(Reflexão a partir de: Est 5,1b-2;7,2b-3; Ap 12,1.5.13a.15-16a; Jo 2,1-11)
As palavras de Ester (Est 5,1b-2;7,2b-3) em resposta ao Rei, nunca foram tão atuais como nos dias em que estamos vivendo: “concede-me a vida e a vida de meu povo” (Est 5,13).
O pedido de Ester em favor do povo, foi atendido.
Mas não é só isso.
Também no livro do apocalipse (Ap 12,1.5.13a.15-16a) temos uma cena emocionante: a mulher que “deu à luz um filho homem, que veio para governar todas as nações” (Ap 12,5) está em risco de vida, juntamente com seu filho. Pois uma serpente do mal a quer destruir. Mas a terra vem em socorro de ambos.
Cotidianamente o justo, e todo aquele que pratica o bem, enfrenta dificuldades, opositores, perseguições… Nestes dois casos, Ester e Apocalipse, houve quem defendesse o oprimido: Ester intercedeu pelo povo escravisado e a terra socorreu a mulher e seu filho, contra a serpente do mal.
Assim como Ester, a mulher do Apocalipse representam vida. A vida do povo está em risco e algo ocorre em defesa dessa vida e desse povo.
Ester vestiu-se com um lindo vestido, para encontrar o rei e interceder em favor de seu povo. A mulher do apocalipse vestiu-se de sol para gerar nova vida. Ambas retratam a força e a ação da mulher brilhante que gera vida nova em seu ventre; ambas intercedem por seu povo e, ao mesmo tempo, mostram como Deus executa seus propósitos. Ou seja, Deus usa aqueles que parecem fracos para dar uma demonstração de força libertadora. A aparente fragilidade da mulher é a força libertadora de Deus. Na aparente fragilidade da mãe está germinando, sendo gestada, ganhando forma a graça libertadora da vida, dom de Deus.
Além disso, essas duas mulheres de aparência frágil, mas de grandes e poderosas realizações, podem ser associadas a Maria, mãe de Jesus. Ela também intercede em defesa dos necessitados. É a figura da Mãe Intercessora, advogada nossa, como reza o católico na “Salve Rainha”
A narrativa de João (Jo 2,1-11), fala da alegria de uma festa de casamento. Essa narrativa nos mostra a atuação de Maria, a mãe intercessora, desempenhando um papel fundamental. Evita um vexame para os noivos e salva a festa, para manter a alegria. Os convidados estavam sem bebida. Com a visão de conjunto, típica da mulher, da mãe, da pessoa solidária, ela aciona o filho: “Eles não têm mais vinho” (Jo 2,3); e também aciona os trabalhadores que servem às mesas: “Façam tudo que ele vos disser!” (Jo 2,5). Age na simplicidade, e na simplicidade de quem sabe o que faz, deixa os atores desempenharem seus papéis.
E assim, mais uma vez temos a figura de uma mulher intercedendo em favor de quem enfrenta dificuldades. E, neste caso, para dizer algo a mais: o casamento é algo tão importante que foi aí que Jesus realizou seu primeiro sinal. A alegria da festa, sintetiza a entrega mútua. A comunidade bebendo, comemorando, exerce o papel da testemunha que celebra junto o ato do compromisso.
Tudo isso ajuda a entender a festa dedicada a Nossa Senhora que apareceu entre as redes dos pescadores, numa comunidade pobre do interior paulista. Evidentemente o centro da celebração é Jesus Ressuscitado, mas também exalta a mãe intercessora. Nascia naquela pescaria a certeza de que Deus estava se manifestando em favor dos pobres. Naquela imagem escura e quebrada manifestava-se o simbolo do dom de Deus assumindo a causa dos escravizados.
A imagem de cor escura passa a ser, ao mesmo tempo, um grito contra as dores do povo, contra o sofrimento provocado pelos donos do poder. É, também uma confissão de Deus e da mãe de Deus afirmando que não apoiam aqueles que provocam as dores e sofrimentos do povo, mas, pelo contrário, apoiam o pequeno em busca de seus direitos de uma vida plena. É Deus e a mãe de Deus dizendo que a terra veio em defesa do sofredor, como no apocalipse; e que, pela intercessão da mulher-mãe, o pobre não mais está abandonado à própria sorte.
Talvez, por tudo isso, foi que o dom de Deus inspirou o poeta (pe Zezinho) a cantar:
“Quero lembrar os fatos que aconteceram naquele dia; quando por entre as redes, aquela imagem aparecia; vendo surgir das águas a tosca imagem de negra cor; agradeceram todos à Mãe de Cristo por tanto amor;
Quero entender o culto que começou, desde aquele dia; muitos não compreendem, dizendo ser uma idolatria; mas neste simbolismo daquela imagem, de negra cor; chega-se com Maria ao santuário do Salvador;
Torno a lembrar os fatos que agora tocam a tanta gente; esta Senhora humilde, de cor morena, se fez presente; numa nação, aonde imperava a mancha da escravidão; Nossa Senhora escura nos diz que o Cristo nos quer irmãos;
Hoje, que eu vejo gente voltar contente de Aparecida; penso na minha Igreja com os pequenos comprometida; penso nas diferenças que ainda ferem o meu país; peço que a Mãe do Cristo conduza o povo ao final feliz”
E chegaremos ao final feliz? Não como nos contos de fada, em que um gesto heroico e quase mágico elimina o mal. Não será assim, pois o mal está entre nós, muito bem plantado e cresce pela boca dos que blasfemam dizendo defender a deus mas seu deus é a riqueza acumulada de forma suspeita; dizem defender o povo, mas corroem os direitos sociais e o condenam à miséria crescente; dizem defender a nação, mas cultuam valores de outros povos; falam sobre família, mas são adúlteros, estupradores, feminicidas…
Chegaremos ao final feliz! Para isso basta apenas que os caminhantes do Reino percebam-se como vítimas do sistema e assumam sua posição. Para isso, uma coisa só é necessária: ouvir a mãe falando: “Façam tudo que ele vos disser!” (Jo 2,5).
Neri de Paula Carneiro
Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador.
Outros escritos do autor:
Filosofia, História, Religião: https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro;
Literatura: https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro.
Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador.
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