(Reflexões baseadas em: Daniel 7,13-14; Apocalipse 1,5-8; João 18,33b-37
A literatura apocalíptica não se resume ao livro do Apocalipse. Esse gênero literário nasceu no Antigo Testamento. Está presente nos profetas, como Daniel. Mas também existem trechos apocalípticos nos evangelhos, como em Mateus e em trechos das cartas, como as de Paulo.
Quando lemos um trecho apocalíptico, a primeira imagem que nos vem é o que popularmente chamamos de “fim do mundo”. Isso se deve à natureza simbólica desses escritos, descrevendo cenas, aparentemente assustadoras, como estes dois versículos de Daniel (7,13-14).
Quando lidos isoladamente ou sem olharmos para o conjunto de onde eles foram retirados, podem parecer estranhas expressões como: “visão noturna”; filho de homem entre nuvens do céu; “ancião de muitos dias”; “poder eterno”, “reino que não se dissolverá”… Mas isso não deve ser causa de medo e sim de esperança.
Esperança?
Sim. Pode parecer estranho, mas as cenas de Daniel nos falam de esperança!
Este trecho de Daniel está inserido num contexto em que o profeta fala ao seu povo sofredor…. E pecador! Nos versículos anteriores aparecem sinais do sofrimento: a descrição de alguns monstros que massacram ao povo. São os reis e reinos inimigos. Entretanto, o incrível é que, em meio a todos os sofrimentos aparece não um monstro a mais, mas um “Filho de Homem”.
E não se trata de uma pessoa qualquer. É alguém poderoso. Ele tem “poder, glória e realeza”. Ele domina “todos os povos, nações e línguas”. E o melhor de tudo: seu “reino não se dissolverá”. Estamos diante, portanto, de um personagem poderoso cujo reino será eterno!
Então, se num primeiro momento temos a impressão de catástrofe, prestando atenção nesse “Filho de Homem” veremos que ele representa o oposto ao sofrimento: ele traz a vitória sobre as dores! A superação dos sofrimentos! Ele representa a esperança! Uma alternativa aos pecados do povo e a vitória contra os opressores do povo!
A questão é saber: quem é esse Filho de Homem com poderes definitivos, absolutos, eternos?
Por tradição sabemos a resposta: é Jesus.
O livro do apocalipse (1,5-8) o apresenta como “a testemunha fiel, o primeiro a ressuscitar dentre os mortos, o soberano dos reis da terra”. E diz mais: “Ele vem com as nuvens, e todos os olhos o verão”, pois ele é o “Todo Poderoso”. Ele é o Rei do Universo! Ele veio para dar início a um tempo de paz, justiça, fraternidade, respeito e amor entre as pessoas…
Então, se Jesus, aquele em quem dizemos acreditar, é todo poderoso e tem poderes até mesmo sobre a morte, o que pode nos assustar? O que temos a temer? Se cremos nele e se sabemos que nos ama, qual a causa do medo se “por seu sangue nos libertou”…?
O tal medo do “fim do mundo” só se justifica se não estivermos conduzindo nossa vida em sintonia com o projeto desse Filho de Homem, de Jesus, Rei da esperança! Rei da Salvação! Rei do Universo!
E isso, quem afirma, não são outros quaisquer, mas o próprio Jesus. Dialogando com Pilatos (Jo 18,33-37), faz-se reconhecer como rei. Ou seja, deixa-se reconhecer como Senhor do mundo.
Jesus é claro e definitivo: “Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz”.
Para sabermos a respeito de quê Jesus está falando, basta olharmos sua trajetória de vida. Em todos os seus passos posicionou-se em defesa da vida, dos fracos, dos desamparados, dos excluídos, dos doentes… dos sem voz e sem vez…. e disse a seus seguidores que o caminho para seu reino é seguir seus passos. E seguir seus passos ou “escutar sua voz” é, também, fazer uma opção de classe. Seguir a Jesus é saber que a vitória final está garantida, mas ela passa pela cruz!
Mais ainda, seguir os passos de Jesus, “ouvir sua voz” não é algo que depende dos outros. Pilatos quis saber se Jesus era Rei, mas foi questionado por Jesus: quer saber isso por si mesmo ou por outros? Se nosso interesse por Jesus é obra de outros, deve-se ao que “se fala por aí”, ele pode até atrair nossa admiração. Podemos até vê-lo como uma pessoa interessante. Mas isso não leva a optar pelo seu seguimento, tendo-o como Mestre.
Daí a importância de nossa opção. Daí a necessidade de nos questionarmos: aderimos a Jesus e sua proposta do Reino porque acreditamos nisso? ou porque aprendemos na catequese? ou porque é tradição em nossa família … indaguemos de nós mesmos: “frequento a comunidade, vou à missa, às celebrações...por que realmente tenho fé ou por que tenho medo da danação eterna? Para respondermos com mais propriedade, temos que saber o que realmente é o seguimento e o quais são as artimanhas do “outro”.
Portanto, temos que saber: seguir os passos de Jesus não é apoiar a maldade. Não é apoiar quem explora os mais fracos. Não é apoiar o armamentismo ou ostentar a posse de armas. Não é zombar das dores do povo. Não é explorar os trabalhadores nem criar leis que os prejudicam. Não é usar a religião, ou qualquer outro poder para auferir vantagens pessoais … essas, entre outras, são posturas do adversário!
Mas se nossa fé, nossa esperança, nosso compromisso comunitário... brotam de uma adesão pessoal, então Jesus não é nem inimigo nem adversário, é nosso Rei. Se o que ele realizou em favor dos excluídos, nos encanta, então ele é o salvador, motivo de esperança. Se ele é o centro de nossa fé, então ele é alguém a ser seguido, embora seja um seguimento que estabelece condições: ajudar no testemunho da verdade. Desmascarar aqueles que desejam se passar por messias atuais, pois eles sim são causadores de morte e sofrimento.
Seguir o Cristo Rei é, também, dar testemunho da verdade, na esperança de instalar o reino que não se dissolverá. O reino da vida!
Neri de Paula Carneiro.
Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador
Outros escritos do autor:
Filosofia, História, Religião: https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro;
Literatura: https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro.
Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador
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