quinta-feira, 15 de abril de 2021

Filosofia: o senso comum e o mito

Conhecer e produzir conhecimento é possível. E isso está intimamente relacionada com a filosofia que se caracteriza como uma atitude pela qual o ser humano busca novos conhecimentos.

Da mesma forma que a ciência, a filosofia tem como finalidade ampliar os conhecimentos existentes e essa ampliação é uma forma de produção. Na produção dos conhecimentos ocorre o processo da inovação e essas são atribuições da Filosofia e das Ciências. Entretanto, embora ande junto, a filosofia vai além da ciência. Enquanto a ciência demonstra o saber apontado pela filosofia, esta desenvolve um processo de crítica do conhecimento estabelecido pela ciência procurando determinar a legitimidade e a veracidade desse saber.

Com base nisso podemos dizer que uma das questões centrais da filosofia é o problema do conhecimento que caminha ao lado da possibilidade de acesso à verdade. Isso posto, precisamos ter em mente que a preocupação com o conhecimento não é exclusividade da Filosofia nem da Ciência. As pessoas se apropriam do saber pelo senso comum, pelos mitos, pela religião e, obviamente, por meio da filosofia e da ciência. A filosofia é a base do conhecimento científico, mas antes da filosofia e da ciência as pessoas interpretam o mundo e todas as realidades a partir do senso comum.

O senso comum, o ponto de partida para qualquer tentativa para explicar o que ainda é inexplicável, cria argumentos e se transforma em conhecimento e, nesse processo, deixa de ser senso comum para converter-se em mito, em religião, em filosofia ou ciência. Como, então, se caracteriza cada uma dessas modalidades de conhecimento no qual o senso comum transforma-se em mitos, religiões, filosofias e ciências?

Qual é o ponto de partida para o conhecimento? O medo do desconhecido. Se levarmos em conta que o desconhecido é assustador somos levados a afirmar que o medo impulsiona a busca pelo conhecimento e este confere poderes sobre o desconhecido. No processo do saber, o desconhecido assustador exige uma resposta. A primeira alternativa é encontrar meios de superar o medo. Essa alternativa vem do senso comum e dos mitos.

O senso comum que antecede a filosofia e a ciência, também está na base do conhecimento mítico e religioso. Qualquer realidade que se apresente ao intelecto passa, antes, pelo senso comum, pelo conhecimento comum.

Trata-se daquele conhecimento que todas as pessoas possuem, a respeito de um determinado fato ou fenômeno. Arcângelo Buzzi, no livro “Introdução ao pensar” explica o senso comum, dizendo que é “A interpretação ou a racionalidade que surge da necessidade de enfrentar fatos imediatos, da necessidade de resolver problemas propostos por interesses os mais diversos, quando feita sem qualquer prévia discussão, a chamamos de conhecimento ordinário, senso comum ou bom senso.

E de onde vem o conhecimento do senso comum, ou esse conhecimento ordinário, de que fala o autor? Vem do acúmulo tradicional dos saberes populares. Ou seja, a tradição se encarrega de produzir a sabedoria do povo. Não é necessário estudo, pesquisa, ou qualquer outra ferramenta teórica ou experimental: basta um povo que se constitua historicamente com sua cultura e teremos um saber fundamentado no bom senso.

No seu livro “Discurso do Método” Descartes afirma que o bom senso é o que existe de melhor distribuído entre as pessoas, pois ninguém diz que tem a menos ou a mais. Todos se dizem sensatos. Diz o pensador francês: “Inexiste no mundo coisa mais bem distribuída que o bom senso, visto que cada indivíduo acredita ser tão bem provido dele que mesmo os mais difíceis de satisfazer em qualquer outro aspecto não costumam desejar possuí-lo mais do que já possuem.”

Tão importante quanto o senso comum, o conhecimento Mítico também antecede ao filosófico e científico. Além disso, os mitos também não se prestam à comprovação experimental nem racional, como a ciência e a filosofia.

Como surgiu a necessidade de explicar a realidade? No fato de que o desconhecido nos assusta. A explicação, que é uma manifestação de um conhecimento, substitui o medo pela sensação de poder, de segurança, de domínio. O conhecimento permite dominar o desconhecido e, com isso, matar o medo uma vez que o conhecimento implica poder.

Nos primórdios da humanidade as realidades inquietantes, desafiadoras, assustadoras e complexas para os primeiros homens: tudo era completamente desconhecido, particularmente os fenômenos da natureza eram assustadores. Se em nossos dias a força da natureza nos assusta, podemos imaginar para os primeiro seres humanos que não dominavam as informações que hoje possuímos. Partindo disso, podemos admitir que nos primórdios o sentimento do ser humano em relação ao mundo era de medo. Essa situação de medo e insegurança produziu o mito. Diferentes deuses e credos foram criados com essa finalidade: possibilitar a sensação de segurança.O processo de criação de mitos perdurou até o advento da filosofia e da ciência. Ainda hoje somos levados a explicar miticamente aquilo para o quê não temos explicações lógico-filosófico-científica. As mais diferentes situações em que o homem atual se depara com o desconhecido é ocasião para o surgimento de um mito: uma explicação que transmita alguma sensação de segurança. “Reduzir uma coisa desconhecida a outra conhecida alivia, tranquiliza e satisfaz o espírito, proporcionando, além disso, um sentimento de PODER. O desconhecido comporta o perigo, a inquietude, o cuidado” afirmou Nietzsche, na obra “O crepúsculo dos ídolos”.


Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Rolim de Moura – RO

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