(Reflexões
a partir de Isaías
52,7-10;
Hebreus
1,1-6; João
1,1-18)
Estamos
tão acostumados a celebrar o Natal a partir daquelas belas
encenações, normalmente preparadas pelos jovens da comunidade, que
quase
não nos
damos conta de que o Natal não
se explica pela
gruta, pelos
anjos,
pelos
pastores,
pela
visita dos três
magos… isso
faz, parte, mas isso não é o Natal.
O
Natal vai além. Como
o demonstram Isaías (52,7-10)
e
o autor da carta aos Hebreus
(1,1-6). O
Natal é um período fundamental para a liturgia e uma época
propícia para acolhermos
a Luz divina. E,
consequentemente, para nos iluminarmos não só com bons propósitos,
mas renascendo para uma nova vida.
Se
quiséssemos comparar o ano litúrgico a um veículo, poderíamos
dizer que Natal e Páscoa
são os dois conjuntos de pneus que fazem com que o veículo da
liturgia trafegue ao longo do ano litúrgico. O
Natal são os pneus da frente e a Páscoa são os pneus traseiros. O
veículo do ano litúrgico não trafegaria sem que ambos estivessem
interligados,
um existe em função do outro.
Mas
não só o ano litúrgico. O mistério de nossa fé cristã também
depende desses dois eventos: a Encarnação, no Natal e a Paixão, na
Páscoa. E as duas celebrações nos demonstrando
o
amor
especial que Deus
tem para
conosco.
Tanto que enviou seu Filho (Natal) para nos resgatar com seu sangue
na cruz (Páscoa).
Pensando
em tudo isso é que celebramos a solenidade
do Natal,
em
um
clima de anunciação, como
ensina Isaías:
“Como
são belos sobre as montanhas os pés do mensageiro que anuncia a
felicidade, que traz as boas novas e anuncia a libertação”, (Is
52,7).
Uma
anunciação que tem um dom de presença, uma
vez que depois
de ter falado pelos profetas, no mento presente Deus nos fala
mediante Jesus que faz história ao nosso lado: “Muitas vezes e de
diversos modos outrora falou Deus aos nossos pais pelos profetas.
Ultimamente nos falou por seu Filho” (Hb, 1,1-2). O
Filho
que é o próprio Deus Encarnado, Deus
conosco, Deus entre nós, Deus com nossa cara...
E
se observarmos bem, notaremos que tanto a mensagem de Isaías como a
da carta aos Hebreus, nos propõem: um clima de festividade; um clima
de anúncio da presença de Deus entre nós; um
clima de vitória de Deus; um
clima de adoção, pelo qual o Senhor nos assume como filhos.
Mas
esse clima festivo, que se concretiza na noite natalina tem, também,
um tom de denúncia, como sugere o prólogo de João (1,1-18)
O
clima é de festa, sim, pois “O
Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos sua glória, a
glória que o Filho único recebe do seu Pai, cheio de graça e de
verdade” (Jo 1,14).
Entretanto,
apesar desse clima festivo; apesar
de
temos motivos para festejarmos, pois Deus nos deu um presente que é
seu próprio filho, João nos faz um alerta-denúncia. O filho veio a
nós, é verdade, mas em muitos casos e situações Ele
é
rejeitado: “Veio para o que era seu, mas os seus não o receberam”
(Jo 1,11). “Como
não o recebemos?” dirão alguns. Ocorre que o Senhor, mesmo depois
de dois mil anos, continua sendo rejeitado. Principalmente nas festas
e comilanças natalinas, pois vamos para a festa de aniversário, mas
nos esquecemos do aniversariante!
O
evangelista
faz outra afirmação: mostra que o mundo é obra do Verbo Encarnado;
mostra
que Ele, não só estava junto a Deus, desde o princípio, mas que o
Verbo/Palavra era Deus e justamente a Palavra de Deus é a origem de
tudo que existe (Jo 1,1-30).
Ou seja: tudo
que existe origina-se em Deus; o que existe nasceu da Palavra de
Deus; a Palavra Criadora de Deus é vida e luz para as pessoas (Jo
1,4).
E
aqui está
mais um problema,
denunciado por João: o sentido e significado da luz é resplandecer
e iluminar os caminhos, eliminando as trevas. Mas aqueles que andam
nas trevas recusam-se a recebê-la e não se deixam envolver pela Luz
divina. Eles
não
compreendem a grandeza da Luz (Jo 1,5). Não
percebem o
alcance da vida
e
que a vida é
a Luz.
E
por
não se darem conta disso aqueles que andam nas trevas também não
se dão conta da grandeza da afirmação de que “O Verbo se fez
carne e habitou entre nós” (Jo 1,14).
Só
entendendo isso é que entenderemos o sentido do Natal, que vai além
do presépio. Vai além dos magos e pastores e gruta… A encarnação
do Verbo/Palavra/Luz tem a força de um gesto que só pode ser
divino: o fato de Deus fazer-se uma pessoa humana, a fim de levar
todos os humanos a Deus. Mas para isso é necessário seguir os
passos e fazer o que Jesus fez e ensinou.
Esse
é o significado da resplandecência do Natal: mostrar a todas as
pessoas o caminho para Deus. Podemos até iluminar nossas casas e
ruas e lojas com luzes coloridas; podemos até trocar presentes e
desejar “feliz natal”; podemos até participar de alguma
celebração natalina… Mas o que realmente conta para se
concretizar o Natal é
a adesão a um projeto transformador da pessoa e da sociedade, para
a construção de um mundo feliz…
e
não só de uma “noite feliz!”
O
mundo melhor, os dias melhores os cumprimentos e tudo que fazemos ao
redor do dia de Natal só tem sentido na medida em que passamos a
fazer as obras daquele que é o próprio significado da festa. Ao
fazermos suas obras daremos demonstração de que estamos recebendo o
Verbo Encarnado nele cremos e “a
todos aqueles que o receberam, aos que creem
no seu nome, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus” (Jo
1,12).
Neri
de Paula Carneiro.
Mestre
em educação, filósofo, teólogo, historiador
Outros
escritos do autor:
Filosofia,
História, Religião:
https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro;
Literatura:
https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro.