quinta-feira, 13 de abril de 2023

Tomé: Amar sem ter visto

(Reflexões baseadas em: Atos dos Apóstolos 2,42-47; 1 Pedro 1,3-9; João 20,19-31)




Por que Tomé não acreditou, quando seus companheiros lhe disseram: “Vimos o Senhor!”? Será que lhe faltou fé? (João 20,19-31).

Ou será que ele agiu como uma pessoa sensata movida pela lógica e pela razão? Afinal, todos haviam acompanhado os fatos: o mestre havia sido crucificado, morto e sepultado! E de repente começam a dizer: ele está vivo!

Não faz sentido!

Principalmente porque, até aquele momento,Jesus havia sido um mestre, isso com certeza era verdade. Mas ainda não tinham entendido que ele era o Cristo, o Filho encarnado!

Até aquele momento,para eles Jesus havia sido um grande amigo, compreensivo, compassivo; fizera atos extraordinários..., mas as escrituras relatam que Moisés e vários profetas também realizaram prodígios. Elias até ressuscitara um menino (1Rs 1,22)!

Tomé, portanto, não foi incrédulo, mas, com certeza queria algo a mais do que boatos. Não se deixava seduzir pela boataria, como esses que proliferam depois de alguma tragédia. E a execução de Jesus havia sido uma tragédia. Por isso, boatos não faltavam. Ele não queria se decepcionar, com uma esperança baseada em boatos! Por isso sua postura cética: Quero ver! Quero tocar! “Se eu não vir a marca dos pregos em suas mãos, se eu não puser o dedo nas marcas dos pregos e não puser a mão no seu lado, não acreditarei” (Jo 20,25).

Claro que depois das várias manifestações; depois que muitas pessoas, em diferentes lugares e situações relataram o encontro com Jesus Ressuscitado, a fé foi nascendo, foi se alastrando, foi superando a dúvida, foi se convertendo em certeza: De fato, ressuscitou!

Somente depois de algum tempo; depois de várias manifestações perceberam: tudo que ele havia falado começa a ganhar sentido. O que Ele fizera começa a ser compreendido… somente então a incredulidade e a dúvida abrem espaço para a fé. Aí, então, já não era mais necessária a postura de Tomé: quero ver! Só então passa a ser verdade a afirmação de Jesus: “Bem aventurados os que acreditaram sem ter visto!”

A partir disso, os seguidores fazem-se verdadeiros discípulos (At 2,42-47). A partir disso, os discípulos tornam-se anunciadores. A partir disso, os anunciadores levaram a sério as palavras do mestre e, por esse motivo, começaram a se reunir nas casas e nas casas partiam o pão, como ele havia ensinado: Com alegria! “Todos os que abraçavam a fé viviam unidos e colocavam tudo em comum” (At 2,44).

Somente então os ensinamentos do Mestre passaram a ter sentido (1Pedro 1,3-9). A partilha passou ter sentido. A solidariedade passou a ter sentido… e a própria vida ganhou sentido, pois deixou de ser uma sucessão de dores, tornando-se estrada para o encontro com o Mestre que, morrera sim, mas que estava vivo a abria as portas para que as pessoas pudessem “nascer de novo, para uma esperança viva”; e, dessa forma, em todos os tempos, aqueles que nele depositam sua fé entram na estada da vida… e vida definitiva.

No cotidiano ainda podem ocorrer momentos de dor e sofrimento e aflições e provações. Entretanto, a fé que se desenvolveu, depois dos encontros com o Ressuscitado, ressignificou tudo. “Isto é motivo de alegria para vós, embora seja necessário que agora fiqueis por algum tempo aflitos, por causa de várias provações” (1Pd 1,6). A experiência das dores não diminuía a consciência do apoio divino para superá-las: se Deus havia ressuscitado Jesus, pode fazer o mesmo com aquele que crê. “Sem ter visto o Senhor, vós o amais. Sem o ver ainda, nele acreditais. Isso será para vós fonte de alegria indizível e gloriosa” (1Pd 1,8).

E assim voltamos à postura de Tomé. Quer dizer que ele, por ter sido cético, não foi agraciado com a glória eterna? Pelo contrário, ele ensinou uma lição: cuidado com os boatos!

Sua atitude não foi um ato de incredulidade, mas de ceticismo. Ao se deparar com o Senhor vivo, eliminou a postura cética e confessou, como todos os demais: “Meu Senhor e meu Deus!” (Jo 20,28). Ao manifestar sua fé permitiu que Jesus desse uma orientação final: a afirmação da bem-aventurança para quem aderir à fé, mesmo sem tê-lo encontrado pessoalmente: “Bem-aventurados os que creram sem terem visto!” (Jo 20,29).

Nisso está o grande salto para a fé cristã. Não se trata de ver o Senhor, para ter fé. Não se trata de pedir milagres, para ter fé. Não se trata de receber graças pessoais, para ter fé. Não se trata de seguir os charlatães, para te fé. Trata-se de amar ao Senhor sem tê-lo visto, e como os primeiros cristãos, desenvolver a postura solidária com aqueles que vemos e dos quais conhecemos as dores.




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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