segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

Natal – Uma Luz surgiu

(Reflexões baseadas em:Isaías 9,1-6; Tito 2,11-14; Lucas 2,1-14)



Cada um de nós já deve ter passado pela experiência do medo e da da escuridão. Muitos ainda têm medo do escuro. O escuro, com toda certeza, é uma das piores sensações; a sensação de uma quase completa impotência, insegurança... Daí o medo! Mas o natal é luz e a luz ilumina as trevas e dissipa a escuridão.

A liturgia do Natal nos vem alentar: “Uma luz resplandeceu”,diz Isaías (9,1-16) e ela pode mudar tudo. Uma luz que orienta todo o povo que está “aguardando a feliz esperança”, diz Paulo, escrevendo a Tito (2,11-14). Assim é o Natal: os que andam nas trevas do medo e alimentam a esperança “a glória do Senhor os envolveu em luz”, como aos pastores, nos informa Lucas (2,1-14).

Então, se durante o advento os cristãos fazem o propósito de se reconhecer pecadores, causadores de sofrimentos, geradores de exclusão…. As luzes do Natal são o último convite para abandonar a escuridão da maldade e abraçar a luz de uma nova sociedade.

Entretanto, se pra nós o Natal se resume a troca de presentes, comilanças e bebedeiras, compra e venda… é porque ainda não entendemos o espírito do Natal. E, nesse caso, mesmo diante da luz de Jesus, ainda estaremos andando nas trevas.

Então vamos olhar com um pouco mais de atenção a cena do Natal. Quem são os personagens aí estão presentes?

O personagem central é o recém-nascido. Ao redor dele gravitam os demais. Os anjos, evidentemente, pois são eles que anunciam o nascimento. Os pastores, pobres e marginalizados, para os quais não há lugar nem na estrebaria, junto aos animais e por isso pernoitam no campo, ao lado do rebanho. Como a cena é de um nascimento, o José e Maria também são personagens e também marginalizados, pois tiveram que colocar o recém-nascido a dormir num cocho. (As pessoas se acostumaram a dizer manjedoura, mas uma manjedoura é o objeto no qual os animais comem, é o prato dos animais. O prato dos animais, portanto, é o cocho).

Devemos notar que os pais do recém nascido são vítimas do sistema e não da falta de hospedagem. Estão nessa localidade, fora de sua morada, não por vontade própria, mas por exigência do sistema. A exigência do recenseamento foi que atraiu muita gente à cidade e por isso faltou alojamento. José é Maria não foram rejeitados por maldade dos hoteleiros, mas porque o sistema obrigou muita gente a se deslocar. Como “Todos iam registrar-se cada um na sua cidade natal” (Lc 2,3), José e Maria, da mesma forma que muitos outros, chegaram a Belém. Por esse motivo “não havia lugar para eles na hospedaria” (Lc 2,8). O sistema romano, portanto, é outro personagem, não presente no local, mas o verdadeiro causador da situação de desconforto de toda a população e da família sagrada em particular.

Quando analisamos os personagens envolvidos na cena do Natal, percebemos: com exceção do anjo, todos os outros são vítimas do sistema romano. Não vemos nessa cena nenhum rico. Nenhum político. Nenhum dos sacerdotes do templo… só os marginalizados e vítimas do sistema.

Para essas vítimas nasceu o Salvador. Em favor das vítimas do sistema, “o povo, que andava na escuridão”; os “que habitavam nas sombras da morte”; aqueles sobre os quais pesava “o jugo que oprimia o povo”… todas essas vítimas viram “uma grande luz”; sobre eles “uma luz resplandeceu”. Para realimentar a esperança “nasceu para nós um menino, um filho nos foi dado”.

Então o que é o Natal?

Com certeza não são as festas, as comilanças, as bebedeiras; nem são os presentes, menos ainda as luzes pisca-piscando nas lojas… não é o comércio… tudo isso, faz parte do sistema: hoje o sistema econômico que produziu e continua produzindo as famílias desalojadas, dor e fome.

Natal tem a ver com o começo de um novo tempo. Uma nova vida. Uma nova sociedade em que as relações acontecem não para privilegiar o sistema, mas para dar vida e luz aos marginalizados. Tem a ver com uma criança que nasceu há 2000 anos, mas que é um sonho criança, nascendo ainda hoje. Não para gerar riquezas e privilégios, mas para valorizar os que são desvalorizados. Tem a ver com a consolidação da justiça em favor dos desvalidos. Tem a ver com o anúncio do anjo: “Não tenhais medo! Eu vos anuncio uma grande alegria, que o será para todo o povo: Hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador, que é o Cristo Senhor” (Lc 2,10-11).

Temos que nos perguntar: que é, para mim, o Natal? Troca de presentes ou compromisso em transformar a sociedade que produz e mantém os marginalizados?Uma Luz iluminando uma nova vida ou um reforço para que eu continue alimentando as trevas e ampliando a escuridão?




Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

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