quinta-feira, 30 de julho de 2020

Vinde

O que Deus está nos propondo neste 18º domingo do tempo comum?

A resposta, se a quiséssemos de uma forma rápida e simplificada, seria dizer que o Senhor nos apresenta uma descrição do Reino de Deus, instalado entre os seres humanos.

Mas, a curiosidade humana nos leva a perguntar: em que consiste esse Reino?

Essa resposta foi-nos apresentada ao longo dos três domingos precedentes, nos quais líamos o capítulo 13 de Mateus. Ali Jesus nos descrevia o Reino, mediante parábolas.

Agora a liturgia nos convida a um passo a mais. Nos convida a olhar por dentro do Reino apresentado por Jesus.

Como sempre, trata-se de uma proposta. É como se Deus dissesse: “Isto é o que tenho para lhe oferecer!” Esta proposta vem na forma de uma ilustração do Reino! É como se olhássemos o Reino por dentro, depois dele consumado, instalado, entre nós.

Aos que aderem a essa proposta, Paulo, na carta aos Romanos (8,35.37-39), apresenta a força dessa promessa, com uma pergunta: “Quem nos separará?” (Rm 8,35). Aqueles que aderem à proposta, mesmo passando por dificuldades, perseveram, pois “Em tudo isso, somos mais que vencedores, graças àquele que nos amou!” (Rm 8,37). Jesus é a força e nos dá força para perseverarmos; para nos mantermos fiéis ao Reino.

Àqueles que ainda estão em dúvida, Isaías (55,1-3) convida: “Vinde” (55,1.3). Diante da sede ou da fome o profeta apresenta o convite do Senhor: “vinde às águas; vós que não tendes dinheiro, apressai-vos, vinde e comei, vinde comprar sem dinheiro, tomar vinho e leite, sem necessidade de pagamento” (Is 55,1).

Notemos que o apóstolo e o profeta nos apresentam um primeiro retrato do Reino: superação das dificuldades e satisfação das necessidades.

É claro que cada um de nós, individualmente, pode se recusar a entrar nesse Reino. Mas para aqueles que aderem à proposta, que respondem “Sim, eu vou”, “Sim, eu quero”, o Reino nos é apresentado em sua plenitude.

Aos que aderem à proposta do Reino, Paulo diz que nada “será capaz de nos separar do amor de Deus por nós” (Rm 8,39). E isso por um motivo simples e quase evidente: Deus não quer que ninguém se perca; Deus não quer o sofrimento; Deus não quer as dificuldades. A proposta do Reino é superação e satisfação plenas e de forma definitiva.

Mesmo que enfrentemos as piores dificuldades, e o apóstolo faz uma breve lista delas, “Tribulação? Angústia? Perseguição? Fome? Nudez? Perigo? Espada?” (Rm 8,35), Deus nos dará a força necessária para a superação e, antecipadamente, já podemos comemorar a vitória, pois “em tudo isso, somos mais que vencedores, graças àquele que nos amou!” (Rm 8,37).

Nascemos para a vitória sobre os dissabores, neste mundo; e na instalação do Reino receberemos as recompensas. Por isso, o profeta insiste no convite do Senhor: “Inclinai vosso ouvido e vinde a mim, ouvi e tereis vida; farei convosco um pacto eterno” (Is 55,3)

Outra amostra do Reino é a prática de Jesus, como nos mostra Mateus (14,13-21). Ele tem “compaixão” (Mt 14,14) e por isso cura e dá o alimento (Mt 14,19), com fartura (Mt 14,20).

Mas qual é a novidade desta imagem do Reino?

Talvez o fato de que sua instalação depende de nós! Talvez por isso sua apresentação em algumas etapas: a primeira é o fato de ser gratuito, é dom. Deus o oferece gratuitamente. Mas é um dom que tem que ser buscado: as multidões “saíram das cidades e o seguiram” (Mt 14,13). Certamente muitas outras pessoas havia nas cidades, e não seguiram Jesus, nem foram por ele curadas nem alimentadas. Mas quem o buscou recebeu o que buscava. Ou seja, o Reino está à nossa disposição, mas nós temos que desejá-lo, seguindo o mestre. Ele é dado para aquele que o procura.

Outra etapa é o fato de que o reino se instala pela mediação humana. Evidentemente Jesus poderia ter alimentado a multidão com seus próprios meios divinos. Mas à multidão faminta, Jesus envia os discípulos. Por seu lado, querendo desfazer-se do problema, os discípulos pretendem dispensar a multidão: “Este lugar é deserto e a hora já está adiantada. Despede as multidões, para que possam ir aos povoados comprar comida!” (Mt 14,15).

Outro aspecto está no fato de Jesus mostrar que a solução dos problemas não ocorre pela sua rejeição ou quando o passamos adiante, para que outro resolva. O reino exige comprometimento com o outro. Por isso Jesus não aceita a solução fácil e diz aos discípulos: “Eles não precisam ir embora. Dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mt 14,16). Mas tem outro ingrediente: é necessário dar o que se tem. Era quase nada, mas havia algo a oferecer: “Só temos” (Mt 14,17).

A próxima etapa é o fato da organização. “Jesus mandou que as multidões se sentassem na grama” (Mt 14,19). Na balbúrdia e cada um buscando seu próprio interesse, não há possibilidade de se alcançar o bem comum. A multidão, organizada e buscando objetivos comuns, torna-se Igreja.

Havendo busca, por parte do ser humano, havendo a mediação de uns intervindo em favor de outros, havendo comprometimento e organização, o passo seguinte é a oração. Tendo o povo se organizado, concretiza-se a imagem definitiva do reino. Aí, então, Jesus “pronunciou a bênção. Em seguida partiu os pães” (Mt 14,19).

A supressão das dificuldades, o compromisso com o outro, é o objetivo. E, àquele que busca, o Senhor convida: pelo profeta “Vinde”; pelo mestre “Vinde benditos de meu pai” (Mt 25,34).

Neri de Paula Carneiro

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