quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Com autoridade



Reflexões baseadas em: Dt 18,15-20; 1Cor 7,32-35; Mc 1,21-28)






A quem nós queremos ouvir? É a pergunta que o livro do Deuteronômio (18,15-20) nos sugere. A quem nós queremos servir? Esta indagação nasce da primeira carta de Paulo aos Coríntios (1 Cor 7,32-35). Qual é a autoridade que percebemos em Jesus? É a questão colocada pelo trecho que lemos em Marcos (Mc 1,21-28).

No deserto, o povo de Deus teve medo de ouvir a voz do Senhor e de ver o fogo que o representava (Dt 18,16). Mas nós podemos indagar: esse povo teve medo do ouvir e ver ou teve medo de não ser capaz de realizar aquilo que o Senhor queria? Parece que seu medo estava no fato de não conseguir mudar os comportamentos e atitudes. Então, pra não se comprometer, preferiram não ouvir nem ver o Senhor… Não ouvindo poderiam continuar com suas atitudes pecaminosas e alegar desconhecer o projeto de Deus...

Podemos até dizer: o povo sabia que o Senhor é exigente e quer um comprometimento completo. Por esse motivo pediu alguém que falasse em nome de Deus. Pois, assim o povo imaginava, as palavras de um representante de Deus seriam menos comprometedoras. E eles poderiam continuar sem se converter ao Senhor!

Sabendo das intenções dessas pessoas o Senhor estabeleceu os critérios: mandaria seu mensageiro, sim, mas esse profeta falará em nome de Deus, com a autoridade do Senhor.

Por isso é que explica os termos do acordo: “pedirei contas a quem não escutar as minhas palavras que ele pronunciar em meu nome” (Dt 18,19). Ou seja, o povo pode até não querer o contato imediato com o Senhor, mas não pode deixar de cumprir com seus preceitos, sob pena de ser, definitivamente afastado do projeto de Deus. Pode até tentar se esquivar, mas não poderá deixar de tomar uma posição: adere ao Senhor ou afasta-se dele. O que determina a proximidade ou distanciamento são as atitudes, como ensinou Jesus: “Pelos frutos conhecereis a árvore” (Mt 12,33).

Mas o interessante é que a exigência não é feita somente para o povo. O profeta também tem obrigações: ser fiel à palavra de Deus, caso contrário “esse profeta deverá morrer” (Dt 18,20).

Em nossos dias poderíamos nos perguntar quantos desses tantos que dizem falar em nome de Deus realmente trazem a mensagem divina e quantos são charlatões e enganadores do povo? Quantos são os que estão impondo ao povo sua vontade e interesses pessoais e não a palavra libertadora do Senhor? Quantos estão usando “o Nome do Senhor” para se autopromover às custas da fé sincera do povo?

Sabemos que aquele que fala em nome do Senhor anuncia o bem estar das pessoas ao mesmo tempo que denuncia as estruturas e condições de sofrimento em que o povo se encontra. O profeta de Deus, de ontem e de hoje, não compactua com as condições de miséria nem com as dores impostas ao povo enquanto alguns privilegiados levam vantagem em tudo. E levam vantagens às custas do sofrimento do povo. E isso não vale apenas para o mundo da política, mas também para o mundo dos negócios e das práticas religiosas!

Ao ser humano cabe escolher a quem vai servir. Cabe escolher, também, como vai se comportar ou em que condições vai dedicar sua vida a Deus, como sugere Paulo: as pessoas podem escolher casar-se e nessa condição apoiar-se mutuamente, ao mesmo tempo em que sevem ao Senhor. Ou podem permanecer solteiros e, também assim, fazer de sua vida um serviço ao Senhor. De uma ou de outra forma, acrescenta o apóstolo: “O que eu desejo é levar-vos ao que é melhor, permanecendo junto ao Senhor, sem outras preocupações” (1 Cor 7,35).

Por seu turno, vemos Jesus às voltas com uma situação muito particular. Ele é interpelado não por alguém que deseja um milagre, que deseja saúde ou alimento. É interpelado por alguém que põe em dúvida sua missão; que não aceita sua missão salvadora; que não quer perder os privilégios. E grita: “Que queres de nós, Jesus nazareno? Vieste para nos destruir? Eu sei quem tu és” (Mc 1, 24).

Quem se instala no poder não quer dele abrir mão. Não importa se exerce poder sobre o mundo, uma nação, uma cidade ou uma pessoa. O dominador sempre vê no outro um oponente que o quer “destruir”. Esse jogo de poder e de alianças escusas para mantê-lo é uma constante na política. Muitas vezes o candidato abomina um determinado grupo ou prática de um grupo adversário. Mas sendo eleito, esse que antes combatia o “centrão de maldades” ou outros adversários, alia-se a eles fim de se manter e se assegurar no poder. O antigo adversário é “comprado” para virar aliado.

No caso de Jesus a verdade é outra: Ele não faz alianças nem concessões ao disseminadores do mal. Pelo contrário, Ele efetivamente veio para destruir as forças do mal. Para isso tem autoridade; age com autoridade e fala com autoridade. É contra as forças do mal, que escravizam, que maltratam, que exploram as pessoas, que Jesus se posiciona. Com essa finalidade enfrenta aquele que domina o homem sofredor: “Cala-te e sai!” (Mc 1,25). Liberta o sofredor das garras do poder demoníaco que o aprisiona.

As pessoas não estão acostumadas a ver o mal sendo enfrentado e expulso da convivência social e por isso nem sempre percebem que as forças do anticristo se instalaram no centro do poder. Entretanto Jesus, cumprindo definitivamente a promessa de Deus, envia seus discípulos. E hoje envia a nós, para combater as forças do mal que enganam e exploram o povo.

Portanto, em nossos dias, somos nós que devemos, não só falar, mas principalmente agir com autoridade a fim de combatermos as forças do anticristo instaladas no centro do poder. Do poder corrompido que explora o povo e o condena à miséria...





Neri de Paula Carneiro.

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Outros escritos do autor:

Filosofia, História, Religião: https://www.webartigos.com/index.php/autores/npcarneiro;

Literatura: https://www.recantodasletras.com.br/autores/neripcarneiro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

CICLO DA PÁSCOA: A vitória da vida.

Disponível em: https://pensoerepasso.blogspot.com/2024/03/ciclo-da-pascoa-celebrar-vida.html; https://www.recantodasletras.com.br/artigos-de...