro a mostrar os equívocos da Igreja. Os questionamentos às posturas dos seus chefes vinham de longe.

Há alguns séculos vinham crescendo, por parte dos monarcas que não concordavam com as taxas cobradas pela Igreja nem com o poder político dos papas. Muitos eram os que condenavam a corrupção e o despreparo do clero.

Podemos, também, lembrar de dois personagens, antes de Lutero, que marcaram essa trajetória de insatisfação: John Wycliff (1328-1384) e Jan Huss (1369-1415). Ambos teólogos que, ainda no século XIV, condenavam o luxo e ganância de bispos e do papa. Afirmavam, cada um em sua época e região, que a Igreja deveria ter menos riqueza e mais caridade. Ambos foram perseguidos, excomungados e serviram de inspiração para as obras de Lutero.

No artigo mencionado anteriormente, o Pe Inácio ainda nos informa que “o posicionamento desses três reformadores serviu para embalar alguns conflitos sociais que cresciam no meio dos camponeses entre o século XIV e XVI. As questões religiosas no período passaram a tomar uma conformação de crítica prática, por parte do campesinato, ao poderio econômico, político e militar detido pela aristocracia”.

Ou seja, a Reforma, que tinha uma conotação Religiosa, se alongou pelos lados da economia, da politica e acabou repercutindo as posturas sociais. A situação de pobreza da população fez com que os reformadores se popularizassem ainda mais, pois defendiam causas populares.

Mais dois nomes merecem destaque, neste processo de renovação e arejamento das ideias religiosas. São eles João Calvino (1509-1564) e Henrique VIII.

Enquanto os três primeiros apontavam, como principais problemas da Igreja, seu poder fundamentado na riqueza e a partir disso atacaram outros problemas e posturas doutrinais, Calvino se contrapõe a princípios essenciais do catolicismo, como a questão da predestinação.

Calvino influenciou fortemente o protestantismo francês. A partir de suas ideias nasceu o calvinismo que se espalhou em várias nações na Europa, na Africa e na América.

Por seu lado, o problema de Henrique VIII, rei da Inglaterra, em princípio, não foi religioso. O rei pretendia anular seu casamento para casar-se com outra mulher, mas a Igreja se contrapôs, em nome do princípio da “indissolubilidade” do casamento (o casamento, para a Igreja, é “até que a morte os separe”). Como o papa não aceitou seu propósito, o rei rompeu com a Igreja, confiscou-lhe as terras e criou a Igreja Anglicana, da qual o rei é o chefe supremo.

Evidentemente existiram outros reformadores, cada um com seu grau de contribuição para que se efetivasse uma verdadeira reformulação das e nas posturas da Igreja.

Por outro lado é de se imaginar que, sendo questionada por diversos monges, padres e pensadores, a Igreja reagiria.

E reagiu com o movimento denominado de Contrarreforma.

Inicialmente a reação da Igreja era apenas na forma de perseguição dos opositores. E isso era feito pelo antigo “Tribunal do Santo Oficio”. Atualmente essa instituição da Igreja denomina-se “Congregação para Doutrina da Fé” e trata de ordenar os ensinamentos da Igreja.

Esse Tribunal organizava os interrogatórios e julgamentos daqueles que a Igreja considerava hereges. Esse Julgamento era denominado de “Inquisição”, pois era montado um “inquérito” interrogando os acusados. Quando condenados eram expulsos da Igreja (excomungados) e, em outros casos executados na fogueira.

Ainda na Contrarreforma a Igreja fez algumas inovações. Entre as inovações efetivadas pela Igreja no movimento da Contrarreforma pode-se mencionar: a condenação dos atos e doutrinas de Lutero e Calvino; o reconhecimento de alguns abusos cometidos em nome das indulgências. Uma outra providência que perdura até nossos dias foi a organização dos seminários, para formação dos novos padres.

Reforma e Contrarreforma, na realidade, foram o mecanismo pelo qual as ideias religiosas foram incorporadas num movimento maior de renovação. O mundo, naquele contexto, vivia uma grande transformação em todas as frentes.

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador.

Rolim de Moura – RO

quinta-feira, março 25, 2021

FILOSOFIA: NOVOS PASSOS

Ao darmos os primeiros passos no entendimento da filosofia pudemos perceber que existem algumas visões equivocadas a respeito dela. Agora apresenta-se outra pergunta: Se não é filosofia muito do que se diz por aí, então o que é filosofia? Como entendê-la? Talvez nos ajude a entender sua etimologia e sua aplicação à realidade.

Etimologia refere-se à compreensão do significado das palavras. Então, qual a etimologia da palavra filosofia?

Trata-se de um vocábulo grego formada por duas palavras, plenas de significado: “FILO”: que significa algo como amigo, amante, amizade; “SOFIA”: que também tem significado amplo como saber, sábio, conhecimento. E se juntarmos essas palavras teremos algo parecido com: "amigo do saber", "amante da sabedoria" ou "amigo do conhecimento". Vamos assumir que a junção desses dua palavras nos produzam a ideia de “amante do saber”.

Alguns autores dizem que essa palavra tem sua origem envolvida em lendas. Outros dizem que é atribuída a Pitágoras. Comentando textos de Cicero, Mario B. Sproviero (Disponível em http://www.hottopos.com/notand2/a_palavra.htm;) transcreve a seguinte afirmação, do pensador Romano: “A filosofia remonta, como todos sabem, aos tempos mais antigos, apenas sua denominação é que é recente. Quem, pois, negaria que não só a sabedoria, bem como seu próprio nome, sejam coisas antigas? Este sublime nome junto aos antigos destacava sua aspiração ao conhecimento das coisas humanas e divinas, e das causas de todas as coisas. Assim aqueles sete que os gregos chamaram sophoí e nós, os romanos, reconhecendo-lhes o mérito, chamamos Sapientes… [...] Em seguida todos aqueles que seguindo a estes, dedicavam-se acuradamente à contemplação das coisas, foram considerados e chamados sábios, nome que continuou a usar-se até os tempos de Pitágoras. O doutíssimo discípulo de Platão, Heráclides Pontico, narra que levaram a Fliunte alguém que discorreu douta e extensamente com Leonte, príncipe dos fliúncios. Como seu engenho e eloquência tivessem sido apreciados por Leonte, este perguntou-lhe que arte professasse, ao que ele respondeu que não conhecia nenhuma arte especial, mas que era filósofo”.

O discurso de Cícero, segundo Sproviero, termina com a explicação dada por Pitágoras: “alguns vão em busca de glória enquanto outros de ganho, restando, todavia, alguns poucos que desconsiderando completamente as outras atividades, investigam com afinco a natureza das coisas: estes dizem-se investigadores da sabedoria - quer dizer filósofos - e como é bem mais nobre ser espectador desinteressado, também na vida a investigação e o conhecimento da natureza das coisas estão acima de qualquer outra atividade.”

Dessas palavras de Cicero podemos concluir: A filosofia, muito mais do que uma palavra, é uma atitude. E que atitude seria essa? A atitude da busca e não da posse. É uma atitude de busca que envolve: a) busca de alternativas à acomodação; b) proposição da dúvida sobre as certezas; c) desintegração da crosta das aparências.

A certeza leva à acomodação e juntas impedem a continuação da pesquisa. Pra que continuar buscado se já se sabe a resposta. Pior ainda é a vida das aparências, na qual o saber não é sabedoria, mas fingimento. Essa atitude filosófica acaba se manifestando como um questionamento à sociedade atual em que valem as aparências e as pessoas vivem acomodadas nas suas certezas. Razão pela qual a filosofia acaba sendo mal vista ou, segundo afirma o filósofo alemão Karl Jasper, em seu livro “Introdução ao pensamento filosófico”, seus adversários querem que ela seja apresentada como algo entediante e que deveria desaparecer: “É preciso impedir que os homens se tornem sensatos. Mais vale, portanto, que a filosofia seja vista como algo entediante. Oxalá desaparecessem as cátedras de filosofia. Quanto mais vaidades se ensinem, menos estarão os homens arriscados a se deixar tocar pela luz da filosofia”

Como podemos perceber, até mesmo a partir de sua etimologia a filosofia nos lança um desafio: é necessário ir além, desconfiar das aparências, e das evidências. A verdade pode estar escondida por trás das certezas

Neri de Paula Carneiro

Mestre em Educação, Filósofo, Teólogo, Historiador

Rolim de Moura – RO

segunda-feira, março 22, 2021

Transgredindo a pandemia

Vivemos tempos de isolamento, distanciamento…

Tempos de medo… Um monstro anda solto por aí. Ele é enorme… aliás, não é UM mostro. São milhões... por milimetro quadrado!

Em tempos de isolamento, que pode ser chamado de interpessoal, pois o isolamento social é antigo e reflete a distância entre ricos e pobres; entre brancos e pretos; entre urbanos e rurais; entre quem se alimenta e quem passa fome; entre políticos e suas vítimas… então estamos em tempos de isolamento interpessoal… E nos escondemos em nossas casas para não olharmos na cara do mundo

Em tempos de isolamento, as vontades se impõem. Vontade de sair de casa. Vontade de abraçar. Vontade de beijar. Vontade de transar…. Vontades! Vontade de fazer o que não se pode confessar!

Em tempos de isolamento, os atritos se avolumam: casais brigando e depois se amando. Pais e filhos não se suportando e se agredindo… mas depois... há quem diga que são só sinais dos tempos pois a casa que já foi lar, virou um inferno que expressa os atritos e conflitos entre aqueles que vivem sob o mesmo teto por falta de opções! (Quando não havia isolamento, cada um se escondia em seu grupo… os moradores da mesma casa não precisavam se olhar... e assim o lar parecia doce!)

Em tempos de isolamento, nem as pessoas nem a pandemia ficam, definitivamente, islados!Pois TRANSGREDIR é muito mais divertido!!!

Em tempos de isolamento, até a sugestão de ficar em casa pode gerar reflexão. Quando não produzem o resultado inverso…E às vezes são vontades meio loucas, só para reagir contra a determinação do bom senso.... Afinal, fazer o PROIBIDO é muito mais divertido!!!

Então, se é para transgredir a proibição, vamos fazer o seguinte: se deu vontade de sair por ai, abraçando todo mundo pra dizer que não suporta mais ficar trancado em casa… então corre! Vai lá e abrace a família: o pai tem que reaprender a abraçar os filhos; a mãe tem que reaprender a abraçar o marido, o irmão tem que suportar a irmã e a irmã tem que entender as necessidades do irmão; e os filhos tem que reaprender a respeitar os pais… Temos que transgredir a moda!

Além disso, deu vontade de sair por ai, beijando, pra manifestar afeto, carinho paixão…, então está na hora de beijar a família: o pai, a mãe, o irmão, a irmã, o marido, a esposa…

E também, se deu vontade de sair por aí para transar, também isso dá pra fazer em casa: com a esposa, com o marido… e se não tem nem esposa nem marido, masturbe-se!!!

Mas é necessário ficar em casa que é tempo de pandemia e enquanto as autoridades não assumem seu papel de guardiões da saúde publica, o público pode fazer o que lhe compete: manter o clima de isolamento!!! e até nisso dá pra transgredir

Tá certo que as autoridades estão deixando a desejar, mas também é verdade que as pessoas estão abusando. Tá certo que existem muitos interesses inconfessáveis e segundas intenções por trás de todas as atitudes dos políticos. Há muito dinheiro nas cuecas dos que bradam: Povo!

Eles estão aproveitando pra “ir passando a boiada”

Deu vontade…. Fica em casa! E aproveita pra analisar tudo que te dizem, tudo que compartilham contigo… afinal, tudo está repleto de segundas intenções…

É tempo de pandemia… mas não precisa só ter medo desse vírus monstruoso. Tem que temer o vírus do conformismo. Aquele que não analisa os fatos… pode ser engolido por eles!

E faça um favor pra humanidade… transgrida, pois para transgredir tem que pensar, analisar tirar conclusões……..para conter a boiada!

Neri de Paula Carneiro

Mestre em Educação, Filósofo, teólogo, historiador

Outros textos do autor:

Filosofia, História, Religião: https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro

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sábado, março 20, 2021

Quaresma 5 - É agora o julgamento deste mundo

(Reflexões baseadas em: Jr 31,31-34; Hb 5,7-9; Jo 12,20-33)




Estamos nos encaminhando para o final da Quaresma. E, se tivermos levado a sério a proposta que a Igreja nos apresenta, durante o tempo quaresmal deveríamos estar fazendo uma revisão de vida com a finalidade de, na Páscoa, ressurgirmos para uma vida nova. Com o objetivo de inaugurarmos um mundo novo. Com o desejo de nos reconduzirmos na direção de um mundo que Deus nos está encarregando de recriar e reconstruir.

Isso nos ajuda a entender a afirmação de Jesus (Jo 12,20-33): “É agora o julgamento deste mundo” (Jo 12,31). Após ter sido julgado o mundo está apto a ser recriado. Isso, também, ajuda a entender o anúncio da promessa do Senhor, nas palavras de Jeremias (Jr 31,31-34): “Virão dias, diz o Senhor, em que concluirei com a casa de Israel e a casa de Judá uma nova aliança” (Jr 31,31). Só é possível uma nova aliança porque a antiga foi superada, seus destinatários não a concluíra; só é possível uma nova aliança porque o mundo foi julgado e preparado para a recriação. E essa recriação pode ser concluída tendo por base a plena obediência de Jesus (Hb 5,7-9), ao Plano do Pai, como nos ensina a carta aos Hebreus. Ou seja, por ser Filho “aprendeu o que significa a obediência a Deus” (Hb 5,8).

O profeta, evidentemente, cumpre seu papel: transmite a mensagem do Senhor. Ele sabe que as pessoas caem nas tentações. Sabe que as pessoas deixam-se levar pelos momentos, sem se preocupar com o depois ou com o além. Mas também sabe que quando as pessoas deixam-se conduzir pelo Senhor, a nova aliança se concretiza e, então, passamos a ser seu povo e Ele nosso Deus. No momento em que efetivamente nos deixarmos conduzir pelo Senhor, Ele nos dirá: “imprimirei minha lei em suas entranhas, e hei de inscrevê-la em seu coração; serei seu Deus e eles serão meu povo” (Jr 31,33). Um novo povo num mundo refeito.

E o Senhor dirá isso a nós porque o povo de Israel não entendeu a proposta. Deus os escolheu para ser o ponto de partida e difusão das propostas de seu Reino, mas eles pensaram que eram os únicos destinatários da promessa. E falharam duplamente: porque não foram fiéis à aliança e nem difundiram as sementes do Reino. A aliança definitiva e a promessa cumpriu-se em Jesus Cristo. Isso o entendemos quando, ao ser procurado pelos gregos (Jo 12,20) Jesus afirma: “Chegou a hora em que o Filho do Homem vai ser glorificado. Em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele continua só um grão de trigo; mas se morre, então produz muito fruto” (Jo 12,23-24). Os frutos de Jesus são as pessoas que se engajam na reconstrução do mundo, preparando a instalação do Reino.

Não é demais reafirmar: a Aliança, anunciada pelo profeta, concretiza-se em Jesus. Por isso ele afirma: pois “chegou a hora”.

Chegou a hora de se concretizar a Aliança definitiva, pois Jesus, mesmo em seu sofrimento, cumpre a vontade do Pai. E, assim, como diz a carta aos Hebreus, “na consumação de sua vida, tornou-se causa de salvação eterna para todos os que lhe obedecem.” (Hb 5,9). A proposta, portanto, é universal.

Chegou a hora da angústia de Jesus, por ter que entregar a vida. Mesmo o Filho de Deus sente a angústia da morte. Entretanto não se recusa a cumprir sua missão “Agora sinto-me angustiado. E que direi? Pai, livra-me desta hora? Mas foi precisamente para esta hora que eu vim.” (Jo12,27). Por isso ele afirma e pede: Pai cumpra-se a tua vontade.

Chegou a hora do julgamento do mundo. Ou seja, nossa vida é o momento definitivo. É o instante da opção: podemos aderir ao projeto de Jesus, à proposta do Reino, e então seremos atraídos até o Senhor (Jo 12,32); ou podemos nos recusar a isso e o anticristo tomará conta de nossa vida, como ocorre constantemente, em cada ação desumana que é praticada pelas pessoas.

Mas também chegou a hora da decisão, pois “Agora o chefe deste mundo vai ser expulso” (Jo 12,31). Essa expulsão não será feita por Jesus, pessoalmente, mas por cada uma das pessoas que aderirem ao projeto de amor e solidariedade; de altruísmo e de vida, desfazendo-se dos projetos que colocam o sistema econômico acima da vida; que colocam os interesses políticos acima das pessoas. Por isso, esta é, também, a hora que que o “chefe deste mundo” vai lutar para atrair e manter um maior número de seguidores, ampliando a divisão e negando o diálogo. Nos dias atuais o anticristo, por meio de fake news, de mentira... produz e amplia atos de divisão entre as pessoas usando um “gabinete” de apoiadores.

Mas, chegou a hora! E Jesus é categórico: é a hora do julgamento deste mundo. Consequentemente, é a hora em que chefe desta mundo será expulso. Do ponto de vista litúrgico isso se dá com a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus. Mas do ponto de vista humano e cristão é com nossa vida que fazemos a opção: ou aderimos ao chefe deste mundo e o ajudamos a piorar todas as coisas; ou aderimos a Jesus e nos empenhamos no processo da recriação, contra esse que nega a vida.

Assumindo uma ou outra postura, “é agora o julgamento deste mundo!” A quem vamos aderir?

Neri de Paula Carneiro

Filósofo, teólogo, historiador, mestre em educação.

Outros textos do autor:

Filosofia, História, Religião: https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro

Literatura: https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro

segunda-feira, março 15, 2021

NÃO É FILOSOFIA

Quando os professores iniciam uma nova disciplina uma das primeiras coisas que fazem é dizer o que é aquilo que vão lecionar. Trigonometria é…; raiz quadrada é...; genética é...; relevo é...; fato histórico é... Nestes casos parte-se do princípio de que o estudante sabendo o que É aquilo que vai estudar já teria feito um bom começo. Isso não está errado, mas também não se pode dizer que é somente assim que se pode estudar alguma coisa.

Com a filosofia pode ser diferente. Pode-se começar, justamente pelo contrário, entendendo o que não é filosofia. Sem fazer definições, pois toda definição é uma limitação! E uma das características da filosofia é quebrar as limitações, pois elas impedem o avanço; excluem novas oportunidades; matam as inovações. As definições, como estabelecimento de limites, são afirmações parciais uma vez que pretende colocar um ponto final na discussão.

Cabe à filosofia, como processo de busca, duvidar, abrir horizontes, ultrapassar limites, propor novas discussões. À filosofia cabe olhar a partir de outros e novos pontos de vista, pois a realidade vai além daquilo que podemos dizer ou perceber. É necessário fazer filosofia para entendê-la, como diz Manuel Garcia Morente, no livro Fundamentos de Filosofia: “é absolutamente impossível dizer de antemão o que é Filosofia. Não se pode definir Filosofia antes de fazê-la. [...]. Que quer dizer isso? Isso quer dizer que Filosofia, mais do que qualquer outra disciplina, necessita ser vivida”.

Acima de tudo, à filosofia cabe afirmar que a realidade vai além daquilo que podemos ver, dizer ou perceber. Ou seja, ela nos sugere que as aparências podem ser enganosas. As aparências, as evidências, tudo que se manifesta imediatamente, pode nos induzir a equívocos. E isso pode ser superado pela análise filosófica. Saber os caminhos a serem evitados pode ajudar a chegar mais rapidamente ao destino sem se perder no labirinto da imprecisão. Então, o que não é filosofia?

FILOSOFIA DE VIDA

O professor D. Saviani diz que “todos e cada um de nós temos a nossa ‘Filosofia de vida’. Esta se constitui a partir da família, do ambiente em que somos criados”.

Filosofia de vida, portanto tem uma dimensão pessoal e não grupal e social, o que a distingue do senso comum. Sendo assim a “Filosofia de vida” nada mais é do que uma expressão que designa alguma forma específica de viver ou encarar a vida, de conceber o mundo e a existência. Podemos, inclusive, dizer que filosofia de vida é cosmovisão de uma pessoa ou os valores cristalizados na sociedade. Mas isso não é Filosofia!

FRASES E PROVÉRBIOS

Quem de nós nunca usou uma frase feita, um provérbio, um dito popular? E fazemos isso com que finalidade?

Usamos esses saberes populares quando queremos produzir um efeito especial; fazer uma afirmação a partir do senso comum. Quando queremos fazer afirmações genéricas se encaixarem numa situação específica. Entretanto essas frases e provérbios, justamente por serem genéricas, não se constituem filosofia. Mesmo que a frase tenha sido retirada de um texto filosófico ou tenha sido escrita por um filósofo. Até mesmo um livro de Filosofia, por si só, não é Filosofia.

PRONTO E ACABADO

O que dissemos acima nos leva a uma conclusão: o que chamamos de provérbios, frases e filosofia de vida, não são filosofia. Não importa a interpretação que se faça da frase ou do provérbio: eles continuam não sendo Filosofia, uma vez que já estão prontos e acabados.

Pode ocorrer que a partir disso empreendamos um processo de reflexão. De análise e, neste caso, podemos fazer filosofia. Pode ocorrer que desenvolvamos uma análise filosófica desses elementos: provérbios, frases e ditados ou dos saberes das diversas filosofias de vida que se desenvolvem a partir do senso comum. A análise pode ser filosófica, mas a frase, o provérbio... continuarão sendo apenas isso: uma frase ou um provérbio. Pode até possuir um significado profundo, mas isso que já está pronto ainda não é Filosofia!

Neri de Paula Carneiro

Mestre em Educação, Filósofo, Teólogo, Historiador

Rolim de Moura – RO

sábado, março 13, 2021

Quaresma 4 - A Luz veio ao mundo


(Reflexões baseadas em: 2Cr 36,14-16.19-23; Ef 2,4-10; Jo 3,14-21)





As celebrações do período quaresmal nos mostram a grandeza do amor divino. Mas, ao mesmo tempo, mostra que até a paciência de Deus tem limites.

É claro que o amor de Deus pela humanidade é infinitamente maior do que sua ira, mas isso não significa que, como um pai bondoso, ele não estabeleça algumas condições a serem seguidas pelas pessoas. Não como punição, mas como medida corretiva. Se é verdade que toda ação tem uma reação, todas as nossas atitudes têm consequências.

No segundo livro das crônicas (2Cr 36,14-16.19-23) podemos ver uma demonstração disso: a denúncia dos pecados, uma vez que “todos os chefes dos sacerdotes e o povo multiplicaram suas infidelidades” (2Cr 36,14). Devido a isso Deus chama a atenção dos infiéis, cobrando mudança nos comportamentos “o Senhor Deus de seus pais, dirigia-lhes frequentemente a palavra por meio de seus mensageiros, admoestando-os com solicitude todos os dias, porque tinha compaixão do seu povo” (2Cr 36,15). Como se vê, é a compaixão que move a ação divina.

Porém, como os infiéis não mudavam as atitudes concretizou-se a lição ensinada pelo Senhor: “O furor do Senhor se levantou contra o seu povo e não houve mais remédio. Os inimigos incendiaram a casa de Deus e deitaram abaixo os muros de Jerusalém” (2 Cr 36,18-19). E, após os anos de punição, acontece a restauração, pelas mão de Ciro, um rei estrangeiro (para mostrar que o amor de Deus não tem fronteiras, vai além de um povo). E o rei decreta: “O Senhor, Deus do céu, deu-me todos os reinos da terra, e encarregou-me de lhe construir um templo em Jerusalém, que está no país de Judá. Quem dentre vós todos, pertence ao seu povo? Que o Senhor, seu Deus, esteja com ele, e que se ponha a caminho” (2 Cr 36,23). E assim voltaram os exilados, redimidos, prontos para recomeçar uma nova sociedade que deveria ser gerida pela caridade!

Deus é amoroso. É supremo amor. É pleno em misericórdia… e isso quem nos ensina é Paulo, escrevendo aos Efésios (Ef 2,4-10). O apóstolo afirma expressamente: “Deus é rico em misericórdia. Por causa do grande amor com que nos amou, quando estávamos mortos por causa das nossas faltas, ele nos deu a vida com Cristo” (Ef 2,4-5). Deus é, também, justo, pois oferece oportunidade para que o pecador se converta… Deus quer a vida e quer que a defendamos acima de tudo, em favor de todos.

O fato é que por seu amor é justo e misericordioso. Da mesma forma que um pai, estabelece limites para o filho rebelde não se destrua e possa rever seus comportamentos. É necessário que as pessoas tomem consciência de que estão cometendo faltas contra a bondade divina, contra a vida humana e da natureza. Ocorrendo essa consciência de defesa, manutenção e restauração da vida, Deus concede a graça do perdão. O apóstolo é claro ao dizer que “é pela graça que sois salvos, mediante a fé. E isso não vem de vós; é dom de Deus!” (Ef 2,9).

O dom da graça, entretanto, é consequência do bem que realizamos. “Obras boas, que Deus preparou de antemão para que nós as praticássemos” (Ef 2,10). A graça é dom de Deus, mas exige o comprometimento humano! Sem o nosso comprometimento individual, pessoal e definitivo, não tem como a graça agir em nós.

Isso é o que ensina Jesus, na conversa com Nicodemos (Jo 3,14-21). Deus age esperando nossa resposta. Uma resposta que consiste num ato de fé; um ato de fé que conduz à vida eterna: “todos os que nele crerem tenham a vida eterna” (Jo 3,15). A vida terrena, portanto, é o passaporte para a vida eterna. As atitudes neste mundo passageiro abrem as portas para o Reino definitivo

E Jesus insiste na afirmação central dirigida a todos que desejam segui-lo. “Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por ele” (Jo 3,17). Feita essa afirmação, Jesus se apresenta como divisor de águas.

É a partir da fé em Jesus, da adesão ao seu projeto que se dá a divisão: “Quem nele crê, não é condenado, mas quem não crê, já está condenado” (Jo 3,18).

O critério de Deus, ou seja a sua justiça, coloca nas mão de cada um de nós a responsabilidade pelos atos praticados. São esses atos que iluminam o caminho humano ou o escurecem. As pessoas aderem à luz divina ou afastam-se dela, num ato de fé ou de incredulidade. E Jesus explica isso da forma muito transparente: “O julgamento é este: a luz veio ao mundo, mas os homens preferiram as trevas à luz, porque suas ações eram más. Quem pratica o mal odeia a luz e não se aproxima da luz, para que suas ações não sejam denunciadas. Mas quem age conforme a verdade aproxima-se da luz, para que se manifeste que suas ações são realizadas em Deus” (Jo 3, 18-21).

E isso nos leva de volta ao ponto inicial: o amor misericordioso de Deus é infinito, mas ele também é infinitamente justo. Concede o perdão e a vida àqueles que o procuram, mas quem não crê e pratica o mal, já está condenado! Não está condenado por Deus, que é amor e perdão, mas pelos seus próprios atos que o afastam de Deus.

Neri de Paula Carneiro

Outros textos do autor:

Filosofia, História, Religião: https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro

Literatura: https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro

sexta-feira, março 05, 2021

Quaresma 3 – Loucura de Deus


(Reflexões baseadas em: Ex 20,1-17; 1Cor 1,22-25; Jo 2,13-25)






Nós já nos acostumamos a nos chamar de louco ou doido: “você é louco, por fazer isso!”. “Isso é coisa de doido! Só você mesmo!” E assim por diante, estamos acostumados a ouvir e usar essa expressão: às vezes elogiando a loucura de alguém que fez algo extraordinário; às vezes condenando a insensatez de alguém!

Loucura, insensatez… expressões que usamos para dizer que não concordamos com aquilo que o outro está pensando, dizendo, fazendo… “Isso é coisa de doido!”

Mas a respeito de Deus, somente usamos expressões edificantes: Santo, eterno, fonte da plena sabedoria, misericordioso, todo poderoso… E nunca ousaríamos dizer que um ato de Deus seja loucura ou insensatez. Se vem de Deus, aceitamos. Mesmo quando, às vezes, não entendemos. Dizemos apenas que isso é divino! só por Deus!

A questão é que, sempre que avaliamos alguma coisa: concordando ou discordando; dizendo que está certo ou errado… sempre usamos nossos valores. Usamos nossos critérios. Falamos a partir do que achamos que é certo ou errado. Mas o que é o certo e o errado? Será que já nos perguntamos o que é que Deus considera certo ou errado? E quando fazemos isso, será que não estamos querendo dizer a Deus o que Ele deveria fazer?

A liturgia do terceiro domingo da quaresma mostra uma dimensão dessa loucura/sabedoria dos homens e de Deus. No livro do Êxodo (20,1-17), podemos visualizar um desses aspectos de loucura, uma vez que estabelecer normas, sobre como deve ser o comportamento das pessoas, como é o caso deste trecho do Êxodo, não é algo agradável. Mas Deus faz isso. Loucura?

Paulo, na primeira carta aos coríntios, (1Cor 1,22-25), é mais específico em mencionar a loucura, pois cultuar um crucificado não é uma situação normal. Pelo contrário: é loucura, é escândalo!

Agora imagine a cena: Jesus, no templo! Ele, com um chicote nas mãos, derrubando tudo e expulsando os negociantes… Isso é mais do que uma doidura qualquer. Uma pessoa normal, diante de algo que desaprova, no máximo fala que aquilo não está certo. Mas Jesus não. Ele faz um tremendo “barraco”. Esse tem que ser internado, pois surtou, disseram!

Mas em tudo isso está a visão ou os critérios ou os valores ou a compreensão humana. Para tentarmos obter uma compreensão ou uma percepção mais exata, Paulo nos dá a dica: “Pois o que é dito loucura de Deus é mais sábio do que os homens, e o que é dito fraqueza de Deus é mais forte do que os homens.” (1Cor 1,25). Ou seja, somos convidados a olhar para os eventos não com os critérios e valores humanos, mas com os olhos de Deus. O que é que Deus está vendo que o motiva a estabelecer as normas expressas no trecho do Êxodo?

Está observando que existe idolatria (Ex 20,3-4); uso indevido do nome de Deus (Ex 20,7); as pessoas não estão dedicando um tempo para Deus (Ex 20,8-11); as pessoas não estão respeitando a família, pois estão adulterando e desonrando os pais (Ex 20,12.14.17); as pessoas estão matando, roubando e mentindo...(Ex 20,13,15,16). Então tem que se estabelecer um limite!

Como sabemos que estão fazendo isso? Porque esses são os preceitos ensinados. E o argumento é simples. As normas surgem para regulamentar as condutas vigentes. Somente afirmamos a necessidade de respeito aos pais, quando percebemos que estão sendo desrespeitados pelos filhos. Deus viu que alguns estavam enriquecendo às custas dos mais pobres… por isso instituiu: não roubar! Numa palavra, Deus viu a bandidagem tomando conta e causando o sofrimento dos mais fracos, por isso estabeleceu as normas, os mandamentos.

Jesus não fez diferente (Jo 2,13-25). Diante do que estava (e ainda está!!!) acontecendo no templo, expula os infratores. E toma essa atitude ao ver a infração ocorrendo….A casa de oração transformada num centro comercial (Jo 2,14)!

Quem de nós já ficou indignado com lideranças das Igrejas (não só no mundo católico) fazendo uma pregação que privilegia mais os tijolos que a instalação do Reino. Com tantos pregadores anunciando curas milagrosas, seria interessante lançarmos um desafio: por que os tantos pregadores de tantas curas milagrosas não deram fim à pandemia do Corona Virus? Sabe por quê? Porque são charlatães da fé. Mas para eles Jesus tem preparado o chicote (Jo 2,15)?

O fato é que, do ponto de vista humano, a proposta do reino é um absurdo, pois exige a prática da justiça e da verdade. Exige solidariedade e não egoísmo; exige fraternidade e não a concentração de rendas e bens e riquezas....

Seguir a proposta de Deus é loucura, pois exige renuncias e opções em favor do outro. Aderir a Jesus Cristo, neste mundo que valoriza as coisas, os bens, a riqueza… não é prova de sensatez. Seguir a Jesus Cristo, neste mundo que não vê e despreza os valores do Reino, é prova de loucura. Seguir a Jesus Cristo implica andar pelos caminhos da partilha, da solidariedade, da cruz. Seguir a Jesus Cristo implica ser derrotado pelo mundo, mas também implica na maior prova de loucura: a certeza da ressurreição!





Neri de Paula Carneiro

Filósofo, teólogo, historiador, mestre e educação.

Outros textos do autor:

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Literatura: https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro


Os nomes escritos no céu

Reflexões baseadas em:  Is 66,10-14; Gl 6,14-18; Lc 10,1-12.17-20   Alegrai-vos e exultai! Esse é o grito estimulante do profeta Isaías (I...