Quem deve ser convidado para uma festa de casamento?
Essa parece ser a pergunta central, colocada pelo Evangelho segundo Mateus (22,1-14), na liturgia deste vigésimo oitavo domingo do tempo comum.
Estamos numa situação festiva. O rei esta preparando a festa para o casamento de seu filho (Mt 22,2). Emitiu os convites (Mt 22,3). Mas os destinatários recusaram ou desdenharam do convite e foram se dedicar a outros afazeres (Mt 22,4-6).
Entretanto o casamento e a festa não poderiam deixar de acontecer apenas porque os principais convidados não compareceram; ou não foram “dignos” de estar presente (Mt 22,8). Então o rei, abre as portas e convida outras pessoas (Mt 22,9-10) e a festa acontece.
E não é qualquer festa. Trata-se de uma festa de casamento. E nisso estão presentes dois elementos importantes: primeiro a alegria de conviver e comemorar, ou seja o fato de estar juntos na alegria pode ser visto como um sinal do paraíso, que é a felicidade plena. A comemoração tem relação com a saciedade e a convivência diz respeito à vida em comum; em segundo lugar, o fato do casamento. Não se trata apenas da alegria da vida em comum ou de estar juntos. O casamento diz respeito à corresponsabilidade do ser humano no projeto da criação. Casamento não é só um homem e uma mulher se entregando por amor, mas é Deus compartilhando com as pessoas a responsabilidade pela continuação da vida. O casamento, portanto é uma extensão da obra criadora de Deus, sendo prosseguida pela complementariedade das pessoas que se entregam. A festa, portanto, é um sinal do amor de Deus manifestando-se entre as pessoas.
Por causa dessa vida em comum que é um prenúncio do paraíso e da complementariedade da obra da criação, presente no casamento foi que o rei, da parábola, fez questão de que sua sala de festas estivesse repleta de convidados. Por isso, a insistência para que seus servidores saíssem às ruas convidando a todos para se fazerem presentes.
Esse convite nos é feito pelo próprio Deus, como o demonstra Isaías (25, 6-10a). É o convite para o paraíso. Para um encontro definitivo, com o Senhor, ocasião em que ele “eliminará para sempre a morte e enxugará as lágrimas de todas as faces” (Is 25,8). Trata-se de um convite “para todos os povos” participarem de “um banquete de ricas iguarias”. Nessa festa não haverá sofrimento, pelo contrário, haverá “um banquete de ricas iguarias, regado com vinho puro” (Is 25,6).
O critério, ou a porta de entrada, para a participação nessa festa é a solidariedade. O ingresso para a festa definitiva é a atenção à necessidade do outro. É o que sugere Paulo (Fl 4,12-14.19-20). Ele, ao suportar as dificuldades, ensina como sobreviver pois a força está não nas coisas que se pode ter, mas naquele que dá a força: “tudo posso naquele que me dá forças” (Fl 4,13). A importância da solidariedade, ensina o apóstolo, é porque quem partilha com quem precisa, recebe de Deus a recompensa: “Fizestes bem em compartilhar as minhas dificuldades” (Fl 4, 14). Àquele que se solidariza “Deus proverá esplendidamente com sua riqueza a todas as vossas necessidades, em Cristo Jesus.” (Fl 4,19).
E assim voltamos à festa oferecida pelo Rei. Uma festa para a qual todos foram convidados e deram as mais divergentes respostas, recusando ao convite. Mas o fato é que o rei encheu sua sala de festas.
E aqui surge um episódio intrigante. Depois de tanto insistir para que a sala estivesse repleta de convidados, parece estranha a atitude do rei mandando retirar da festa aquele que ali se encontrava “sem o traje de festa” (Mt 22,11-12).
Para entender isso, precisamos de um pouco de atenção. Todos são convidados. Todos entram na sala de festa. E só depois, durante a festa, é que o rei se dirige àquele sem o devido traje. E depois de interpelar o convidado o rei o manda retirar da sala (Mt 22,13). Por qual motivo?
Aparentemente a expulsão ocorre pela ausência do traje adequado. Mas se os convidados estavam pelas “encruzilhadas dos caminhos” (Mt 22,9), seguramente também não trajavam roupas de festa. Então o que ocorre?
Ocorre que o rei interpela o convidado. Mas este não tem resposta. O rei pergunta: “Amigo, como entraste aqui sem o traje de festa?” (Mt 22,12). A ausência do traje foi o motivo do questionamento. Mas diante da pergunta, o convidado nada responde. Se não ocorreu a resposta não aconteceu interação. E se não ocorre interação, entre os convidados, a festa perde o sentido.
A festa é para todos os povos, diz Isaías (25,6). Mas antes da festa, no cotidiano, deve ocorrer a partilha solidária, diz Paulo (Fl 4,14). Faltando isso, falta interação. E se falta interação, não ocorre a alegria da festa, nem a participação e compromisso com o projeto da criação. A ausência desse comprometimento produz a escuridão e o choro pelo vazio da existência.
Neri de Paula Carneiro
sexta-feira, outubro 09, 2020
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